Com pandemia, preços dos carros usados e novos ficam fora da realidade

Com a falta de chips, que fez a indĂºstria brasileira deixar de produzir ao menos 300 mil veĂ­culos zero quilĂ´metro em 2021, a venda de veĂ­culos usados e seminovos cresceu 17,8% ano passado

Publicado em: 05/01/2022 Ă s 11:44 | Atualizado em: 05/01/2022 Ă s 11:54

Com a falta de chips, que fez a indĂºstria brasileira deixar de produzir ao menos 300 mil veĂ­culos zero quilĂ´metro em 2021, a venda de veĂ­culos usados e seminovos cresceu 17,8% ano passado, quando foram comercializadas 15,1 milhões de unidades, segundo dados da FederaĂ§Ă£o Nacional das Associações dos Revendedores de VeĂ­culos Automotores (Fenauto).

É o maior crescimento da histĂ³ria do setor, que em mĂ©dia, registra expansĂ£o de 3% a 4% ao ano. O aumento da procura teve impacto no preço, fazendo com que a alta superasse a dos veĂ­culos novos.

Segundo analistas, com a valorizaĂ§Ă£o dos usados, o IPVA deve subir em torno de 23% neste ano e para evitar inadimplĂªncia, estados devem oferecer um bom desconto para evitar inadimplĂªncia.

Somente no mĂªs de dezembro foram vendidos 1.201.600 veĂ­culos seminovos e usados, contra 1.165.436, em novembro, uma alta de 3,1%.

Neste nĂºmero, estĂ£o incluĂ­dos veĂ­culos como Ă´nibus, caminhões e motos. Considerando apenas automĂ³veis, o crescimento foi de 17,4%, e nos comerciais leves, a expansĂ£o das vendas foi de 21,9%, num total de 11 milhões de unidades vendidas dessas duas categorias.

“Em 2020, as vendas caĂ­ram 12%. Quando comparamos o crescimento de 2021 com 2019, um ano sem pandemia, as vendas tiveram alta de 3,5%”, diz JosĂ© Everton, vice-presidente da Fenauto.

Seminovo tem alta de 15,07%

AlĂ©m do gargalo dos carros zero, outros fatores impulsionaram as vendas de usados e seminovos, segundo a Fenauto: a necessidade de levantar dinheiro para pagar dĂ­vidas (a famosa troca com troco, no qual quem vende o automĂ³vel, opta por ficar com um de menor valor e recebe a diferença), maior oferta de crĂ©dito para financiamentos e o medo de usar o transporte pĂºblico, ainda por causa da pandemia.

O designer Fabio Ventura comprou um Chevrolet Astra 2009 no fim de dezembro. O carro foi comprado para a mulher por R$ 25 mil. O modelo novo, segundo ele, superaria os R$ 100 mil.

“NĂ£o teria nem como comprar um carro de entrada, que jĂ¡ supera os R$ 60 mil. Queria um carro com conforto e mais tecnologia de ponta”, conta.

As vendas de veĂ­culos novos, incluindo automĂ³veis, comerciais leves, Ă´nibus e caminhões, cresceram 3% ano, em 2021, com 2,1 milhões de unidades.

JĂ¡ as de carros novos (automĂ³veis e comerciais leves) cresceram 1,4%, em 2021, com 1,9 milhĂ£o de unidades vendidas, segundo dados preliminares que devem ser confirmados amanhĂ£ pela FederaĂ§Ă£o Nacional de DistribuiĂ§Ă£o de VeĂ­culos Automotores (Fenabrave).

A estimativa inicial das montadoras era de crescimento de 15% nas vendas de carros zero, no inĂ­cio de ano, o que nĂ£o se concretizou.

Melhora no 2º semestre

Segundo levantamento da consultoria Kelley Blue Book (KBB Brasil), empresa especializada em pesquisa de preços de veĂ­culos novos e usados, os carros zero subiram 8,29%, em mĂ©dia, no acumulado de 2021, atĂ© novembro. JĂ¡ os seminovos tiveram alta de 15,07%. Carros usados, a partir de 2017, subiram 21,01% no mesmo perĂ­odo, na mĂ©dia.

“No ano passado, quando havia fila de atĂ© seis meses para receber alguns modelos de carro zero, os seminovos do mesmo modelo chegaram a ficar mais caros que os zero quilĂ´metro no primeiro semestre”, diz Everton, da Fenauto.

Um Fiat Strada zero, por exemplo, custava R$ 79 mil nas concessionĂ¡rias. Mas um veĂ­culo da mesma marca, seminovo, era oferecido por atĂ© R$ 81,7 mil nos revendedores, com pronta entrega, segundo levantamento da KBB Brasil Ă  Ă©poca.

O mesmo valia para um automĂ³vel Volkswagen modelo T-Cross. O novo custava R$ 113 mil, enquanto o seminovo saĂ­a por atĂ© R$ 116 mil.

“Com a retomada mais forte da produĂ§Ă£o de carros zero essa diferença sumiu. NĂ£o faz sentido um usado ser mais caro que o zero”, diz AntĂ´nio Jorge Martins, especialista do setor automotivo, do Instituto de Desenvolvimento Educacional da FGV.

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Segundo a KBB Brasil, Ă  medida que a indĂºstria automotiva ajustou os estoques para a nova realidade de oferta e demanda provocada pela crise de abastecimento de insumos, houve movimento mais acentuado de reajustes de preços de carros novos. Isso enfraqueceu o fenĂ´meno de alta maior de preço nos seminovos.

Na expectativa da Fenauto, a produĂ§Ă£o de carros zero deve se normalizar, a partir do segundo semestre, e as vendas de usados e seminovos fechariam o ano com alta de 3,5%.

“Vamos ter um segundo semestre mais equilibrado, para o lojista nĂ£o Ă© bom uma alta de preços tĂ£o forte nos usados. Fica caro repor os estoques e as margens de lucro diminuem”, diz Everton.

Mas especialistas avaliam que a falta de chips deve se prolongar atĂ© 2023 por causa do descasamento entre oferta e demanda e veem possĂ­vel impacto no preço dos seminovos. De 2020 a 2022, a ampliaĂ§Ă£o da capacidade produtiva das fabricantes Ă© de 6%, enquanto a demanda tem alta de 17%.

“A falta de componentes deve se estender atĂ© 2023. Muitas empresas estĂ£o expandindo a capacidade de produzir chips, mas a demanda por carros novos estĂ¡ reprimida no Brasil e no mundo”, diz AntĂ´nio Jorge, da FGV.

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