Por mentir a embaixadores sobre urnas, YouTube derruba live de Bolsonaro

Na live de 2021 derrubada pelo Youtube, Bolsonaro apresentou vĂ­deos da internet e teorias jĂ¡ desmentidas que circulam na internet, com cĂ¡lculos errados, como supostas provas de fraude nas eleições

Publicado em: 19/07/2022 Ă s 12:08 | Atualizado em: 19/07/2022 Ă s 12:33

O YouTube derrubou na segunda-feira (18) uma live de julho de 2021 em que o presidente Jair Bolsonaro (PL) faz conspirações e afirmações infundadas sobre a segurança das urnas eletrĂ´nicas.

O conteĂºdo da live derrubada embasou parte do que foi apresentado no evento desta segunda-feira (18) com embaixadores. A empresa tambĂ©m avalia se vai manter no ar a transmissĂ£o desta segunda.

A embaixadores, o presidente deu a entender que uma empresa estrangeira conta os votos, nĂ£o a Justiça Eleitoral, disse que hĂ¡ mais de 100 vĂ­deos com apoiadores reclamando que a urna autocompletou o nĂºmero 13, do PT, na eleiĂ§Ă£o passada, e que “o prĂ³prio TSE diz que em 2018 nĂºmeros podem ter sido alterados”, o que nĂ£o Ă© verdade.

Procurado, o YouTube afirmou que suas regras devem ser seguidas por todos os usuĂ¡rios da plataforma e que a empresa tem trabalhado para manter suas polĂ­ticas e sistemas atualizados para reduzir a disseminaĂ§Ă£o de informações enganosas.

“Desde março de 2022, removemos conteĂºdo com alegações falsas de que as urnas eletrĂ´nicas brasileiras foram hackeadas na eleiĂ§Ă£o presidencial de 2018 e de que os votos foram adulterados. Esse Ă© um dos exemplos do que nĂ£o permitimos de acordo com nossa polĂ­tica contra desinformaĂ§Ă£o em eleições.”

PolĂ­tica de retirada de imagens

Desde março, a plataforma de vĂ­deos do Google tem uma polĂ­tica que garante a remoĂ§Ă£o de conteĂºdos que contenham alegações falsas de fraudes, erros ou problemas tĂ©cnicos sobre a eleiĂ§Ă£o de 2018.

Embora tenha retirado o vĂ­deo de Bolsonaro de 29 de julho de 2021, a Folha identificou mais trĂªs cĂ³pias dessa transmissĂ£o, uma na TVBrasilGov, com 1,8 milhĂ£o de visualizações, outra na TVPajeu e outra na Jovem Pan, com quase 303 mil visualizações.

Nesta segunda, Bolsonaro fez uma apresentaĂ§Ă£o a dezenas de embaixadores estrangeiros no PalĂ¡cio da Alvorada para repetir teorias da conspiraĂ§Ă£o sobre urnas eletrĂ´nicas, desacreditar o sistema eleitoral, promover novas ameaças golpistas e atacar ministros do STF (Supremo Tribunal Federal).

O chefe do Executivo concentrou suas críticas nos ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin e Luís Roberto Barroso.

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VitĂ³ria de Lula jĂ¡ Ă© admitida atĂ© por Bolsonaro

Fachin Ă© o atual presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Barroso presidiu a corte eleitoral, e Moraes deve comandar o tribunal durante as eleições.

Em mais de um momento, Bolsonaro tentou desacreditar os ministros, relacionando especialmente Fachin e Barroso ao PT e ao ex-presidente Luiz InĂ¡cio Lula da Silva (PT).

O petista lidera as pesquisas de intenĂ§Ă£o de voto, a menos de 80 dias do pleito. Bolsonaro estĂ¡ em segundo lugar, com 19 pontos de diferença, segundo o Datafolha.

A velha “viagem” de Bolsonaro

Na fala aos embaixadores, Bolsonaro adotou um tom manso, como se buscasse dar um verniz de seriedade a mais um punhado de ilações sem provas ou indĂ­cios ao sistema eleitoral, no momento em que aparece distante do ex-presidente Lula nas pesquisas de intenĂ§Ă£o de voto.

No Brasil, nunca houve registro de fraude nas urnas eletrĂ´nicas, em uso desde 1996.

Na live de 2021 derrubada pelo Youtube, Bolsonaro apresentou vĂ­deos da internet e teorias jĂ¡ desmentidas que circulam na internet, com cĂ¡lculos errados, como supostas provas de fraude nas eleições. Admitiu, porĂ©m, que na verdade nĂ£o tinha provas, apenas “vĂ¡rios indĂ­cios”.

Um exemplo disso Ă© que o presidente diz que tem provas de que as eleições foram fraudadas. No entanto, durante a live em que apresentaria provas, Bolsonaro disse que tinha apenas indĂ­cios. “Um crime se desvenda com vĂ¡rios indĂ­cios. Vamos apresentar vĂ¡rios indĂ­cios aqui”, disse.

​Bolsonaro nunca apresentou provas ou indĂ­cios sobre as urnas, mas repete o discurso golpista como uma forma de esconder os problemas de seu governo, a alta reprovaĂ§Ă£o e as recentes pesquisas.

Por meio de uma profusĂ£o de mentiras, Bolsonaro vem fomentando a descrença nas urnas. No entanto, ao invĂ©s de ser barrado por aqueles ao seu redor, o mandatĂ¡rio tem contado com o respaldo de militares, membros do alto escalĂ£o do governo e seu partido em sua cruzada contra a Justiça Eleitoral.

As Forças Armadas tĂªm repetido o discurso de Bolsonaro. Em ofĂ­cio recente, solicitaram ao TSE todos os arquivos das eleições de 2014 e 2018, justamente os anos que fazem parte da retĂ³rica de fraude do presidente.

Antes de ser eleito em 2018, Bolsonaro jĂ¡ dizia que sĂ³ nĂ£o ganharia se houvesse fraude.

O discurso aparenta assim funcionar como um plano B para o caso de perder o pleito. TambĂ©m funcionou como uma tentativa de pressionar o Congresso pela aprovaĂ§Ă£o do voto impresso.

No ano passado, veio a mais forte ameaça golpista ligada ao tema. Em conversa com apoiadores, Bolsonaro disse que “a fraude estĂ¡ no TSE” e ainda atacou o entĂ£o presidente da corte eleitoral e ministro do STF, LuĂ­s Roberto Barroso, a quem chamou de “idiota” e “imbecil”.

“NĂ£o tenho medo de eleições, entrego a faixa para quem ganhar, no voto auditĂ¡vel e confiĂ¡vel. Dessa forma [atual], corremos o risco de nĂ£o termos eleiĂ§Ă£o no ano que vem”, disse.

A fala ocorreu apĂ³s uma sequĂªncia. No dia anterior, tambĂ©m ao falar com apoiadores, o mandatĂ¡rio fez outra ameaça semelhante: “Ou fazemos eleições limpas no Brasil ou nĂ£o temos eleições”.

Pesquisa Datafolha mostrou que, em meio à ofensiva feita por Bolsonaro, o percentual de eleitores que confiam nas urnas eletrônicas passou de 82%, em março, para 73%, em maio.​

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Foto: Wilson Dias/AgĂªncia Brasil