O presidente da República, Jair Bolsonaro (PL), sua equipe econômica, especialmente o ministro da Economia, Paulo Guedes, e o empresariado nacional fizeram um alvoroço nas comemorações ao receber o convite formal para o Brasil entrar na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Era o desejo de primeira hora do atual governo.
O Brasil recebeu a carta-convite para iniciar o processo de entrada como membro da OCDE no dia 31 de janeiro de 2022. A notícia do recebimento deixou o mercado eufórico e os políticos sonhando em como capitalizar em ano de eleição.
O secretário-geral da organização, Mathias Cormann, elogiou a entrada do Brasil e o classificou como “um país importante” e merecedor do ingresso na OCDE.
As empresas brasileiras também têm grande interesse no ingresso do Brasil na OCDE. Isso daria uma espécie de ‘selo de qualidade’ ao país, que concorre a uma vaga com Argentina, Peru, Bulgária, Croácia e Romênia.
Para o setor produtivo brasileiro, entre as vantagens de entrar para o chamado “clube dos ricos’, uma das principais é o aumento do volume de investimentos estrangeiros.
Mas, a adesão não é admissão, apenas uma permissão de iniciar o processo de ingresso na organização. Na América do Sul, apenas o Chile é membro efetivo, estando a Colômbia cumprindo exigências que lhe foram feitas para a admissão.
Quando a adesão é autorizada, a OCDE formula uma série de exigências expostas em um roteiro ao país interessado, as quais variam conforme as peculiaridades de cada um. No caso do Brasil, são 251 as exigências, das quais 103 já foram cumpridas.
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Mudanças climáticas
Mas, para ingressar na OCDE implica em mudanças estruturais na legislação brasileira e no estabelecimento de prioridades de gastos. E o professor de direito internacional, da Faculdade de Direito da Universidade de Lanzhou (China), Douglas de Castro, questiona se o Brasil, por meio de seus representantes eleitos, está disposto a rever as prioridades para o ingresso na organização internacional.
Isso porque o “clube dos ricos” coloca as mudanças climáticas como uma ameaça existencial para a humanidade, sendo que a organização elenca como principais eixos para o combate desta ameaça a proibição de algumas atividades específicas: regulamentação da frequência e métodos de monitoramento e controle do uso de solo e água.
O professor lembra que os relatórios do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) vêm alertando ano após ano o aumento das queimadas no país, um dos grandes focos da contribuição brasileira para as mudanças climáticas. Some-se a isso os dados sobre o desmatamento e exploração ilegal de minérios.
Questionado se o Brasil tem condições de atender este requisito, Castro afirma que o país tem o potencial de atingir, mas, para isso terá que estabelecer prioridades claras e objetivas na direção de um verdadeiro desenvolvimento sustentável como política de estado.
“Como estamos em período de eleição, penso ser possível congregar todas as forças políticas e a sociedade civil para ao menos iniciar o encaminhamento de um projeto que faça frente a este desafio”, disse o professor da Universidade de Lanzhou.
Política fiscal, educação e combate à corrupção
O ex-secretário Nacional de Justiça no Ministério da Justiça e Segurança Pública, Vladimir Passos de Freitas, explica que os pretensos aderentes devem ter uma política fiscal condizente com o bloco econômico.
“Por exemplo, o Brasil terá que realinhar o seu Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), facilitando o comércio com outros países. Evidentemente, o papel do Congresso será essencial na realização desse tipo de iniciativa”, diz Freitas em artigo publicado na revista eletrônica Conjur.
O Brasil precisa ainda se sujeitar a um exame do nível de sua educação de primeiro grau. Os alunos terão de se submeter a uma espécie de Enem internacional, em que se apurará se os estudantes brasileiros estão no nível mínimo exigido.
O combate à corrupção é outro item relevante e terá dificuldades nesse cumprimento porque o país caiu duas posições no ranking mundial de corrupção, de acordo com dados da Transparência Internacional. A posição ocupada pelo país no Índice de Percepção da Corrupção (IPC) atualmente é a 96ª entre 180 localidades analisadas. Em 2020, estava na 94ª posição.
Perda de autonomia
Para o professor de Economia da Universidade de Brasília (UnB), José Luis Oreiro, a entrada do Brasil na Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), significaria perda de autonomia na política econômica pelo próximo governo.
Ele explica que, dentre as regras de adesão, está a adoção pelo país da plena conversibilidade da conta de capitais. E esse é o maior motivo de preocupação.
“Se nós adotarmos a plena conversibilidade da conta de capitais, vamos perder o último resquício que resta de autonomia na formulação da política cambial no Brasil. Então, se o próximo governo quer mudar o regime cambial, não vai poder fazer”, afirma Oreiro.
Foto: Valter Campanato