Papa Francisco abre mais espaço a mulheres na igreja na Amazônia
Mudança se refere ao acesso das mulheres ao ministĂ©rio instituĂdo do leitorado e acolitado

Publicado em: 12/01/2021 Ă s 11:20 | Atualizado em: 12/01/2021 Ă s 13:39
o Papa Francisco assinou um novo “Motu Proprio”, intitulado “Spiritus Domini”. Esta Ă© uma modificaĂ§Ă£o do cĂ¢non 230, parĂ¡grafo 1 do CĂ³digo de Direito CanĂ´nico, e se refere ao acesso das mulheres ao ministĂ©rio instituĂdo do leitorado e acolitado.
Em suas palavras, o Papa coloca como base para sua decisĂ£o que esses ministĂ©rios sĂ£o “uma forma particular de exercĂcio do sacerdĂ³cio batismal”, dando mais um passo no Motu Proprio Ministeria quaedam, com o qual SĂ£o Paulo VI, em 1972, definiu os “ministĂ©rios leigos”, que eram reservados aos que se preparavam para “a recepĂ§Ă£o do Sacramento da Ordem Sagrada“, e “a outros fiĂ©is idĂ³neos do sexo masculino”.
Como afirma o texto pontifĂcio, pretende-se responder Ă s discussões realizadas em “algumas assembleias do SĂnodo dos Bispos”, nas quais, segundo Spiritus Domini, “a necessidade de aprofundar doutrinariamente o tema tornou-se evidente, para que possa responder Ă natureza destes carismas e Ă s necessidades dos tempos, e oferecer um apoio oportuno ao papel de evangelizaĂ§Ă£o que diz respeito Ă Â comunidade eclesial”.
Podemos dizer que esta Ă© uma mudança que tem o SĂnodo para a AmazĂ´nia como sua principal força motriz, que nĂ£o devemos esquecer que entre seus objetivos estava a busca de novos caminhos para a Igreja, destacando a força da periferia e do discernimento sinodal.
De fato, este foi um pedido expresso que a assembleia sinodal fez ao Santo Padre, como consta no Documento Final do SĂnodo: ” o Motu Propio de SĂ£o Paulo VI, Ministeria quaedam, para que tambĂ©m mulheres adequadamente formadas e preparadas possam receber os ministĂ©rios do Leitorado e do Acolitado”, insistindo em “se promovam e se confiram ministĂ©rios para homens e mulheres de maneira equitativa”. NĂ£o esqueçamos que este documento foi assumido pelo Papa Francisco, autorizando imediatamente sua difusĂ£o e oficialmente na Querida AmazĂ´nia.
O Documento Final tambĂ©m propĂ´s a instituiĂ§Ă£o de outro ministĂ©rio, o de “mulher dirigente da comunidade”, algo que nĂ£o Ă© compreendido em outros contextos eclesiais, mas que, na AmazĂ´nia, onde a presença sacerdotal Ă© reduzida a visitas esporĂ¡dicas, nĂ£o mais do que duas por ano em muitos casos, Ă© mais do que necessĂ¡rio, jĂ¡ que ” a maioria das comunidades catĂ³licas Ă© liderada por mulheres”.
Da mesma forma, este documento insiste em fortalecer a participaĂ§Ă£o das mulheres no discernimento e na tomada de decisões. Tudo isso em resposta ao que Ă© dito no documento acima mencionado, que deixa claro que: “É a Igreja de homens e mulheres batizados que devemos consolidar, promovendo a ministerialidade”.
Esta insistĂªncia em ” ampliar os espaços para uma presença feminina mais incisiva na Igreja”, Ă© algo que faz parte do pensamento do Papa Francisco desde o inĂcio de seu pontificado, e foi retomado na Evangelii Gaudium, considerada o programa de seu pontificado.
O SĂnodo para a AmazĂ´nia foi uma oportunidade para deixar claro qual deveria ser o papel da mulher na Igreja: “Ă© necessĂ¡rio que a Igreja assuma em seu seio com maior força a liderança das mulheres, e que as reconheça e promova, fortalecendo sua participaĂ§Ă£o nos conselhos pastorais das parĂ³quias e dioceses, inclusive nas instĂ¢ncias de governo”, algo que surgiu de forma clara e insistente no processo de escuta sinodal.
Muita gente, tambĂ©m o Papa Francisco, Ă© consciente do verdadeiro papel da mulher na AmazĂ´nia, onde “hĂ¡ comunidades que se mantiveram e transmitiram a fĂ© durante longo tempo, mesmo decĂªnios, sem que algum sacerdote passasse por lĂ¡. Isto foi possĂvel graças Ă presença de mulheres fortes e generosas, que batizaram, catequizaram, ensinaram a rezar, foram missionĂ¡rias, certamente chamadas e impelidas pelo EspĂrito Santo. Durante sĂ©culos, as mulheres mantiveram a Igreja de pĂ© nesses lugares com admirĂ¡vel dedicaĂ§Ă£o e fĂ© ardente”, como ele diz em Querida AmazĂ´nia.
O Papa Francisco, ao falar do papel da mulher na Igreja, sempre quis ir alĂ©m de uma abordagem funcional, como ele afirma na Querida AmazĂ´nia, insistindo que a Igreja, ” sem as mulheres, ela se desmorona, como teriam caĂdo aos pedaços muitas comunidades da AmazĂ´nia se nĂ£o estivessem lĂ¡ as mulheres, sustentando-as, conservando-as e cuidando delas”.
Ele defende a exigĂªncia de “que estimulemos o aparecimento doutros serviços e carismas femininos que deem resposta Ă s necessidades especĂficas dos povos amazĂ³nicos neste momento histĂ³rico”.
O novo Motu Proprio pode ser visto como uma consequĂªncia das palavras em Querida AmazĂ´nia, onde se diz que o papel da mulher precisa de “uma estabilidade, um reconhecimento pĂºblico e um envio por parte do bispo”, algo que agora pode ser realizado de forma canĂ´nica. Trata-se, como o texto divulgado em 11 de janeiro nos mostra, de enfatizar “a condiĂ§Ă£o comum de ser batizado e o sacerdĂ³cio real recebido no sacramento do Batismo“, no qual homens e mulheres participam da mesma forma e com a mesma dignidade, algo nem sempre explicitamente reconhecido ao longo da histĂ³ria.
Sabemos que, na prĂ¡tica, isto Ă© algo que foi assumido em muitos lugares e que alguns defendem que se deve ir muito mais longe neste campo. Mas nĂ£o podemos esquecer que, em uma Igreja sinodal, Ă© fundamental caminhar juntos, evitando querer correr demais ou comprometer-se a tomar uma posiĂ§Ă£o contra os sinais dos tempos. Os frutos do discernimento devem ser assumidos por todos, algo em que, mais uma vez, o Papa Francisco nos deu um exemplo ao tornar efetivo o pedido de uma assembleia sinodal, a primeira em que as mulheres tiveram um papel mais que destacado, ao ponto de, como ele diz, “no SĂnodo, elas mesmas nos comoveram a todos com o seu testemunho”.
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