O diretor de governança fundiária do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), João Pedro Gonçalves, disse que o governo federal se empenha na arrecadação de terras da União, no Sul do Amazonas, para destiná-las à reforma agrária.
A medida, entre outras finalidades, visa a erradicação dos conflitos sociais por terras na região que têm avançado nos últimos anos, inclusive com assassinatos e desrespeito aos direitos humanos.
Relatório da Comissão Pastoral da Terra (CPT), divulgado e, abril do ano passado, aponta que os conflitos por terras aumento em 59% em relação ao ano anterior na Amazônia Legal (Acre, Amapá, Amazonas, Rondônia, Roraima, Maranhão e Tocantins).
Leia mais sobre o relatório da CPT no Brasil de Fato
No sul amazonense estão localizados dos municípios de Boca do Acre, Pauini, Canutama, Lábrea, Tapauá, Apuí, Borba, Humaitá, Manicoré e Novo Aripuanã.
A região, reconhece João Pedro, é a porta do território amazonense para a entrada de grileiros vindos do Acre, Rondônia e Mato Grosso do Sul. A ação é sempre a mesma: a retirada de madeira de valor comercial, o desmatamento para criação de gado e, finalmente, a plantação de grãos (soja, milho, arroz etc.)
Os posseiros/grileiros agem, de costume, com apoio servidores públicos que se deixam corromper.
Em Lábrea, por exemplo, a Corregedoria Geral do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJ-AM) pôs sob intervenção, por 90 dias, o Cartório do Município, para realizar procedimentos de ampla correição,
Há suspeita de que a repartição favoreceu a fazenda Polatina, do posseiro Sidney Sanches Zomora, com o aval a documentos suspeitos, morosidade no atendimento a solicitações do Incra e extravios de documentos públicos, entre outras violações ao bom atendimento do interesse público.
Parte das terras com documentação frágil da fazenda Polatina, confirma João Pedro, está em processo de arrecadação para ser entregue a 200 famílias do acampamento Marielle Franco, que se dedicam à agricultura familiar e a outras atividades que dão sustentabilidade à floresta, como a coleta de castanha, óleos e resinas vegetais.
A fazenda se diz dona de ao menos 60 mil hectares, com capacidade para abrigar mais de 20 mil cabeças de gado.
“Esse é só uma entre outras posses com documentos questionáveis que queremos parar e transformá-las em terras da reforma agrária”, explica o diretor.
Os agricultores desse acampamento, assim como os de outros da região, estão sob ameaça de violência cometida por grileiros. A grilagem avança, inclusive, sobre ecossistemas protegidos (terras indígenas, áreas quilombolas, florestas nacionais etc).
Para João Pedro, o poder público deve agir com rigor contra a abertura de novas frentes do agronegócio não comprometido com a política de sustentabilidade ambiental, social e econômica que o Brasil defende perante a comunidade nacional e internacional.
Sustentabilidade
“A política fundiária dos governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro foi entregar documentos juridicamente frágeis, para esquentar o mercado ilegal de terras na Amazônia”, pontua João Pedro.
No momento, as Coordenadorias de Justiça dos estados da Amazônia Legal, por meio de provimento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), estão incumbidas de coordenar diálogos interinstitucionais para promover a regularização fundiária.
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“O apoio dos tribunais de Justiça é importante para acelerar processos que estão parados devido ao corpo-molhe de cartórios cooptados por interesses excusos”, comentou João Pedro.
A ação coordenada do poder público é impedir crimes ambientais que, inclusive, ameaçam a sobrevivência das populações que dependem das terras, florestas e rios para sobreviver. Ele lembra que na região de Lábrea está a nascente do rio Purus, que precisa ser protegido por ações que reconheçam a importâncias das águas para a vida da biota amazônica.
Esse, também, não é um caso isolado de ameaça à vida dos rios, porque atividades a garimpagem de ouro e outros minérios afetam a saúde dos mananciais amazônicas, com a contaminação por mercúrio, e assoreamento das margens e cabeceiro segundo João Pedro.
Por fim, ele lembra que as medidas de proteção aos ecossistêmicos amazônicos, dos quais dependem o equilíbrio da vida na região, não podem estar a reboque do agronegócio de terra arrasada.
Foto: Maria do Rosário Nogueira/Especial para o BNC Amazonas