CorrupĂ§Ă£o de R$ 230 milhões e 15 anos de impunidade em Roraima

Publicado em: 27/11/2018 Ă s 15:35 | Atualizado em: 27/11/2018 Ă s 15:35
O desvio de mais de R$ 230 milhões de verbas pĂºblicas num megaescĂ¢ndalo de pagamento a 5,5 mil funcionĂ¡rios fantasmas produziu 85 denunciados em 52 processos, tendo apenas cinco deles transitado em julgado. Assim foi a operaĂ§Ă£o Praga do Egito ocorrida hĂ¡ 15 anos no estado de Roraima.
Em um dia, 42 pessoas foram presas para averiguações. VĂ¡rios dos envolvidos aguardam julgamento e cumprem regularmente seus mandatos nesse perĂodo.
Os nĂºmeros que impressionam sĂ£o do maior esquema de corrupĂ§Ă£o jĂ¡ registrado pela Justiça de Roraima: o escĂ¢ndalo dos gafanhotos.
Deflagrada no domingo, em 26 de novembro de 2003, a operaĂ§Ă£o Praga do Egito completou, nesta segunda-feira (26), 15 anos de execuĂ§Ă£o.
Com base em documentos cedidos pelo MinistĂ©rio PĂºblico Federal em Roraima, o G1 levantou e analisou 52 ações principais relacionadas ao caso.
Mais de uma dĂ©cada depois, apenas cinco destes processos chegaram a uma resoluĂ§Ă£o com sentença transitada em julgado (tramitaĂ§Ă£o concluĂda).
A maioria das demais receberam sentença da Justiça Federal de Roraima, mas aguardam julgamento em graus de recurso.
Entretanto, o nĂºmero de rĂ©us e processos Ă© maior.
O volume de trabalho gerado pela operaĂ§Ă£o foi tamanho, que nĂ£o se sabe com precisĂ£o quantas pessoas foram denunciadas, condenadas, inocentadas ou quantos processos ela gerou.
A mĂ¡fia
Coordenadas pelo MPF-RR e pela PolĂcia Federal em Roraima, a operaĂ§Ă£o Praga do Egito apontou uma mĂ¡fia que desviava recursos pĂºblicos federais e estaduais entre os anos de 1998 e 2002 para deputados estaduais, federais e conselheiros do Tribunal de Contas de Roraima.
As investigações do MPF e da PF apontaram que o ex-governador do estado, Neudo Ribeiro Campos (na foto destacada com a mulher dele, Suely Campos, foi o mentor do esquema de corrupĂ§Ă£o. Ele teve a prisĂ£o decretada pelo Tribunal Regional Federal da 1ª RegiĂ£o em 2016, apĂ³s condenaĂ§Ă£o em 2ª instĂ¢ncia a 10 anos e oito meses de reclusĂ£o.
Atualmente ele cumpre prisĂ£o domiciliar. Dos 52 processos consultados, Neudo Ă© parte em 36.
Entre os diversos crimes aos quais os rĂ©us da operaĂ§Ă£o respondem, estĂ£o peculato, estelionato, formaĂ§Ă£o de quadrilha e improbidade administrativa.
Dos 85 réus levantados, Neudo é um dos poucos presos.
Foro privilegiado
O procurador do MPF responsĂ¡vel pelas investigações, RĂ´mulo Moreira Conrado, explicou que a demora no julgamento dos processos ocorre nos tribunais superiores e em razĂ£o de normas sobre prerrogativa de foro que nĂ£o eram bem definidas na Ă©poca do escĂ¢ndalo.
“A demora nĂ£o se deve ao juiz federal. Nesse caso dos gafanhotos houve uma tramitaĂ§Ă£o muito rĂ¡pida em primeiro grau. Ela se deve mais a essa estrutura judiciĂ¡ria”, disse, acrescentando que a demora nĂ£o contribui para a resoluĂ§Ă£o dos processos. “A gente esperava que isso se tramitasse mais rĂ¡pido”.
A reportagem tambĂ©m entrou em contato com o juiz Helder GirĂ£o Barreto, responsĂ¡vel pelo julgamento de boa parte das ações na Justiça Federal, entretanto, o magistrado informou que era impedido legalmente de falar sobre o caso dos gafanhotos.
Réus no poder
Quinze anos apĂ³s a deflagraĂ§Ă£o da operaĂ§Ă£o, alguns dos polĂticos apontados como lĂderes no esquema seguem no poder.
Neudo Campos Ă© esposo da atual governadora de Roraima, Suely Campos (PP).
Suely assumiu a corrida eleitoral em 2014 apĂ³s Neudo ser impedido de concorrer pela lei da Ficha Limpa.
Ela perdeu a candidatura Ă reeleiĂ§Ă£o em 2018.
AlĂ©m dele, os deputados estaduais Jalser Renier (SD), Aurelina Medeiros (Pode) e Mecias de Jesus (PRB) sĂ£o rĂ©us em processos do escĂ¢ndalo.
Os conselheiros do TCE, Marcus Hollanda e Henrique Machado tambĂ©m sĂ£o.

Deputado Jalser Renier Ă© um dos rĂ©us em processos do escĂ¢ndalo
Foto: ReproduĂ§Ă£o/O Sul
Reeleitos
Jalser Ă© atualmente presidente da Assembleia Legislativa de Roraima. Ele vai para o sexto mandado em 2019, apĂ³s ter sido o parlamentar mais votado nessas eleições.
Renier chegou a ser condenado a oito meses de reclusĂ£o pelo crime de peculato. Ele foi preso em 2017, porĂ©m, uma decisĂ£o do Supremo Tribunal Federal anulou a condenaĂ§Ă£o e o parlamentar foi solto.
O processo voltou para o Tribunal Regional Federal da 1ª RegiĂ£o. Um novo julgamento da aĂ§Ă£o estĂ¡ previsto para esta quarta-feira (28).
Mecias de Jesus foi eleito deputado estadual seis vezes consecutivas, desde 1995.
Nas Eleições 2018, Mecias foi eleito senador pela primeira vez.
O G1 teve acesso a quatro processos em que o parlamentar consta como réu. Todos aguardam julgamento.
A outra parlamentar rĂ© na Justiça Federal Ă© Aurelina Medeiros. Reeleita este ano, ela tambĂ©m vai para o sexto mandato no prĂ³ximo ano.
Em setembro de 2014, Aurelina foi condenada a pagar multa civil de R$ 159.985.88 e a ressarcir R$ 1.599.588,88 aos cofres pĂºblicos, mas recorreu e o processo segue em tramitaĂ§Ă£o no TRF-1.
Foto: ReproduĂ§Ă£o/NexoJornal.com.br