Neuton Corrêa
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A câmera já estava desligada. A live , encerrada. Foram 30 minutos de imagens e histórias de cortar o coração.
Primeiro, dona Ilda, distinta senhora, da pele clara que destoava da cor comum que viria a seguir.
Mas, ali, na Itacolomy, a chuva acordou e colocou no fundo, indistintamente, a casa de todo mundo.
A avenida, naquele trecho, virou rio; os becos, igarapés; e toda a comunidade da Ita, um lago enorme formado pelas águas das chuvas e do choro revoltante de quem foi parar ali por não ter outra escolha.
Todos vizinhos do Polo Industrial da Zona Franca de Manaus, que ano passado faturou R$ 174 bilhões.
Tudo é compacto, para espremer velhos, adultos, crianças cães e gatos em casinhas, que além da gente e bichos, acomoda o que para muitos pode ser o básico, mas que, para eles, é tudo: geladeira fogão, cama, rede de dormir e alguns outros móveis a mais.
A história era a mesma. Amanheceram o sábado, de 25 de março de 2023, no fundo.
Alguns, que acordaram mais cedo, ainda tiveram “a sorte” de ver a água subir rapidamente na rua e só depois invadir a casa. Tempo suficiente para levantar as coisas.
Em meia hora, as histórias se repetiam. A água torrencial, aos poucos, perdia força e começava a virar chuvisco. Era hora de encerrar.
Assim, a transmissão foi encerrada.
Mas, já deixando a comunidade, fui chamado por um senhor que pediu para eu ver sua casa.
Era mais uma daquelas casas espremidas: uma sala e dois quartinhos.
Então, não teria, evidentemente, nenhuma novidade.
Mas ele, quase que puxando a reportagem pelos braços, foi dizendo:
“Entre aqui”.
E as coisas se repetiam, mas ele não queria mostrar o tudo que havia perdido.
Ele queria mostrar a casa.
“Esta é a cozinha, mandei fazer esse móvel modulado”.
Depois, foi para um dos quartos.
“Essa aqui é minha casa”.
E deu mais um passo adiante, abriu a porta do outro quarto e disse:
“Essa aqui é casa da minha filha. Ela mora aqui”.
Olhei, fiz um cálculo e supus: nada mais do que um quarto de 9 metros quadrados, 3m X 3m.
Lá, vi um fogão a gás, uma geladeira e uma cama. E outras coisas jogadas sobre a cama.
Perguntei, então, quem morava lá e ele respondeu:
“Ela, o marido e a filha deles”.
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