Conhecendo a Amazônia com Frank Stones
Aguinaldo Rodrigues
Publicado em: 17/07/2010 às 00:00 | Atualizado em: 17/07/2010 às 00:00
Neuton Corrêa*
Sentado ao lado da janela do 009, ouvi uma voz que saía da direção do motorista de um carro vermelho, emparelhado com o busão: “Maninho! Maninho! Maninho!” Na hora, olhei, mas não consegui ver quem era. E não foi por falta de esforço do condutor: ele até se deitou no banco do passageiro, tentando mostrar o rosto, mas o motorista do ônibus seguiu viagem pelas vielas do bairro Redenção.
Vim descobrir quem era quando o ônibus saiu na Avenida Torquato Tapajós e quando o carro vermelho outra vez apareceu, buzinando ao meu lado. Um pouco afastado do busão, deu para ver. Era Frank Stones Amazonas, que, apesar do nome, é paraense.
Conheci o Frank há pouco tempo por meio de um deputado que o escolheu para apresentar a região ao ex-presidente do Ibama Hamilton Casara. Não foi uma escolha qualquer. Frank Stones sempre se julgou um profundo conhecedor da Amazônia, da fauna, da flora e dos modos de vida do caboclo. Foi ele quem traçou o roteiro da viagem: de Manaus a Itacoatiara, de carro; de Itacoatiara a Terra Santa (PA), de lancha, pelo Paraná do Ramos. E assim foi.
No começo da excursão, logo que a voadeira começou a cortar água, Frank olhou para Casara e disse, solenemente: “Presidente, conheço cada palmo desse estirão”.
Na primeira escala da viagem, em Barreirinha, ele não perdeu tempo para exibir seus conhecimentos regionais. No flutuante onde pararam para abastecer, Frank viu uma canoa com uma tarrafa (aquela rede de pesca circular com chumbo na borda) e prometeu: “Presidente, o senhor, agora, vai comer um peixe fresquinho”.
A exibição chamou atenção. Frank pegou a rede, mergulhou-a nas águas do Paraná do Ramos; depois, fez um laço com a corda da tarrafa em sua mão esquerda, prendeu uma parte do apetrecho nos dentes e passou a abrir a rede com a mão direita, até dividi-la em duas partes. E explicou: “Tem que ser assim, presidente: ‘o peso da chumbada tem que estar divido’”. Com isso, conquistou a platéia. Tanto que Casara comentou com o deputado: “Ele conhece, mesmo!”.
Acontece, amigos do busão, que, ao atirar a rede para o rio, Frank perdeu o equilíbrio e foi também para água, trançando-se na malha e dando trabalho para o resgate. A partir daí, o guia se quietou, porém reanimou-se quase perto do rio Amazonas, quando gritou para o piloto: “Para! Para! Para!”. Todos queriam saber o que era. E ele apontou para o horizonte dizendo: “Presidente, veja como a fauna é bonita! Essa maravilha precisa ser preservada! Uma capivara atravessando o rio!”
A comitiva se agitou. Na correnteza, de longe, a capivara parecia nadar balançando a cabeça para cima e para baixo. Frank continuava: “Motorista, devagar: não vai assustar!” Quem estava na popa queria ir para a proa, mas Frank dizia: “Calma! Calma! Calma! Todo mundo vai ver”.
Acontece, senhores, que, ao chegarem perto, a capivara não passava de um pedaço de pau que descia o rio, dançando a dança da correnteza e das ondas.
Aos poucos, o Sol começou a deixar a companhia da viagem, mergulhando nas águas do Amazonas, e, a esta altura, nada do que Frank Stones falava levava-se a sério. Porém, quando as estrelas já cobriam a viagem, ele apontou para um clarão de luz elétrica, fazendo um discurso, batendo as duas mãos no peito:
“Terra Santa do meu coração! Deputado, presidente, gente que nesta viagem me acompanha, aqui nasci e cresci! Aqui, pesquei e cacei! Aqui, militei! Aqui, presidente, encontrei minha mulher querida!”
Ao encerrar o discurso, no entanto, o piloto, chamado Pancoso, interrompeu-o, dizendo: “Seu Frank, seu Frank, isso aqui não é Terra Santa, não. É a comunidade do Maracanã”.
Cumprimentei meu amigo no trânsito, apertando minhas mãos como se tivesse apertando as dele e ele partiu.
*Filósofo, mestre em Sociedade e Cultura na Amazônia/Ufam.