Bolsonaro é acusado de tratar com descaso sumiço de jornalista e indigenista
Presidente tratou o caso como se as vítimas fossem culpadas pela fatalidade

Iram Alfaia, do BNC Amazonas em Brasília
Publicado em: 07/06/2022 às 16:36 | Atualizado em: 07/06/2022 às 17:02
Num tom bem diferente da nota do Itamaraty, na qual diz que o governo se compromete em punir os possíveis culpados pelo sumiço do jornalista inglês Dom Phillips e do indigenista Bruno Pereira, Bolsonaro tratou o caso como se as vítimas fossem culpadas pelo infortúnio. Os dois estão desaparecidos no Vale do Javari, no Amazonas, desde domingo (5).
“Realmente duas pessoas apenas em um barco, em uma região daquela, completamente selvagem, é uma aventura que não é recomendável que se faça. Tudo pode acontecer”, disse o presidente nesta terça-feira (7).
De acordo com ele, pode ser um acidente, pode ser que tenham sido executados. “A gente espera e pede a Deus que sejam encontrados brevemente. As Forças Armadas estão trabalhando com muito afinco na região”, disse Bolsonaro.
O deputado federal Camilo Capiberibe (PSB-AP) criticou a fala do presidente: “Chocante o descaso do governo Bolsonaro com o desaparecimento do indigenista Bruno Araújo e do jornalista Dom Phillips em pleno dia nacional da liberdade de imprensa. Vivemos uma era das trevas, mas vamos virar essa triste página da nossa história.”
Capiberibe diz que esse tipo de declaração é uma verdadeira bofetada na cara dos parentes e amigos dos desaparecidos.
“E traz de volta o pouco caso, a falta de empatia e o deboche do presidente Bolsonaro nos momentos mais dramáticos da pandemia com as famílias das 667 mil vítimas da covid-19”.
Ex-deputada federal por três mandatos e atual prefeita de Juiz de Fora, Margarida Salomão (PT) prevê que o Brasil está próximo de uma crise diplomática.
“Um jornalista estrangeiro e um indigenista podem ter sido vítimas de perseguição política no Amazonas. Mas, o inominável que nos governa prefere ridicularizar o fato, tratando ambos como culpados e irresponsáveis”.
Famílias
Os familiares do indigenista e do jornalista distribuíram nota cobrando providências. Beatriz de Almeida Matos, companheira de Bruno, e os irmãos dele Max da Cunha Araújo Pereira e Felipe da Cunha Araújo Pereira, pedem informações.
“Durante todo o dia de ontem, tivemos poucas informações sobre a localização deles, o que tem aumentado este sentimento. Mas também temos muita esperança de que tenha sido algum acidente com o barco e que eles estejam à espera de socorro”, dizem.
Alessandra Sampaio, esposa de Dom Phillips, jornalista britânico, fez um apelo: “Quero implorar às autoridades brasileiras que busquem meu marido. No momento em que faço este apelo, eles já estão desaparecidos há mais de 30 horas no Vale do Javari, uma das regiões mais conflagradas da Amazônia”, escreveu.
Ela diz que, na floresta, cada segundo pode ser vida ou morte. “Sabemos que, depois que anoitece, se torna muito difícil se mover, quase impossível encontrar pessoas desaparecidas. Uma manhã perdida é um dia perdido, um dia perdido é uma noite perdida”, disse.
Entidades Indígenas
Em nota conjunta, Univaja, Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (Opi), Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) e Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) criticaram as ações do governo na região.
“Circularam informações sobre as limitações das forças de segurança para obter, entre outros meios, helicópteros que dessem o necessário suporte às operações de busca, o que é imprescindível para complementar as ações fluviais e terrestres dadas as condições geográficas da região”, diz um trecho da nota.
Para as entidades, “cada hora que passa coloca em risco definitivo a possibilidade de sobrevivência dos dois desaparecidos, ao mesmo tempo em que faz crescer a consolidação de um território sem lei, nas mãos de criminosos confiantes nos seus plenos poderes perante a incapacidade de atuação dos representantes legítimos do estado de direito.”
CMA
Em nota, o Comando Militar da Amazônia (CMA) informou à Frente Parlamentar de Defesa dos Povos Indígenas que o 4º Batalhão de Aviação do Exército somou aos esforços “a capacidade aeromóvel, apoiando o deslocamento de agentes da Polícia Federal e agregando mobilidade às equipes interagências na área de operações por meio de um helicóptero”.
Leia mais
Pescadores são detidos pela PF suspeitos por desaparecimento no AM
Foto: Clauber Caetano/Presidência