Observatório avalia que licença especial vale para BR-319
Ong diz que a licença especial, já em vigor, beneficia não só a exploração de petróleo na foz do rio Amazonas

Iram Alfaia, do BNC Amazonas em Brasília
Publicado em: 14/08/2025 às 15:12 | Atualizado em: 14/08/2025 às 15:12
Entre os 63 vetos do presidente Lula da Silva ao chamado “PL da devastação”, um deles derrubou o dispositivo direcionado ao asfaltamento do trecho do meio da BR-319, mas não inviabilizou a obra.
Isso porque a licença ambiental especial, já em vigor por conta de medida provisória, favorece a recuperação da rodovia.
Na avaliação do Observatório do Clima, a licença especial beneficia não só empreendimentos como a exploração de petróleo na foz do rio Amazonas, mas também a pavimentação de estradas na Amazônia.
Em entrevista exclusiva ao BNC Amazonas, a ex-presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e atual coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima, Suely Araújo, confirma que a licença especial pode ser aplicada no caso da BR-319.
“Tem que saber se esse dispositivo mais especificamente direcionado à BR-319 vai ser mantido ou não. De qualquer forma, a licença ambiental especial, emenda do Alcolumbre [Davi, presidente do Senado], pode ser aplicada à BR-319”.
A coordenadora diz que a licença especial “meio que unifica as licenças prévia, de instalação e de operação”.
“Na BR-319 está suspenso [licenciamento] por causa da liminar. Assim, fica até complexo enxergar como é que eles vão ajustar num caso que está judicializado”.
Para ela, é preciso sanar essa dúvida. “Talvez eles não consigam colocar em licença espeical [obra da BR-319] por causa da judicialização exatamente do Observatório do Clima [a ação na Justiça é da organização], mas, por exemplo, se não houvesse essa judicialização, hipoteticamente falando, eles já poderiam, porque a medida provisória tem efeito imediato”.
Com a licença especial, o governo manteve a sistemática simplificada para liberar empreendimentos com prazo máximo de 12 meses de análise pelo órgão licenciador.
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Veto
Suely também comentou sobre o dispositivo voltado à BR-319 e vetado no “PL da devastação”. Trata-se do texto “rodovias anteriormente pavimentadas e dragagens de manutenção” incluído no artigo 11 para asfaltamento de rodovias sem licença.
“Ele é tão inconstitucional que, mesmo que os parlamentares recuperem isso, vai ser judicializado, porque você não pode simplesmente ir isentando empreendimentos que podem ser de alto impacto, mesmo pré-existente”, disse, referindo-se à articulação da bancada do Amazonas para derrubar o veto.
“Eu vejo a BR-319 como o melhor exemplo, porque ela é existente. Só que a recuperação e o asfaltamento vai impulsionar muito o desmatamento na região. Esse é o principal efeito. Os cientistas mostram isso com modelagens sofisticadas”.
Licenciamento
A coordenadora faz questão de declarar que o Observatório do Clima “jamais escreveu que a estrada nunca poderá ser asfaltada ou algo próximo disso. Isso não está na ação judicial. E nós nunca afirmamos isso”.
“Para haver essa estrada, você precisa garantir governança ambiental na região, que não existe. O Ibama não é patrulha de polícia que vai estar lá todo dia. O governo estadual tem uma fiscalização ambiental absolutamente deficiente. Nós temos muita ilegalidade na região”, disse Suely.
Ela afirmou ainda que as ilegalidades precisam ser superadas como a atuação de quadrilhas criminosas e poderosas atuando na região. “Tudo isso precisa ser enfrentado antes de dizer que essa estrada é viável”.
A ex-presidente do Ibama também critica o acordo entre os ministérios do Meio Ambiente e Transportes para a elaboração do Plano BR-319, que consiste na retomada do processo de licenciamento da obra.
“A governança não é a colocação de dois ou três postos de fiscalização na região, como está previsto até agora. É uma outra dinâmica. O que tem na região é uma ausência do Estado, com letra maiúscula, do poder público. É uma terra sem lei. É uma terra com muitos conflitos”.
Ela lembrou sua atuação na região. “Quando eu estava na presidência do Ibama, por exemplo, aconteceu a queima do escritório do Ibama [Humaitá], que não foi reconstruída até hoje. Naquela região, os fiscais ambientais são recebidos à bala. Então, tudo isso precisa ser enfrentado. O governo ou os governos precisam estar presentes na região”.
Foto: Daisy Serena/Observatório do Clima