Relator da ONU acha que lei da anistia deveria ser revista
"Entรฃo, acho que, em 2025, seria importante revisitar esse assunto para garantir que a lei esteja de acordo com a lei internacional de direitos humanosโ, afirmou.

Da Redaรงรฃo do BNC Amazonas
Publicado em: 07/04/2025 ร s 16:52 | Atualizado em: 07/04/2025 ร s 16:52
O relator da Organizaรงรฃo das Naรงรตes Unidas (ONU) Bernard Duhaime, sugeriu que lei da anistia deveria ser revista. Ele encerrou, nesta segunda-feira (7), visita de uma semana pelo Brasil.
Duhaime atua na ONU para Promoรงรฃo da Verdade, Justiรงa, Reparaรงรฃo e Garantias de Nรฃo Repetiรงรฃo. Como informa a Agรชncia Brasil.
Dessa forma, o enviado especial da ONU vai preparar um relatรณrio sobre como o Estado brasileiro estรก lidando com os crimes cometidos durante a ditadura civil-militar de 1964 a 1985, que serรก apresentado em setembro ao Conselho de Direitos Humanos da organizaรงรฃo.
Nesse sentido, em entrevista ร imprensa, hoje no Rio de Janeiro, Duhaime destacou alguns pontos que geram preocupaรงรฃo, como a aplicaรงรฃo daย lei da anistia (Lei 6.638/79).
Por exemplo, ele destacou que a decisรฃo do Supremo Tribunal Federal (STF), em 2010, de considerar que as violaรงรตes de direitos humanos, cometidas por agentes de Estado, eram passรญveis de anistia, โabriu as portas para a impunidadeโ.
โHรก vรกrios problemas em relaรงรฃo ร compatibilidade da lei de anistia com a legislaรงรฃo internacional de direitos humanos. Entรฃo, acho que, em 2025, seria importante revisitar esse assunto para garantir que a lei esteja de acordo com a lei internacional de direitos humanosโ, afirmou.
Conforme ele, apesar de ser positiva, por exemplo, a restituiรงรฃo dos direitos polรญticos ร s pessoas que foram detidas e cassadas pela ditadura, โa decisรฃo de 2010, do Supremo Tribunal Federal, de incluir o perdรฃo a violaรงรตes de direitos humanos atribuรญdas a agentes do Estadoโ permitiu que eles nรฃo fossem punidos.
โA ausรชncia de consequรชncias legais para abusos passados โโreforรงou uma cultura de impunidade e estabeleceu condiรงรตes para repetiรงรฃo, ao permitir que a retรณrica e a prรกtica autoritรกria ressurgissem no discurso polรญtico como evidรชncia, em janeiro de 2023, de suposta tentativa de golpeโ, afirmou Duhaime.
Alรฉm disso, o relator disse aindaย que continuarรก acompanhando atentamente os desdobramentos relacionados ao julgamento de pessoas acusadas e processadas por tentativa de golpe de Estado no Brasil, em 2022 e no inรญcio de 2023.
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Violaรงรตes
Da mesma forma, ele destacou a continuidade de prรกticas de violaรงรตes de direitos humanos nos dias de hoje, mesmo 40 anos depois do fim da ditadura, como os abusos policiais e execuรงรตes extrajudiciais pela polรญcia.
โDurante a minha visita, ouvi testemunhos de variados setores sociais sobre a persistรชncia da violรชncia estatal, nas mรฃos da polรญcia e das Forรงas Armadas. Execuรงรตes sumรกrias, tortura e detenรงรตes arbitrรกrias continuam a permear a sociedade brasileira em รญndices alarmantes, afetando particularmente povos indรญgenas, camponeses e pessoas de descendรชncia africana. A responsabilizaรงรฃo por tais crimes raramente รฉ feita, o que encoraja e perpetua ainda mais essas prรกticasโ.
Segundo ele, as violaรงรตes cometidas por agentes do Estado contra pessoas nรฃo sรฃo prevenidas e nem levadas ร Justiรงa.
โA reforma de instituiรงรตes envolvidas em violaรงรตes de direitos humanos durante a ditadura รฉ um princรญpio crucial da transiรงรฃo judicial, que visa a prevenir a recorrรชncia da violรชncia. No entanto, tais processos nรฃo foram o foco do processo de transiรงรฃo do Brasilโ, disse o relator da ONU.
Portanto, Duhaime se mostrou preocupado tambรฉm com a falta de iniciativas de preservaรงรฃo da memรณria de alguns locais relacionados a violaรงรตes de direitos humanos durante a ditadura, como os prรฉdios do DOI-Codi, em Sรฃo Paulo, do Dops, no Rio de Janeiro, e da Casa da Morte, em Petrรณpolis.
โEu endosso totalmente as demandas da sociedade civil para que essas instalaรงรตes sejam preservadas e estabelecidas como locais de memรณria, sob a jurisdiรงรฃo das autoridades civisโ, afirmou o relator, completando que tambรฉm geram preocupaรงรตes โo ato de negacionismo de violaรงรตes passadas e a glorificaรงรฃo da ditaduraโ por alguns setores da sociedade.
*Com informaรงรตes da Agรชncia Brasil.
Foto: Priscila Thereso/Rรกdio Agรชncia