Patriotismo, uma ova!

Aguinaldo Rodrigues

Publicado em: 20/06/2010 às 00:00 | Atualizado em: 20/06/2010 às 00:00

Carlos Lodi*

Hoje eu amanheci “invocado”.

Não prestei atenção, mas devo ter-me levantado com o pé esquerdo. Nada contra o meu pé esquerdo e nem contra os canhotos. Pode ser até um simples problema de desequilíbrio de hormônios, com os azedos em maior quantidade.

O fato é que uma série de coisas me incomoda e todas elas vieram juntas e simultaneamente atazanar a minha vida hoje. Mal consegui terminar o café da manhã e nem a leitura do, pois a cada manchete era um incômodo que me vinha à lembrança.

Não, pessoal, não sou contra futebol.

Muito pelo contrário.  Assisto, torço e gosto muito de ir aos estádios.

Mas acho que no Brasil já atingimos um patamar quase patológico no nosso relacionamento com este esporte tão interessante, um dos poucos em que os mais fracos têm alguma chance de vencer, ao contrário do tênis, do basquete, do vôlei, esportes em que as ‘zebras’ são muito menos freqüentes e os ‘pequenos’ não tem muita vez.

Fico atarantado quando chega a época das finais da Copa do Mundo. O país todo entra em estado de delírio, com gente pensando nos jogos desde o momento em que acorda e vai assim até a hora de dormir.

Gente que enfeita suas casas, carro, local de trabalho com as cores do Brasil e fica em verdadeiro êxtase defronte `as TVs na hora da peleja.  Alguns ficam irados por serem incomodados durante as partidas pois estão até mais concentrados nas jogadas do que os próprios jogadores.

Irrita-me profundamente esta importância que se dá ao futebol em nossa terra. Há tantas coisas mais importantes que não recebem nem um pequeno quinhão de atenção destes mesmos torcedores fanáticos! Enfurece-me a idéia de que quase ninguém vai a uma reunião da sua Associação de Moradores, a uma assembléia do seu Condomínio, mas não perde jogo algum da Seleção Brasileira.

Fico ainda mais preocupado quando muita gente classifica esta euforia toda de bandeiras tremulando em casas e edifícios, carros, carroças e bicicletas, como demonstração de patriotismo.

Patriotismo uma ova! Na realidade, estas pessoas são apenas fãs de um time de currículo vencedor e nada mais do que isto.

Nenhum destes mesmos torcedores que desfilaram suas bandeiras na época da última Copa foi capaz de fazer o mesmo na Semana da Pátria! Que patriotismo é este que só aparece nas competições esportivas?

Incrível também é a alavancagem que a Copa do Mundo traz ao mundo dos negócios. As montadoras de eletro-eletrônicos – principalmente de TV e DVD – começam a trabalhar em regime de 3 turnos logo no começo do ano para tentar suprir a esperada enxurrada de pedidos que será recebida à medida em que a data da abertura da Copa se aproxima.

As fábricas de bandeiras são forçadas a aumentar drasticamente as suas encomendas de matéria-prima e a contratar verdadeiras hordas de funcionários temporários para dar conta de tanta demanda.

Uma criatividade ímpar invade os fabricantes de brindes, com oferta de itens em tal variedade e quantidade que até supera a grande temporada destas empresas que é o final de ano.

Grandes e médias empresas fazem promoções amplamente divulgadas por todos os meios de comunicação oferecendo sorteio de passagens e estadias para o país-sede da Copa do Mundo aos compradores dos seus produtos.

As emissoras de rádio e televisão despendem milhões de dólares para montar as suas bases, alteram sua programação normal para transmitir ao vivo do local da Copa, seja qual for o fuso-horário. Toneladas de equipamentos e centenas de funcionários destas empresas são enviados para garantir a melhor cobertura.

Enfim, é toda uma roda gigantesca de negócios que se movimenta em torno dos 32 países que disputam a fase final do mais assistido evento esportivo do mundo.

Não sei se existe algum estudo sociológico para entender esta paixão absurda do brasileiro pelo futebol, principalmente pela Seleção Brasileira, mas seria interessante tentar entender.

Por acaso, não seria uma espécie de catarse coletiva em contraponto aos tantos e imensos problemas do País? Uma válvula de escape para desviar dos problemas pessoais de cada um? Uma tentativa de fugir da realidade dolorosa que a maioria do povo brasileiro tem que encarar todos os dias?

*O autor é escritor, conselheiro da CALL e coordenador executivo do FliFloresta

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