TrĂ¡fico de drogas com aviões da FAB e caso Mickey, de 1999

Segundo a PolĂ­cia Federal, investigações chegaram ao nome do tenente-coronel Washington Vieira da Silva. Ele era lotado na 5ª Força AĂ©rea de AeronĂ¡utica, no Campo dos Afonsos, Rio de Janeiro e jĂ¡ estava na reserva

TrĂ¡fico de drogas com aviões da FAB e caso Mickey, de 1999

Publicado em: 31/05/2021 Ă s 12:08 | Atualizado em: 31/05/2021 Ă s 12:09

Investigações conduzidas pela PolĂ­cia Federal mostram que o trĂ¡fico internacional de drogas com emprego de aviões da FAB (Força AĂ©rea Brasileira), envolvendo militares de alta patente da AeronĂ¡utica, vem de longa data. TrĂªs oficiais foram presos em abril de 1999 e acabaram condenados.

O esquema, no entanto, começou a ser investigado em julho de 1997, quando o traficante de drogas Omar Gilson do Nascimento foi preso em Campinas (SP) com 63 kg de cocaína.

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Segundo a PolĂ­cia Federal, os agentes, investigando as ações de Omar, chegaram ao nome do tenente-coronel Washington Vieira da Silva. Ele era lotado na 5ª Força AĂ©rea de AeronĂ¡utica, no Campo dos Afonsos, Rio de Janeiro e jĂ¡ estava na reserva.

Foram feitas interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça em diversas linhas utilizadas por Washington. Os federais apuraram que em 26 de agosto de 1998, o oficial se reuniu com traficantes de drogas no bar Café Nice, no Shopping Barra Center, na capital carioca.

Criminosos de vĂ¡rias nações

Participaram do encontro o norte-americano John Michael White, apontado como o mentor intelectual do esquema, fornecedor de droga e chefe da quadrilha; e tambĂ©m Adilson Nunes, conhecido como Gina, e o portuguĂªs JosĂ© Roberto Monteiro Zau.

Os policiais apuraram ainda que faziam parte do esquema a boliviana Lila Mirtho Ibañez Lopez; o major-aviador Luiz Antonio da Silva Greff, o tenente-coronel Paulo SĂ©rgio Pereira de Oliveira e o irmĂ£o, o civil Luiz CĂ©sar Pereira de Oliveira.

Lila trazia a droga da BolĂ­via e ColĂ´mbia, encomendada por White. O norte-americano repassava o entorpecente para Washington.

De acordo com a PF, o oficial, na condiĂ§Ă£o de militar da reserva, era o elo de ligaĂ§Ă£o entre o tenente-coronel Paulo SĂ©rgio e o major Luiz Greff.

Greff avisava quando teria voo internacional com escala na Espanha, para onde a droga era levada.

Paulo Sérgio cuidava do embarque do entorpecente na aeronave. A cocaína era acondicionada em malas de viagens.

Paulo SĂ©rgio dizia aos superiores que no interior das bagagens havia livros e materiais que seriam entregues para o irmĂ£o dele, Luiz CĂ©sar, que deveria receber as malas em Las Palmas, nas Ilhas CanĂ¡rias, na Espanha.

Os agentes federais apuraram que em 27 de agosto de 1998, um dia apĂ³s o encontro de Washington com os traficantes no Barra Shopping, JosĂ© Roberto Monteiro Zau embarcou no voo 6800 da IbĂ©ria, com destino a Madri.

No dia seguinte, Luiz CĂ©sar embarcou no voo 150 da Spanair tambĂ©m com destino Ă  capital espanhola. Ele viajou sem bagagens. No dia 1º de setembro, Paulo SĂ©rgio seguiu em missĂ£o oficial no aviĂ£o da FAB. O voo saiu do Rio de Janeiro com destino a Israel e escala em Las Palmas.

Um comandante do voo revelou a PF que Luiz CĂ©sar, acompanhado de outro homem, que seria o portuguĂªs JosĂ© Roberto, foram ao aeroporto daquela cidade e pegaram com a tripulaĂ§Ă£o as malas de Paulo SĂ©rgio. Os dois civis retornaram ao Rio de Janeiro em 5 de setembro. Na avaliaĂ§Ă£o da PF, essa operaĂ§Ă£o da quadrilha foi bem-sucedida.

Em janeiro de 1999, o bando agiu de maneira semelhante. No dia 28 daquele mĂªs, Luiz CĂ©sar e JosĂ© Roberto viajaram para a Espanha. Os federais descobriram que as passagens foram pagas por John White.

Dois dias depois, o tenente-coronel Paulo CĂ©sar, fez outra viagem oficial para o exterior, com escala na Espanha. O irmĂ£o dele e JosĂ© Roberto mais uma vez buscaram as malas em Las Palmas. Para a PF, a quadrilha cometeu mais um crime de trĂ¡fico de drogas e com sucesso.

Mas o bando nĂ£o teve a mesma sorte em 19 de abril de 1999. A PolĂ­cia Federal seguia todos os passos dos militares e civis envolvidos no esquema. E tambĂ©m monitorava o aviĂ£o HĂ©rcules C-130, nĂºmero 2466, da Força AĂ©rea Brasileira.

Dessa vez foram entregues 33 kg de cocaĂ­na para o tenente-coronel Paulo SĂ©rgio. A droga foi embarcada por ele. Washington chegou a ir Ă  Base AĂ©rea do GaleĂ£o, no Rio de Janeiro, de onde partiria o voo com destino Ă  cidade francesa de Clermont-Ferrand. A escala seria em Las Palmas.

O objetivo da ida de Washington Ă  Base AĂ©rea do GaleĂ£o, segundo a PF, era para se certificar de que a droga fora realmente colocada no aviĂ£o. O HĂ©rcules era monitorado antes mesmo de decolar no Rio de Janeiro.

A primeira escala foi feita em AnĂ¡polis (GO) e a segunda em Recife. O flagrante de trĂ¡fico de drogas aconteceu na capital pernambucana, durante a operaĂ§Ă£o Mar Aberto, deflagrada naquele dia pela PolĂ­cia Federal.

CocaĂ­na com 99% pureza

A cocaĂ­na estava armazenada em duas malas em pacotes cobertos por algodĂ£o e enrolados em borracha e papel celofane com desenhos de Mickey Mouse. A droga tinha 99% de pureza e foi avaliada em US$ 3 milhões.

Com exceĂ§Ă£o de JosĂ© Roberto, os demais acusados foram presos. Paulo SĂ©rgio, o irmĂ£o Luiz CĂ©sar e o major Luiz Greff foram condenados a 16 anos.

Washington recebeu uma pena de 17 anos e Lila, de 19 anos. A maior condenaĂ§Ă£o foi do norte-americano White: 39 anos. Os militares perderam a patente.

Adilson Nunes morreu antes do julgamento. JosĂ© Roberto nĂ£o foi preso com os demais acusados porque estava escondido na Espanha. Os 33 kg de cocaĂ­na seriam entregues para ele.

O portuguĂªs ficou 12 anos foragido e acabou capturado em maio de 2011, na Tijuca, Rio de janeiro. A Justiça Federal o condenou a 12 anos e quatro meses por trĂ¡fico internacional de drogas.

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Foto: DivulgaĂ§Ă£o/FAB