Cientistas estrangeiros estão perplexos com a queda abrupta de casos de covid (coronavírus) na América do Sul, no Brasil em particular. Os números os surpreendem e eles divagam sobre prováveis causas, sem, no entanto, visualizá-las. A reportagem é da BBC News Brasil.
De acordo com a publicação, em meados de junho, enquanto o resto do mundo experimentava um baixo número de novos casos de covid, a América do Sul se tornava o epicentro da pandemia.
Naquele período, sete das dez nações com mais mortes diárias per capita pela doença estavam na região: a taxa de óbitos do Brasil era sete vezes superior à da Índia, enquanto a Colômbia e a Argentina apresentavam números equivalentes ao triplo do que era registrado em todo o continente africano.
Com apenas 5% da população mundial, a América do Sul tinha uma taxa de mortalidade per capita oito vezes maior do que a média global.
Mas esse cenário parece ter virado coisa do passado.
A partir de julho, o número de infecções começou a diminuir de forma consistente.
Com isso, a região se tornou uma das áreas do mundo onde a pandemia parece estar mais controlada.
Média semanal de casos
Na segunda semana de setembro, a média semanal de casos confirmados de covid-19 por 100 mil habitantes foi de 52 no Reino Unido e 43 nos Estados Unidos. No Brasil, esse número ficou apenas 8, na Argentina, em 6 e na Colômbia, em 3.
Os dados são do site Our World In Data , mantido por pesquisadores da Universidade de Oxford .
No início de junho, o Uruguai registrava 100 casos por 100 mil habitantes. Agora, tem apenas 4.
Já o Paraguai chegou a ultrapassar 40, agora, não alcança nem uma notificação por 100 mil habitantes nos últimos dias.
Mas como explicar essa queda abrupta nas estatísticas?
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Entre imunidade e incógnitas
“A primeira coisa que gostaria de dizer é que não estamos totalmente tranquilos”, responde Andrés Vecino, pesquisador em sistemas de saúde da Escola de Saúde Pública John Hopkins, nos Estados Unidos.
O especialista lembra que não é a primeira vez que ocorre uma diminuição de casos do tipo, que parece anunciar a proximidade do fim da pandemia.
Algumas semanas depois, porém, surge uma nova onda de infecções que revela que o problema não estava resolvido.
“É importante dizer que não sabemos exatamente o que está acontecendo agora e que o fato de os casos estarem diminuindo não significa que isso continuará assim no futuro. Quero lembrar o que aconteceu na Índia, onde houve uma baixa importante nos casos, seguida de um grande aumento com o surgimento da variante Delta”, alerta Vecino.
Ministério da Saúde
A epidemiologista Carla Domingues, que coordenou o Programa Nacional de Imunizações do Ministério da Saúde do Brasil entre 2011 e 2019, emitiu recentemente um alerta semelhante.
“Esse é um fenômeno que não sabemos explicar”, disse ao jornal americano The New York Times.
No entanto, os especialistas dão algumas pistas que ajudam a entender um pouquinho melhor o que pode estar acontecendo.
A primeira delas é a vacinação. Nos últimos tempos, os países sul-americanos aceleraram a aplicação das doses, algo que, segundo muitos especialistas, pode ter contribuído para conter o crescimento das infecções pelo novo coronavírus.
Vecino concorda, mas não aponta apenas para o efeito dos imunizantes. De acordo com ele, é preciso avaliar a imunidade adquirida tanto pela vacinação quanto pela infecção natural, já que muitas pessoas da região pegaram o vírus. “Há mais ou menos um consenso de que é possível que a redução de casos na América do Sul esteja relacionada a algum grau de imunidade da população”, destaca.
“Um estudo feito recentemente em 12 cidades da Colômbia mostra que 89% das pessoas que moram nesses locais já tiveram contato com o coronavírus. Com isso, é possível que, em locais onde o índice de infecção é tão alto, ocorra uma redução da doença”, interpreta o pesquisador.
Caso Colômbia
Vecino faz, porém, um alerta: como a população não é homogênea, esses achados da Colômbia precisam ser interpretados com muito cuidado. Ou seja: não é possível afirmar que nove em cada dez pessoas já tiveram covid-19, então, elas estão livres para sair sem máscara e não precisam tomar a vacina. Não é bem assim.
“Os indivíduos mantêm relações na forma de grupos. É possível, então, que existam grupos inteiros de pessoas que ainda não foram infectadas ou vacinadas. Eles podem sofrer com surtos de covid-19 num futuro próximo”, conta.
“Esse risco aumenta se variantes altamente transmissíveis continuarem a circular e a aparecer, como é o caso de Delta, Gama e Mu, que já estão na América Latina. E isso obviamente pode causar um novo aumento de casos e óbitos.”
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Foto: Camila Batista/Semsa