Por Iram Alfaia , de Brasília
Ex-ministro de assuntos estratégicos nos governos de Lula e Dilma, Roberto Mangabeira Unger, que leciona em Harvard, disse em artigo publicado na segunda-feira, dia 26, no The New York Times, que as ligações na Amazônia entre “economia urbana e floresta ainda não estão em vigor”.
Mangabeira Unger fez referência à Zona Franca de Manaus (ZFM) que deixou de levar desenvolvimento para o interior. Nesse sentido, o modelo poderia estar em “qualquer lugar da China montando produtos como celulares e motocicletas”.
Ele faz algumas considerações sobre o atual estágio da ZFM. “As técnicas de produção são favoráveis ao meio-ambiente, mas primitivas. Se adotadas pelas populações nativas no interior, carecem da escala e tecnologia necessárias para criar uma economia viável”, disse.
Sob o título “Como salvar a Amazônia sem condescender com o Brasil ”, Mangabeira defende no artigo que é preciso descobrir como usar de forma sustentável a floresta tropical em benefícios de seus habitantes.
Conhecimento
Unger afirmou que, na Amazônia, o caminho mais fácil leva à destruição. Segundo ele, o único sistema com uma chance de salvar tanto as pessoas quanto as árvores é uma economia do conhecimento.
Mangabeira diz que somente as indústrias e serviços intensivos em conhecimento nas cidades podem se voltar para a floresta tropical e não para longe dela.
“Novas formas de organizar a propriedade e financiar a produção podem ajudar as comunidades locais e as start-ups a experimentar, competir e cooperar. Esta abordagem pode começar a dar conteúdo prático ao slogan vazio do desenvolvimento sustentável”, analisou.
Prosseguiu: “A inovação tecnológica, empreendedora e legal baseada em um assentamento definitivo da posse da terra pode permitir a colheita sustentável de florestas tropicais heterogêneas e seu uso como fontes de novas drogas e formas de energia renovável. Para tornar isso possível, os serviços ambientais técnicos devem ser fornecidos em uma área maior que a Europa Ocidental”.
Soberania
“Dê ao Brasil uma mão sem desrespeitar sua soberania”, aconselha os países ricos o professor, para quem a pastagem de gado nas fronteiras da região se tornaram ineficientes.
Preservação
O professor orienta os países ricos a não exigir que o Brasil transforme 61% de seu território nacional em um parque internacional.
“E não espere que os brasileiros, que conseguiram preservar cerca de 80% das árvores em sua região da Amazônia, apreciem a palestra de países europeus deixados em grande parte sem árvores por séculos de desmatamento”, criticou.
Pechincha
Chamou de pechincha os US$ 22 milhões prometidos pelo G7, o grupo dos sete países mais ricos do mundo.
Governo Bolsonaro
E ainda orientou os governos dos países desenvolvimentos a ignorarem o governo Bolsonaro caso não haja colaboração.
“Se o governo Bolsonaro, afundado em suas perversas guerras culturais, se recusar a participar, governos, instituições de pesquisa e empresas do mundo devem se dirigir aos governadores e prefeitos da Amazônia”, aconselhou.
Ele deu como exemplo a união dos estados no Consórcio Interestadual da Amazônia Legal, que pode fazer parceria com nossos amigos estrangeiros.
“O verdadeiro Brasil quer apostar no casamento da inteligência e da natureza. Dê-nos uma mão sem desrespeitar nossa soberania. Em vez de apenas ajudar a apagar incêndios, ajude-nos a fazer as descobertas e a alcançar as inovações que um futuro melhor exige”.
Segundo ele, fala-se muito de desenvolvimento sustentável no mundo, mas pouco existe. “Os brasileiros, juntamente com o resto do mundo, precisam de alternativas – incluindo alternativas institucionais – mais do que precisamos de consolo. Para resgatar a Amazônia, precisamos deles agora”.
Titulação fundiária
Mangabeira escreveu no artigo que reina o caos na área fundiária na Amazônia , sendo menos de 10% de propriedade com titulação.
“Reina o caos: ninguém sabe quem é dono do quê e a pilhagem é mais recompensadora do que preservação ou produção. Para superar o caos, devemos distinguir posseiros de longo prazo comprometidos com a vida na Amazônia de fazendeiros e madeireiros predadores, e atribuir-lhes a propriedade total”, aconselha.
Lembrou que já há lei estabelecendo a organização fundiária, mas sucessivos governos têm demorado para executá-la.
“A Amazônia brasileira é mais que árvores; cerca de 30 milhões de pessoas vivem e trabalham lá. Precisamos garantir que a floresta vale mais do que cortar. Para tanto, devemos dar aos habitantes da Amazônia os meios para usar e preservar seu meio ambiente”, diz.
Crédito: Pedro França/Agência Senado