‘Os defeitos que eu gosto de ter’. Iza Kamile, 19 anos, vítima do pai

Não abro alas para o inferno/ Sei dos meus defeitos, das minhas fraquezas/ Sei dos meus excessos/ E gosto de pecar por excesso

Iza Kamile vítima do pai

Neuton Corrêa, da Redação do BNC Amazonas

Publicado em: 19/03/2024 às 12:47 | Atualizado em: 19/03/2024 às 23:25

Iza Kamile, de 19 anos, uma das duas vítimas da tragédia que abalou Parintins (AM) na madrugada desta terça-feira, dia 19, tinha personalidade forte e a sensibilidade da poesia em sua vida.

Por exemplo, em 26 de maio do ano passado, ela assim se mostrou em poesias de sua autoria que declamou no Facebook.

Nos versos, pode-se ver um pouco de seu ser, da sua condição de mulher, de sua ancestralidade e religiosidade.

Mulheridade

Em sua vida, diz nos versos, não há espaço para o veneno e para quem não entende o peso de sua ancestralidade e mulheridade.

Iza Kamile morreu na madrugada de hoje, numa tragédia em família, que também vitimou fatalmente sua mãe, Izandra Bentes 41 anos.

Jovane Matos, sargento PM, pai e marido, é o acusado dos crimes. Ele estava afastado da corporação por problemas psicológicos.

A tragédia só não foi maior porque seu filho conseguiu contê-lo. Há informação de que ele tentou contra a vida do filho e dele próprio.

Leia e assista às poesias de Iza, que também apresentava quadro de depressão, segundo a família.

Laroyê! 

Tenho tido medo de muita coisa 

Mas nunca de mim

Nunca de quem sou

Nunca do que penso 

Nunca do que acho 

Nunca da minha vocação 

Nunca do meu curso 

Nunca daquilo que está destinado que está destinado a ser 

Não por força de um Deus mal, de um tirano 

Mas de um Deus que muito me ama 

Que me deu tantos e tantos dias

Tantas e tantas vontades, sonhos,  metas, que, aos néscios, são como loucuras 

E é bíblico 

A palavra da cruz é loucura para os que vão perecendo 

Mas, para nós, que somos salvos ao poder Deus

Ser salvo ou não ser é uma questão de bastante retórica 

Eu deixo essa questão para os católicos 

Não me importa. Eu não me interesso

Eu sei quem tem estado comigo 

Eu ouvi o boa noite Zepelim um dia desses 

E percebi que eu já não teria fuga 

O canto de Maria Navalha 

Vem pro meu peito, vem pro meu peito

E quem me provoca só ouve um canto de Pomba Gira em resposta.

Os defeitos que eu gosto de ter

Quem me provoca só ouve um canto de pomba gira em resposta 

Eu não negocio com o mal 

Não há espaço em minha vida para o veneno 

Não há espaço em minha vida pra quem não entende 

O peso que há na minha ancestralidade 

O peso que há na minha mulheridade 

O peso que há em todas as estratificações às que eu pertenço 

Não abro alas para o inferno 

Porque entendo quem sou

Eu sei quem sou 

Sei dos meus defeitos, das minhas fraquezas 

Sei dos defeitos que eu gosto de ter 

Sei dos meus excessos 

E gosto de pecar por excesso 

Exu nos ensina que o que é certo e errado depende do contexto 

O homem ocidental não consegue ter essa visão 

Porque sua mente está mirrada por uma visão de Deus-Capeta, céu-inferno 

Tudo muito dual 

Mas Exu é o senhor dos caminhos

É o senhor da encruzilhada

Cinco mil anos, meu amor 

Cinco mil anos tem o Candomblé 

Cristo nasceu há dois mil anos 

E, como dizem os militares, antiguidade é posto 

(Vocês parem de encher meu saco)

E é amor que vibro 

É amor que vivo 

E vejo poesia nas flores 

E vejo poesia nas pessoas 

Nos meus olhares cansados 

Vejo poesia na maconha que você fuma 

Vejo poesia no fumo.

https://www.youtube.com/watch?v=xMe2xGb_ccw

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Foto: reprodução