Desaparecimento expõe Forças Armadas e derruba discurso de ‘soberania nacional’

A reserva indígena no Vale do Javari registra episódios de assassinatos de indígenas, tráfico de drogas e crimes ambientais

Ferreira Gabriel

Publicado em: 10/06/2022 às 10:06 | Atualizado em: 10/06/2022 às 10:35

O desaparecimento do indigenista Bruno Araújo Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips escancarou os problemas de segurança, proteção ambiental e respeito aos povos originários no Vale do Javari, na Amazônia, a segunda maior terra indígena do Brasil.

Localizada na fronteira com o Peru e a Colômbia, com acesso restrito por vias fluviais e aéreas, a região de 85 mil km² (maior que a Áustria) abriga 6.300 indígenas de 26 grupos diferentes, 19 deles isolados —a maior concentração do mundo.

No entanto, dados dos últimos anos apontam para uma guinada na ocupação da área demarcada e no avanço do tráfico de drogas, da caça clandestina, da extração ilegal de madeira e da mineração de ouro, que ameaçam povos como os Marubo, Matís, Mayoruna, Kanamari, Kulina e os de recente contato Tyohom Djapá e Korubo.

Os problemas escancarados nesta parte da região amazônica derrubam o discurso de defesa de soberania nacional das Forças Armadas. O tom adotado principalmente por militares e políticos torna-se cada vez mais uma utopia.

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Casos de violência no Vale do Javari

Somente no Vale do Javari, vários episódios de violência já foram registrados, como por exemplo, o assassinato de 20 indígenas de uma aldeia isolada na reserva, cometido por garimpeiros ilegais do municípios de São Paulo de Olivença, na fronteiro com Peru e Colômbia.

O Ministério Público Federal do Amazonas (MPF) fez a confirmação do massacre e em seguida recebeu a denúncia de outro assassinato de indígenas da comunidade isolada dos Warikama Djapar.

Foi esse massacre que motivou uma expedição da Funai (Fundação Nacional do Índio) e do Exército Brasileiro à reserva em 2017, quando foram descobertos garimpeiros ilegais atuando dentro e fora da área habitada por grupos de indígenas isolados, dos quais não se conhece a língua ou etnia.

Outro caso foram ataques a uma posto da Funai entre novembro de 2018 e setembro de 2019.

A base funciona como guardiã de uma das principais entradas por rio no Vale do Javari.

Os principais suspeitos pelos ataques eram garimpeiros, ladrões de madeira e caçadores que buscam quelônios e peixes sob risco de extinção, como o pirarucu.

Em abril deste ano, a Unijava e o Centro de Trabalho Indígena (CTI) receberam denúncias de uma invasão de garimpeiros à comunidade de Jarinal, também na Terra Indígena.

Eles participaram de uma festa em que indígenas foram abusadas sexualmente e, segundo o CTI, os indígenas foram forçados a beber gasolina com água e álcool etílico com suco.

Entre outros casos, há também rota de tráfico de drogas, crime ambiental e até a busca por missões evangélicas para ter contato com os povos indígenas isolados dentro da reserva. Tudo isso, é reflexo da política do governo de Jair Bolsonaro, devido jogo de interesses com o segmento religioso.

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Foto: Gilmal/ Charge