Ecobags: a antítese dos sacos plásticos

Doutor com pesquisa em fibras vegetais, Aldenor Ferreira vê no problema das sacolas plásticas oportunidade de negócio à juta e à malva do Amazonas

Produtor no manejo da juta

Neuton Correa

Publicado em: 16/10/2021 às 05:11 | Atualizado em: 22/01/2022 às 12:17

Aldenor Ferreira*

Conforme assinalado no texto da semana passada, a antítese dos sacos plásticos são as ecobags, sacolas reutilizáveis fabricadas a partir de fibras vegetais, como as de juta, malva, sisal, algodão etc.

Nesse segmento, os estados do Amazonas e do Pará, apesar de todos os entraves da cadeia produtiva, tais como, a distribuição de sementes, o preço do quilo da fibra e o duro processo de trabalho, tem potencial para se tornarem referências mundiais na produção de ecobags, pois ainda são os maiores produtores de juta e malva do Brasil. 

Esse potencial está descrito parcialmente no livro A cultura da juta e da malva na Amazônia Ocidental: sementes de uma nova racionalidade ambiental?, organizado por mim e pelos professores Antônio Carlos Witkoski, Alfredo Homma e Therezinha Fraxe, uma obra coletiva envolvendo 22 pesquisadores de diferentes instituições.

Há no livro importantes reflexões acerca da possibilidade da utilização das fibras de juta e malva para a produção de embalagens ecologicamente corretas, chamadas eco-friendly, pois, diferentemente das fibras sintéticas derivadas do polímero extraído do petróleo, as fibras de juta e malva são biodegradáveis.

Como assinalado na semana passada, as sacolas reutilizáveis e outros tipos de embalagens foram abandonadas não porque são menos práticas ou menos higiênicas, mas sim por uma demanda criada pela indústria petroquímica.

As fibras de juta e malva não só são biodegradáveis e, portanto, ecologicamente corretas, como também têm potencial para fomentar toda uma cadeia produtiva, que se estenderia desde a várzea – área do plantio – até o supermercado, o shopping, as feiras e demais estabelecimentos comerciais.  

De maneira geral, essas fibras servem como matéria-prima para a fabricação de papel, vestuário, barbantes, cordas, cortinas, fios, forração de estofados, fundo de tapetes, lonas, telas para artesanatos etc. 

Trata-se de uma modalidade agrícola de baixo impacto ambiental, uma vez que pode ser utilizado o mesmo roçado por vários anos, sem química no solo e/ou na água, utilizando áreas já desmatadas, sem destruir a mata ciliar e/ou a floresta de várzea. 

O cultivo é desenvolvido em pequenas propriedades nas áreas de várzea do complexo Solimões-Amazonas, como uma prática de agricultura familiar. Esses locais são anualmente fertilizados pelo acúmulo de sedimentos desses rios, devido à sua hidrodinâmica (enchente-cheia-vazante-seca), não necessitando, portanto, de nenhuma correção química do solo. 

No processo industrial, por sua vez, são utilizados apenas aditivos orgânicos e óleos vegetais. Isso, associado às características naturais da juta e da malva, faz com que o produto final seja totalmente biodegradável, ou seja, depois de utilizadas e descartadas, embalagens feitas desse material se desintegram completamente em pouco tempo. 

Outra questão importante é que tanto a juta quanto a malva são totalmente adaptadas ao bioma amazônico, sendo a maior fonte de renda para mais de 15 mil famílias ribeirinhas apenas no estado do Amazonas.

O Brasil, nas décadas de 1960/70, liderado pelos estados do Amazonas e do Pará, foi o único país fora da Ásia a exercer forte concorrência à Índia, o maior produtor mundial de fibras de juta.

O abandono quase total da cultura da juta e/ou da malva nesses locais a partir da década de 1990 foi uma opção antiecológica. Contudo, o seu retorno efetivo seria um dos muitos caminhos que esses estados teriam para se desenvolver de maneira mais sustentável.

Os produtos confeccionados a partir das fibras de juta e/ou de malva podem se tornar a antítese dos sacos plásticos, desde que seja feito um incentivo à cadeia produtiva das fibras vegetais e, também, uma mudança no comportamento dos sujeitos – sejam eles responsáveis pela manutenção do ciclo predatório do plástico ou consumidores desinformados

É recorrente o discurso de que todos(as) ou quase todos(as) almejam uma sociedade sustentável, embora poucos saibam o que isso significa de fato para uma dada sociedade ou o que é uma realidade sustentável.

De todo modo, o uso de embalagens reutilizáveis diminuiria consideravelmente o consumo de sacos plásticos em toda a Amazônia, bem como no Brasil.

Por isso, pensando em uma estratégia ambiental e econômica, é preciso fazer o resgate e o fortalecimento da cadeia produtiva da juta e da malva no Amazonas e no Pará, aliados a legislações e programas educacionais.

O potencial de produção de ecobags desses estados é enorme, assim como o de mudança estrutural de nossa sociedade, mas é preciso agir.

*Sociólogo