Funai abandona indígenas nas mãos de desmatadores e grileiros
O capítulo mais recente do desmonte da entidade é a dificuldade para renovar portarias que restringem o acesso a áreas habitadas pelos indígenas
Diamantino Junior
Publicado em: 04/02/2022 às 10:06 | Atualizado em: 04/02/2022 às 10:08
Somente dentro dos limites da Amazônia Legal, são mais de 100 povos que optam por viver reclusos na floresta, muitas vezes pela lembrança de um passado sangrento. “Para eles, a proteção da Funai é vital. Literalmente vital”, resume Beto Marubo, integrante da Univaja, organização que luta pelos direitos desses grupos no Vale do Javari (AM). No entanto, o órgão federal incumbido da tarefa está na berlinda por fazer o contrário: deixá-los à mercê de desmatadores e grileiros.
No comando, “um presidente da Funai que não gosta da Funai e que é contra a Funai”, diz Marubo, referindo-se ao delegado da PF Marcelo Xavier da Silva, que ocupa o posto desde julho de 2019.
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O capítulo mais recente do desmonte é a dificuldade para renovar portarias que restringem o acesso a áreas habitadas por esses povos -e até hoje não demarcadas.
“Parece que existe intenção de ganhar tempo até que se encontre ambiente para uma decisão que agrade” os invasores, diz a advogada Carolina Santana, assessora jurídica do Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados.
Morador de uma das regiões com maior presença deles, Beto alerta para a contradição de abandonar justamente quem mais precisa do zelo do Estado: “Além de covarde, é criminoso”.
O texto foi extraído do podcast da jornalista Renata Lo Prete na plataforma g1.
Entidades criticam
Indigenistas e representantes de povos originários da Amazônia acusam a Fundação Nacional do Índio (Funai) de “perigosa negligência” diante da confirmação de um novo grupo de indígenas isolados que não constava no registro oficial do Estado brasileiro.
O grupo foi confirmado pela Funai em setembro de 2021, mas a informação foi tornada pública nesta semana pelo Brasil de Fato e pelo site O Joio e o Trigo. Eles vivem fora dos limites de terras indígenas no município de Lábrea, no sul do Amazonas, uma das cidades que apresentam maiores índices de desmatamento no país.
A proximidade com comunidades ribeirinhas expõe os indígenas ao contágio do coronavírus, em uma região onde a cobertura vacinal está abaixo de 30%. Por viverem isoladas, essas populações têm sistemas imunológicos mais suscetíveis a doenças infectocontagiosas.
Interdição urgente da área
“(…) a Funai deveria estabelecer imediatamente uma Restrição de Uso – interditando a área para proteger os indígenas isolados por meio de ações sistemáticas de vigilância e fiscalização para controlar eventuais ingressos de pessoas não-autorizadas”.
O trecho é da nota intitulada “Negligência e risco de genocídio: a política da ‘Nova Funai’ voltada aos povos isolados”, assinada pelo Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (Opi) e pela Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab).
“Além disso, [A Funai] deveria priorizar a construção de uma cordão sanitário no entorno da área ocupada pelos indígenas e elaborar plano de contingência, tanto para uma eventual situação de contato como para fazer a contenção do coronavírus na área”, prossegue o texto publicado nesta quinta-feira (3).
Outra reivindicação é a continuidade de estudos técnicos que visem à demarcação da área, procedimento que assegura o direito originário à terra, conforme prevê a Constituição Federal.
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