Como lamparinas

Aguinaldo Rodrigues

Publicado em: 12/03/2010 às 00:00 | Atualizado em: 12/03/2010 às 00:00

Ivânia Vieira*

Elas caminham loucamente determinadas. Seus corpos formam um gigantesco bailado, os passos são firmes e os olhos, ah, esse mundo de olhos, em todas as cores, parecem lamparinas de fogo forte que não apaga. O brilho é tamanho que nas noites mais escuras dessa marcha ele é a luz-guia nessa longa caminhada. No Brasil, a terceira Marcha Mundial de Mulheres saiu, no dia 8, de Campinas (SP), vai percorrer 18 cidades para, no dia 18, no centro de São Paulo, fazer o ato de encerramento.

O levante dessas mulheres começou bem antes nos lugares mais distantes quando cada uma dessas mulheres, como lamparina, deu vida à ideia da 3ª Marcha. Assim foi em todo o Brasil. Em Parintins, Fátima Guedes juntou-se a outras companheiras, fizeram barulho e atravessaram o rio Amazonas para chegar a Manaus, onde outras lamparinas, animadas pela Francy Guedes, ora com o fogo alto ora baixo, mas sem deixar cair a labareda da esperança de que as mulheres do Amazonas estariam na grande marcha deste ano.

Setenta era a meta, pelo menos 50 amazonenses estão nesse momento percorrendo as ruas do Estado de São Paulo como parte das 3 mil caminhantes. Uma ousadia e uma reconstrução da noção de solidariedade que de tanta paulada do individualismo sofreu seqüelas terríveis e quer, em gestos como esse, reinventar-se na sua melhor versão. As mulheres sabem o quanto a solidariedade é vital.

Em São Paulo, frio, chuva, calor, água na estrada, buraco na pista e contra todas as adversidades segue a multidão da resistência, da louvação, da cantoria, da semeadura. São corpo e alma completamente entregues a uma causa, ferozes na defesa dela, encantadoras no fetiche da liberdade. Pão e água fazem milagres, multiplicando-se entre as mãos, essa outra parte do corpo que encena um impressionante espetáculo em mil gestos.

A vida, nesse território, ganha fôlego novo para, na volta, em cada cidade deste País e, como lamparina de fogo grande, reunir mais mulheres na outra marcha, a do dia a dia, incomodando, questionando, instaurando conquistas honrando o compromisso de que “ seguiremos em marcha até que todas sejam livres”.

*Jornalista, professora do Curso de Comunicação Social da Ufam.

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