Florestas manejadas por indígenas ajudam a prevenir doenças, diz estudo
A pesquisa internacional inédita afirma que as florestas absorvem 26 mil toneladas de poluentes nocivos de queimadas e gera economia de US$ 2 bilhões

Da Redação do BNC Amazonas em Brasília
Publicado em: 07/04/2023 às 13:38 | Atualizado em: 07/04/2023 às 19:04
Uma pesquisa de dez anos mostra que as florestas manejadas por povos indígenas da Amazônia brasileira absorvem poluentes nocivos liberados pelas queimadas.
Com isso, evita cerca de 15 milhões de casos de doenças todos os anos, o que representa uma economia de US$ 2 bilhões/ano aos estados e municípios da região
Desse modo, o estudo divulgado nesta quarta-feira (6), pela revista Communications, Earth & Environment, do grupo Nature, sugere que a floresta Amazônica brasileira e seus territórios indígenas podem absorver nada menos que 26 mil toneladas de poluentes nocivos, liberados pelas queimadas todos os anos.
Por isso, essa ação natural de proteção da floresta evita milhares de casos de doenças cardiovasculares e respiratórias letais, reduzindo de forma significativa os custos com a saúde em algumas das cidades mais desmatadas da região, afirma a pesquisa da Nature.
A equipe de pesquisadores, que vem da Clark University, EcoHealth Alliance, George Mason University, a Universidade Nacional Autônoma do México e a Universidade de São Paulo, concentrou sua análise na Amazônia Legal brasileira.
Tal área se estende por mais da metade do território do país, incluindo 722 cidades de médio e pequeno porte. Durante o período das queimadas, do final de julho até novembro, a região torna-se “um dos lugares mais poluídos do planeta”, ressaltaram os pesquisadores.
Análise de dez anos
Com base em uma análise de dados de dez anos, os autores do novo estudo “Protecting Brazilian Amazon Indigenous territories reduces atmospheric particulates and avoids associated health impacts and costs” constataram que cada hectare de floresta queimada custa às cidades pelo menos US$ 2 milhões no tratamento de doenças relacionadas.
Enquanto isso, as florestas localizadas em terras indígenas, por absorverem os poluentes dos incêndios, evitam cerca de 15 milhões de casos de doenças respiratórias e cardiovasculares por ano, o que, de outra forma, também custaria US$ 2 bilhões ao sistema de saúde.
A pesquisa conclui ainda que terras indígenas, densamente florestadas, estão protegendo populações urbanas e rurais, situadas muitas vezes do outro lado da Amazônia, no “arco de desmatamento”. Essa região, localizada no sudeste amazônico, perdeu a maior parte da sua cobertura florestal para a agroindústria e outras atividades, legais e ilegais.
Absorção de poluentes
“Em todo o mundo, as florestas são conhecidas por absorverem poluentes de incêndios pelos poros localizados na superfície das folhas, mas esta é a primeira vez que calculamos a capacidade das florestas tropicais para fazer isso “, afirma a brasileira Paula Prist, cientista pesquisadora sênior da EcoHealth Alliance e principal autora do estudo.
E a cientista brasileira prossegue:
“Nossos resultados indicam que a floresta Amazônica pode absorver 26 mil toneladas de partículas todos os anos e os territórios Indígenas são responsáveis por 27% dessa absorção, embora ocupem apenas 22% da floresta”, ressalta Paula Prist.
De acordo com o advogado e Coordenador Executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Dinamam Tuxá, “este estudo reforça o que os povos indígenas têm dito há tempos e demonstra a importância de nossos territórios no combate a agentes nocivos, como as queimadas”.
“Os povos indígenas têm enfrentado as queimadas em seus territórios de forma autônoma, principalmente no governo anterior. Esperamos agora que o atual governo apresente um plano para combater as queimadas, que são ações criminosas de invasores, do agronegócio, do avanço de grandes empreendimentos”, declarou.
Conforme o coordenador da Apib, “sempre enfatizamos a importância da floresta em pé, da preservação e da proteção dos territórios indígenas, e que isso seja de fato uma política de Estado e que seja implementada”.
“Esperamos que o governo se comprometa com o desmatamento zero e com o combate às queimadas, dentro e fora das Terras Indígenas, em unidades de conservação e em todo o território nacional. É importante dizer que este estudo aponta para a necessidade de as políticas públicas fomentarem as ações e as demarcações das terras indígenas. É mais um instrumento que iremos utilizar não apenas para levar ao governo, mas também para informar toda a sociedade civil sobre a importância dos territórios indígenas e dos povos indígenas no contexto da luta contra as mudanças climáticas, que afetam pessoas em todo o mundo. Este estudo traz elementos essenciais para as pessoas conseguirem visualizar na prática a importância dos territórios indígenas e o valor da floresta em pé”, disse.
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Comprovação científica
Já está comprovado pela ciência que os incêndios nas matas dos países de floresta tropical, são responsáveis por 90% das emissões globais de partículas liberadas pelas queimadas, incluindo aqueles situados na bacia do rio Amazonas.
Assim, as florestas de folhas largas da Amazônia têm mais probabilidade do que as florestas de outros biomas de liberar aerossóis carbonáceos negros e orgânicos, os principais componentes das partículas finas causadoras de aumento da taxa de incidência das doenças respiratórias e cardiovasculares da região.
Direito dos povos indígenas
As constatações da pesquisa podem representar mais um fator de urgência para a promessa do presidente Lula da Silva de reconhecer e fazer cumprir os direitos dos povos Indígenas à terra, o que já se comprovou desempenhar um papel na redução do desmatamento e da perda da biodiversidade na Amazônia.
“A ciência evidenciou que as florestas administradas por indígenas sofrem menos com o desmatamento, responsável pela mudança climática e risco de pandemia, mas esta é a primeira iniciativa de quantificar como elas beneficiam a saúde humana e da economia, indicando que os benefícios superam em muito os desafios desses territórios”, disse a Florencia Sangermano, coautora do novo estudo.
Existem atualmente 383 territórios Indígenas reconhecidos na Amazônia Legal Brasileira, cobrindo mais de 1.160.000 quilômetros quadrados. O novo estudo concluiu que somente cinco territórios, principalmente no oeste da região densamente florestado da Amazônia brasileira, representam 8% da capacidade da floresta de absorver partículas dos incêndios florestais.
Foto: TV Brasil