Um estudo contratado pelo governo federal, ao qual O GLOBO teve acesso, apontou que a pavimentação de um trecho de 450 quilômetros da rodovia BR-319, que liga Porto Velho a Manaus, vai aumentar o risco de desmatamento.
O estudo faz parte do processo de licenciamento ambiental da obra e diz que, uma vez reconstruída, a rodovia vai facilitar “o acesso a áreas remotas de floresta da Amazônia para fazendeiros, madeireiros, grileiros e outros atores envolvidos em processos de alteração da paisagem natural”.
A estimativa é de que a obra custe pelo menos R$ 900 milhões.
A BR-319 foi construída no final dos anos 1970, ainda durante o governo militar.
A ideia era ligar as cidades de Porto Velho e Manaus
A estrada funcionou durante alguns anos, mas, nas últimas décadas, foi abandonada e hoje é intrafegável na maior parte do ano.
Pavimentar a BR-319 novamente é um projeto antigo de diversos presidentes.
Pedido de licenciamento
Em julho, o Departamento Nacional de Infraestrutura Terrestre (DNIT) enviou ao Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renováveis (Ibama) um pedido de licenciamento para a pavimentação de 450 quilômetros da rodovia, o chamado trecho do meio.
Sem o licenciamento, ela não poderá ser realizada.
O Ibama já deu início à análise do estudo, mas ainda não se pronunciou sobre se vai ou não liberar o início das obras, o que pode demorar meses.
O documento encomendado pelo DNIT aponta uma série de riscos que a repavimentação da BR-319 pode gerar.
Mas indica que ela seria viável caso uma série de medidas mitigatórias fossem tomadas.
Riscos
Entre os riscos apontados pelo estudo estão o aumento do desmatamento, da migração desordenada, o avanço de grileiros e fazendeiros e a especulação imobiliária.
“A reconstrução da rodovia poderá ser danosa ao ambiente natural, uma vez que facilita o acesso a áreas remotas de floresta da Amazônia para fazendeiros, madeireiros, grileiros e outros atores envolvidos em processos de alteração da paisagem natural”, diz um trecho do estudo.
Ocupação já acontece
Em outro trecho, o documento cita estudos realizados por pesquisadores entre 2014 e 2018 que dizem que, mesmo sem a BR-319 estar pavimentada, a ocupação do solo na região cortada por ela já sofre impactos semelhantes aos observados no entorno da BR-163, que liga Mato Grosso ao Pará e que se tornou, nos últimos anos, um dos principais vetores de desmatamento da Amazônia.
“A conclusão em relação aos impactos estudados […] nos leva a concluir que a história da BR-319/AM, já reflete o padrão inicial de uso e ocupação do solo que ocorreu em empreendimentos similares como a BR-163”, diz um trecho documento.
Outro estudo aponta a possibilidade de que a pavimentação da rodovia poderá aumentar em 70% o desmatamento na região.
Os autores do estudo de impacto ambiental ponderam, no entanto, que, se por um lado a estrada pode facilitar a chegada de grileiros e aumentar o desmatamento, por outro ela também poderia melhorar o acesso das equipes de fiscalização e atrair investidores em atividades sustentáveis.
O documento diz ainda que para que o impacto seja mitigado, é preciso que uma espécie de “escudo” de unidades de conservação criadas ao longo do trajeto da rodovia funcione de forma eficiente.
Procurado, o DNIT defendeu a obra
Na nota, o DNIT diz que pediu o licenciamento da obra por acreditar “na viabilidade do projeto, embora esta decisão” seja do Ibama.
O DNIT disse ainda que, com base em outras experiências na Amazônia, o governo pretende implementar uma estrutura de governança que aumente a presença do estado na região de influência da BR-319.
Ainda durante o primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o governo tentou reconstruí-la, mas problemas no licenciamento impediram o início das obras.
Agora, ela é tida como uma das prioridades do presidente Jair Bolsonaro.
Há duas semanas, a Justiça Federal liberou o início das obras de um outro trecho da rodovia, totalizando 52 quilômetros.
O problema, dizem os ambientalistas, é que ela cruza uma das regiões mais preservadas da Amazônia e considerada uma das mais ricas em biodiversidade daquele bioma.
Além disso, lá também vivem diversas etnias indígenas.
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Foto: BNC Amazonas