O comandante que deu a volta ao mundo rumo a Parintins
Apรณs visitar 32 paรญses e dar a volta ao mundo, comandante DโSouza faz da vida em Parintins seu porto seguro.

Diamantino Junior
Publicado em: 15/06/2025 ร s 10:56 | Atualizado em: 15/06/2025 ร s 10:57
Ao navegar de Manaus rumo ao Festival Folclรณrico de Parintins, o viajante nรฃo espera encontrar um homem que deu a volta ao mundo.
Um dos que realizaram esse feito รฉ o comandante DโSouza, de 65 anos, paraense de Juriti que vive em Parintins desde 2006.
O comandante foi piloto da Marinha de guerra de 1979 a 2008. Hoje, atua na Marinha mercante fazendo a rota Manaus-Parintins, no navio-motor Anna Rebeca III, mas faz questรฃo de vestir o uniforme de comandante no comando do leme.
โAntigamente navegar era muito difรญcilโ, destaca. Hoje, embarcaรงรตes como esta possuem equipamentos de radar, sonar, rรกdio e AIS (um GPS Garmin), que permitem identificar as margens, profundidade, a rota e outras embarcaรงรตes.
A tecnologia do navio-motor que leva passageiros para o festival de Parintins impressiona, assim como as histรณrias do comandante que deu a volta ao mundo.
O rio corre para o mar
Orivaldo Souza nasceu em Juriti, no Parรก, ร s margens do maior rio do mundo, o Amazonas, na divisa com Parintins.
Quando saiu de casa, aos 17 anos, rumo ร Manaus, nรฃo imaginava que daria a volta ao mundo.
Nascido em uma famรญlia simples do interior de Juriti, seu sonho era ser servente de pedreiro. E ele conseguiu exercer esse ofรญcio.
Pouco tempo depois, passou a trabalhar como pintor de letras das fachadas dos comรฉrcios na capital amazonense.
Nesse tempo, nรฃo havia placas industriais, os nomes de lojas eram feitos por pintores especializados em tipografia.
Enquanto pintava a fachada da loteria do Pina, na praรงa Heliodoro Balbi, conhecida como praรงa da Polรญcia, na avenida 7 de Setembro, no centro de Manaus, Orivaldo viu um marinheiro pela primeira vez na vida.
O marinheiro, que notou ser observado, lhe perguntou: โรndio, quer ser marinheiro?โ.
Com 18 anos, fez entรฃo o concurso para ingressar na Marinha. O certame teve 70 candidatos, mas somente nove aprovados. O ano era 1979.
Orivaldo Souza ingressou na Marinha em Manaus, formou-se em Belรฉm (PA), fez formaรงรฃo de cabo e sargento no Rio de Janeiro, na baรญa de Guanabara.
Conheceu 32 paรญses em viagens que recebeu como gratificaรงรตes por sua atuaรงรฃo.
Atento ao GPS no painel do Anna Rebeca III, o comandante DโSouza contou ao BNC Amazonas suas aventuras pelo mundo.
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A volta ao mundo
De 1997 a 1998, o comandante DโSouza deu a volta ao redor do mundo em um curso de instruรงรฃo da Marinha de guerra.
โA saรญda para a circunavegaรงรฃo, em 1997, foi do porto do Rio de Janeiro, atravessamos direto para Nova Iorque, em dez dias de viagem. De Nova Iorque, nรณs atravessamos para Portugal, em mais 12 dias de viagem. E entramos no mar Mediterrรขneo, passamos para a รfrica pelo canal de Suez, e rodamos o planeta. Voltamos para o Havaรญ, depois Los Angeles, e de lรก voltamos pelo canal do Panamรก, e viemos para o Brasil novamenteโ.
O tempo entre um porto e outro variava. Houve percurso que durava dias e outros, apenas algumas horas. Por exemplo, de Nova Iorque a Portugal, durou de 12 a 15 dias, jรก da Espanha para o Marrocos, apenas algumas horas.
A volta no tempo
Alรฉm de dar a volta ao mundo, o comandante DโSouza tambรฉm deu a volta no tempo.
Hรก um fenรดmeno que ocorre ao atravessar o planeta.
Os fusos horรกrios organizam a contagem do tempo no mundo: da esquerda para a direita do meridiano de Greenwich, localizado na Inglaterra, passa-se uma hora a mais no relรณgio a cada fuso horรกrio.
Ao atravessar navegando o mundo da esquerda para a direita, o comandante โse adiantou no tempoโ:
โNรณs atracamos o navio-escola da Marinha de guerra, no dia 24 de dezembro, no porto de Long Beach, em Los Angeles, e nรณs comemoramos o Natal. Como nรณs tรญnhamos rodado o planeta, tinha rodado tambรฉm o tempo. E teve o acerto de relรณgio no dia 25, entรฃo nรณs voltamos para o dia 24. E nรณs passamos o Natal duas vezes em 1997โ.
As pedras no caminho
Em sua carreira na Marinha, o comandante DโSouza conheceu diversos lugares histรณricos, como as muralhas da China, as pirรขmides do Egito, a torre de Belรฉm, em Portugal, o Japรฃo, as ruรญnas da Grรฉcia antiga e tantos outros.
Ele contou que chegou a Berlim um dia apรณs a queda do muro que separava a Alemanha oriental da ocidental, em 9 de novembro de 1989. Um garoto da porรงรฃo oriental lhe cobrou 2 dรณlares por um pedaรงo do muro.
O comandante lhe ofereceu US$ 10 pela ferramenta que o menino usava para que pudesse retirar um pedaรงo ainda maior do muro. Hoje, essa relรญquia estรก guardada em sua casa em Parintins.
DโSouza criou o costume de recolher pedras pelos caminhos onde o mar lhe levou. Hoje possui uma coleรงรฃo de pedras de diferentes paรญses emolduradas em um quadro, com o tรญtulo: โAs pedras do meu caminhoโ.
Do mundo para Parintins
Depois de conhecer 32 paรญses, dar a volta ao mundo e no tempo, o comandante DโSouza, atua na Marinha mercante, no navio-motor Ana Rebeca III, que faz o trecho Parintins-Manaus.
Em 2006, jรก prรณximo de se aposentar, o marinheiro foi passar dois anos de fรฉrias na “ilha da magia”, encantou-se e escolheu ficar.



Na รฉpoca, tinha duas filhas pequenas, com 10 e 6 anos, uma nascida no Rio de Janeiro e outra em Manaus: โQueria criar minhas filhas no meu ambienteโ.
Hoje, suas filhas, a dentista Caroline Fragata e a psicรณloga Gabriele Fragata, fruto de seu casamento com Clรกudia Fragata, tรชm 29 e 25 anos, respectivamente.
Curiosamente, o marinheiro encontrou seu porto seguro em uma fragata. Justamente, o sobrenome de sua esposa, รฉ o nome de um navio de guerra da Marinha.


DโSouza disse que gosta da vida em Parintins:
โร um sonho. Eu tive escolha, eu pude escolher o meu lugar. Eu teria que voltar para Brasรญlia e escolhi morar em Parintins, comprei casa. Lรก tem um bordรฃo que diz: ‘Parintins para viver e amar’ e eu escolhi Parintins para viver e amar. Gosto da vida lรก, gosto de estar perto da รกguaโ.
Foto: Juliana Oliveira/especial para o BNC Amazonas
Galeria: acervo pessoal/cedidas gentilmente ao BNC Amazonas