De olho nos farsantes

Aguinaldo Rodrigues

Publicado em: 21/06/2010 às 00:00 | Atualizado em: 21/06/2010 às 00:00

Wilson Nogueira*

Os políticos não medem esforços de convencer o eleitor, por meio de ideias e propostas, de que são importantes e úteis para a sociedade. Nada mais justo: a arte de convencer é o principal instrumento do fazer ou do agir democrático. O problema é que desse jogo participam personagens que se filiam à política para fins alheios aos objetivos da democracia. Não são poucos e muitos deles conseguem enganar a boa-fé do eleitor – e não raras vezes por muito tempo.

O exemplo bem próximo é o do ex-deputado Wallace Souza, que, certo dia, caiu em desgraça porque, segundo a Polícia estadual, comandaria um esquadrão da morte em Manaus. Por muitos anos, Wallace apresentou um programa de TV no estilo mundo cão, por intermédio do qual não escondia a sua condição de potencial justiceiro. Nunca foi incomodado pelos políticos que se revezam no plantão do poder. Ele – e seus irmãos coragem – transitavam com desenvoltura entre nos salões do poder. É difícil aceitar que autoridades graúdas desconheciam seus movimentos, até porque o seu programa de TV agiria em conluio com setores da Polícia.

Os irmãos coragem só caíram em desgraça, coincidentemente, após a eleição em que contrariaram ex-aliados, com o propósito de marcar posição de poder político lastreado pelos eleitores. Mas, a essa altura, a barbaridade já estava feita, com um número ainda não fechado de pessoas executadas pelos pistoleiros do ex-deputado, conforme apontam as investigações sobre o caso. Não são poucos os que culpam os eleitores de conivência com os longos anos de impunidade do ex-deputado. Esses argumentam que, se os pobres soubessem votar, elegeriam políticos verdadeiros e não seus simulacros. Mas o problema não é tão simples assim.

Está evidente que Wallace tinha a seu favor e serviço instituições com muita visibilidade e credibilidade social. Afora o fato de ser comensal dos poderosos, de contar a ajuda de aparato policial para invadir casas, prender, bater e matar os selecionados como marginais, ele mantinha no ar um programa de TV. O ex-deputado simulava dar – e não somente ele – a segurança almejada pela população, mas negligenciada pelo Estado. Em tese, nenhum dono de TV ofereceria guarida a um suposto marginal, ainda mais como um apresentador de horário nobre. As evidências apontam, portanto, que é mais fácil acreditar na boa-fé dos eleitores do que numa eventual ingenuidade de certas autoridades e de certos donos de TV.

O caso Wallace demonstra, por outro lado, que quando as instituições querem ou são pressionadas pela população elas cumprem com suas funções de proteger a sociedade dos malfeitores. Com as revelações sobre como funciona o sensacionalismo televisivo, o eleitor, de algum modo, ficará mais atento aos bem-feitores de ocasião, aquelas figuras que caem do céu, de paraquedas, para resolver todos os problemas da humanidade. Não são poucos. Às vezes eles se locomovem pelos becos e ruelas metidos em roupas e em pregações que fazem inveja a franciscanos dos pés-descalços; ou travestidos de super-heróis, como faziam os Irmãos coragem.

O eleitor já deve ter notado e anotado que, como a TV mundo cão perdeu credibilidade, há político defendendo causas das quais jamais foi defensor, simplesmente porque ser justiceiro ou super-herói dos abandonados pelo Poder Público não engana mais como antes dos truques de audiência de Wallace se transformarem em rumoroso episódio policial. É estranho, no mínimo, que alguém que se arvorava ser xerife protetor da periferia contra a delinqüência juvenil, se apresente agora, na pré-campanha eleitoral, como um pacífico ecologista da causa amazônica. Paciência!

Muito cuidado com esses farsantes. Além de ridicularizar a democracia, essas pessoas oferecem muito perigo à vida pública – exemplos não faltam. Contra elas, o Poder Público e as suas instituições deveriam agir previamente, para que os cidadãos se sentissem mais esclarecidos e mais seguros na hora tomar decisões importantes, como a de votar e de colaborar com o aperfeiçoamento da vida em sociedade.

*O autor é jornalista e sociólogo

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