Iza Kamile, de 19 anos, uma das duas vítimas da tragédia que abalou Parintins (AM) na madrugada desta terça-feira, dia 19, tinha personalidade forte e a sensibilidade da poesia em sua vida.
Por exemplo, em 26 de maio do ano passado, ela assim se mostrou em poesias de sua autoria que declamou no Facebook.
Nos versos, pode-se ver um pouco de seu ser, da sua condição de mulher, de sua ancestralidade e religiosidade.
Mulheridade
Em sua vida, diz nos versos, não há espaço para o veneno e para quem não entende o peso de sua ancestralidade e mulheridade.
Iza Kamile morreu na madrugada de hoje, numa tragédia em família, que também vitimou fatalmente sua mãe, Izandra Bentes 41 anos.
Jovane Matos, sargento PM, pai e marido, é o acusado dos crimes. Ele estava afastado da corporação por problemas psicológicos.
A tragédia só não foi maior porque seu filho conseguiu contê-lo. Há informação de que ele tentou contra a vida do filho e dele próprio.
Leia e assista às poesias de Iza, que também apresentava quadro de depressão, segundo a família.
Laroyê!
Tenho tido medo de muita coisa
Mas nunca de mim
Nunca de quem sou
Nunca do que penso
Nunca do que acho
Nunca da minha vocação
Nunca do meu curso
Nunca daquilo que está destinado que está destinado a ser
Não por força de um Deus mal, de um tirano
Mas de um Deus que muito me ama
Que me deu tantos e tantos dias
Tantas e tantas vontades, sonhos, metas, que, aos néscios, são como loucuras
E é bíblico
A palavra da cruz é loucura para os que vão perecendo
Mas, para nós, que somos salvos ao poder Deus
Ser salvo ou não ser é uma questão de bastante retórica
Eu deixo essa questão para os católicos
Não me importa. Eu não me interesso
Eu sei quem tem estado comigo
Eu ouvi o boa noite Zepelim um dia desses
E percebi que eu já não teria fuga
O canto de Maria Navalha
Vem pro meu peito, vem pro meu peito
E quem me provoca só ouve um canto de Pomba Gira em resposta.
Os defeitos que eu gosto de ter
Quem me provoca só ouve um canto de pomba gira em resposta
Eu não negocio com o mal
Não há espaço em minha vida para o veneno
Não há espaço em minha vida pra quem não entende
O peso que há na minha ancestralidade
O peso que há na minha mulheridade
O peso que há em todas as estratificações às que eu pertenço
Não abro alas para o inferno
Porque entendo quem sou
Eu sei quem sou
Sei dos meus defeitos, das minhas fraquezas
Sei dos defeitos que eu gosto de ter
Sei dos meus excessos
E gosto de pecar por excesso
Exu nos ensina que o que é certo e errado depende do contexto
O homem ocidental não consegue ter essa visão
Porque sua mente está mirrada por uma visão de Deus-Capeta, céu-inferno
Tudo muito dual
Mas Exu é o senhor dos caminhos
É o senhor da encruzilhada
Cinco mil anos, meu amor
Cinco mil anos tem o Candomblé
Cristo nasceu há dois mil anos
E, como dizem os militares, antiguidade é posto
(Vocês parem de encher meu saco)
E é amor que vibro
É amor que vivo
E vejo poesia nas flores
E vejo poesia nas pessoas
Nos meus olhares cansados
Vejo poesia na maconha que você fuma
Vejo poesia no fumo.
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Foto: reprodução