Por Rosiene Carvalho , da Redação
A crise no sistema de representação política e um jogo antidemocrático que impede a participação de novas lideranças e renovação administrativa são apontadas como as principais causas de desânimo do eleitorado por cientistas sociais e analistas políticos ouvidos pelo BNC.
Para os sociólogos Marcelo Seráfico e Wilson Nogueira, nenhuma das nove candidaturas foi capaz de mobilizar o eleitorado a votar com ânimo nesta eleição porque o pleito fora de época não apresenta nenhuma novidade ou surpresa que atinja o eleitor.
O Amazonas volta às urnas neste domingo, dia 6, para a escolha de um governador tampão num mandato de cerca de 500 dias que devem ser contaminados por um novo processo eleitoral. Em um ano, os eleitores irão de o novo às urnas para escolher novos representantes.
A campanha com figuras políticas repetidas do grupo que se revesam no poder cooptando todos os nomes novos é uma das principais causas de distanciamento do eleitorado, na opinião do sociólogo e professor da Ufam (Universidade Federal do Amazonas) Marcelo Seráfico.
“Há um alto grau de integração entre os grupos políticos que dominam os partidos no Amazonas. Todos os que estão na disputa seja para o cargo de governador, seja para o cargo de vice-governador já estiveram em algum momento aliado ao grupo dominante”, disse o cientista social.
O doutor em processos socioculturais, sociólogo e jornalista Wilson Nogueira afirma que a falta de novidade atinge também as propostas e reproduz o círculo vicioso de poder que País vive atualmente.
“É o sistema que está em crise. O sistema que, em tese, seria de representação da maioria. Mas que quem governa é a minoria. As pessoas percebem (o revezamento das mesmas figuras no poder). Não é um sistema representativo dos anseios das reivindicações que as pessoas fazem. É um sistema extremamente concentrador de poder, das oligarquias. As pessoas estão notando isso. Qual a motivação para votar? “, questionou Wilson Nogueira.
Inimigos íntimos
Marcelo Seráfico afirmou que a união e o rompimento de políticos que ora se criticam e ora trocam elogios e pedem votos juntos cooperam para o esvaziamento da política. “Isso vai se revelando à população e produz um esvaziamento da política. Quando esse tipo de composição vai se revelando, forma-se na cabeça do eleitor a ideia de que todos são muito parecidos ou iguais. E que o que está em pauta de fato é o interesse pessoal ou a carreira política”, disse Seráfico.
Marcelo Seráfico disse que mesmo entre os grupos sociais que não têm uma concepção mais apurada das relações políticas há a percepção de que, com a repetição dessas práticas, os vários grupos políticos na verdade estão articulados.
“Quando se retira nomes para manter o controle, quando não surgem nomes novos nem de esquerda e nem de direita, uma coisa está muito estranha. As pessoas percebem isso e se sentem órfãs. Há um descolamento dos partidos da sociedade civil, que a rigor deveria ser a base deles. A sociedade ainda que de uma maneira estabanada, inconsciente já começa a impor esse afastamento”, avaliou Marcelo Seráfico.
Desânimo e marketing
Neste ambiente de desânimo, apontam os cientistas sociais, o meio político abre espaço para os políticos que dizem não ser políticos ou que por meio de marketing apresentam-se ao eleitorado como que distanciados de interesses de poder.
O analista político e pesquisador da Action Pesquisa de Mercado Afrânio Soares afirma que esse ambiente favoreceu, em São Paulo, a vitória do prefeito João Dória (PSDB), em 2016.
“Há um grupo de eleitores que sentem que precisam ir às urnas expressar seu protesto para avolumar os votos brancos e nulos. Alguns até desencadeiam esta campanha pelo voto branco e nulo. Sabem que o voto não será computado. Como na eleição de São Paulo. Ocorre que, passada a eleição, ninguém lembra deste protesto. E isso ajudou o João Dória a se eleger no primeiro turno. Tenho certeza que o objetivo do protesto não era dar a vitória em primeiro turno ao João Dória. Mas surtiu esse efeito”, avaliou Afrânio Soares.
No Amazonas, segundo a avaliação de Marcelo Seráfico, a dúvida e o desânimo do eleitor deixam recair sobre os “conhecidos” a possibilidade de vitória. Para ele, o quadro de candidatos não gera nas pessoas vínculos de confiança e esperança de um futuro diferente.
“É surpreendente ver como um candidato como Amazonino, que saiu do jeito que saiu, diria que desmoralizado, tenha a possibilidade de vencer. E é assombroso ver que o principal adversário é o Braga que tem o nome envolvido em citações da Lava Jato (…) Não vejo a menor possibilidade de mudança dentro dos quadros institucionais que temos. A imagem que me ocorre é de um cemitério de vivos”, afirmou Marcelo Seráfico.
Wilson Nogueira afirma que, na sua opinião, o crescimento de Amazonino neste pleito após amargar alta rejeição contou em parte com a ajuda de um competente trabalho de marketing que aproveitou o contexto de rejeição da política e da disputa pelo poder.
“E logo ele. Tem todo um processo. Marketing tem que ter componentes de carisma, liderança, empatia, uma boa apresentação do político. O trabalho faz com que o político se apresente como uma pessoa honesta. Usa-se a renúncia à disputa como um político que não está na política só pelo poder. Embora a renúncia à disputa pela reeleição (em 2012) tivesse outros motivos. O Amazonino, a meu ver, chega a essa condição porque os outros não fizeram nada diferente. O Braga não mudou a concepção de política no Estado”, afirmou Nogueira.