Amazônia: ensino a distância ainda é desafio para inclusão indígena

O ensino a distância tem a capacidade de chegar mais nas comunidades, mas tem que ter uma infraestrutura mínima local que muitas aldeias não têm

Amazônia: ensino a distância ainda é desafio para inclusão indígena

Da Redação do BNC Amazonas

Publicado em: 19/04/2024 às 12:01 | Atualizado em: 19/04/2024 às 12:02

Embora o acesso ao ambiente online venha sendo possível a partir de lugares cada vez mais remotos, ainda há significativas assimetrias regionais no ensino a distância para a inclusão indígena.

Na região Norte, por exemplo, apenas 58,6% dos domicílios na área rural fazia utilização de internet. A informação é da Agência Brasil.

É nessa região que se concentram 44,48% da população indígena do país segundo o Censo Demográfico 2022.

Segundo a reportagem, o ensino a distância tem a capacidade de chegar mais nas comunidades, mas tem que ter uma infraestrutura mínima local que muitas aldeias não têm.

Mesmo no estado de São Paulo, que tem mais recursos, às vezes elas não têm computadores e acesso à internet.

O ensino a distância é uma democratização importante. Mas há desafios não apenas relacionados à qualidade do ensino. A metodologia é uma questão: é bastante desafiador realizar um acompanhamento mais próximo do aluno. Tem a questão de como esses estudantes podem se apropriar da tecnologia e do material didático. Isso é bem importante para povos que falam outras línguas, diz Talita Lazarin, pesquisadora do Centro de Estudos Ameríndios da Universidade de São Paulo (CEstA-USP).

Boa escolha

Aos 21 anos, a indígena Macuxi, Roberta de Lima, acredita que fez uma boa escolha quando ingressou no curso a distância de tecnologia em empreendedorismo.

Ela conta que iniciou os estudos no meio da pandemia de covid-19, quando as universidades paralisaram suas atividades presenciais.

Mas esse não foi o único motivo que impactou em sua escolha. Não há universidades nos arredores de sua comunidade, no interior de Roraima.

“Não tinha condições de vir para a capital”, explica ela, justificando sua decisão de se matricular na UniCesumar, instituição vinculada à mantenedora Vitru Educação.

A situação mudou e hoje, se aproximando da conclusão do curso, ela vive em Boa Vista. Roberta conta que o ensino superior lhe abriu portas e atualmente faz estágio no polo de ensino a distância da própria UniCesumar, o que lhe garante renda.

O polo de ensino a distância nada mais é do que um centro de apoio, devidamente credenciado pelo Ministério da Educação (MEC), onde é oferecido suporte aos estudantes desse cursos.

Ali podem ocorrer algumas aulas, ocorridas de forma pontual, e também atividades avaliativas, cuja aplicação presencial é obrigatória.

Além disso, no polo, é realizado atendimento técnico e pedagógico. Segundo Roberta, o estágio é o primeiro passo e ela sonha com um emprego de carteira assinada. Futuramente quer abrir o próprio negócio.

Antes de estudar, eu já tinha meu próprio negócio, que era o artesanato. Também trabalhava em agricultura. Pra mim, entrar no curso foi muito bom. Abriu a minha mente e também melhorou a questão financeira, consegui o estágio. O ensino a distância é um meio de levar mais conhecimento para a minha comunidade, para o meu povo. E para os outros povos também. Acho que falta mais infraestrutura para atender a comunidade. Mais computadores, mais livros e mais cursos, na verdade, porque muitos deles ainda não chegaram aqui, cobra ela.

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Mais cursos

A demanda por mais cursos é atestada pelos números. De acordo com dados do Censo da Educação Superior 2022, divulgado no ano passado pelo MEC, o crescimento da modalidade a distância no Brasil é impressionante, o que vem garantindo também aumento do número de estudantes de graduação no país.

Simultaneamente, essa expansão tem gerado preocupações acerca da qualidade do ensino. Em uma década, o número de cursos saltou mais de 700% chegando a 9.186.

O total de estudantes ingressantes por ano saiu de 1.113.850 em 2012 para 4.330.934 em 2022. É um salto de 288%. Considerando os dados de 2022, 95,7% das novas matrículas ocorreram em cursos ministrados por instituições privadas.

Constituição

Embora a Constituição de 1988 tenha fixado a educação como um direito de todos e um dever do Estado, foram as ações afirmativas das últimas duas décadas que viabilizaram um maior acesso dos indígenas à educação superior.

Isso inclui, por exemplo, as cotas, as políticas de assistência estudantil e a criação de licenciaturas específicas para a educação indígena.

Elas ajudaram a driblar barreiras sociais e culturais que dificultavam o acesso às instituições tradicionais de ensino.

Nos últimos anos, o ensino a distância passou a ser um nova ferramenta de aceleração dessa inclusão.

De acordo com Talita Lazarin, ela vem se mostrando eficaz não apenas para contornar barreiras sociais e culturais, mas também geográficas.

Nestes cursos, os estudantes não precisam deixar suas comunidades, que muitas vezes se localizam em áreas de difícil acesso, e ainda podem conciliar os estudos com suas atividades comunitárias.

Em 2021, o levantamento do Semesp mostrava que 0,5% do total de alunos do ensino superior haviam se autodeclarado indígenas.

Considerando os dados demográficos, esse percentual se torna significativo.

Conforme o Censo 2022, cujos resultados foram divulgados pelo IBGE no ano passado, os indígenas residentes no Brasil representam 0,83% da população total do país.

De toda forma, a diferença desses percentuais mostra que há espaço para o crescimento no número de matrículas.

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Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil