Partidos da base do presidente Jair Bolsonaro e que comandam o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), o PP e o PL, foram os maiores beneficiados com obras feitas pelo órgão desde 2021. Um levantamento feito pelo GLOBO aponta que cidades comandadas pelas duas siglas receberam, proporcionalmente, mais obras do que outros partidos, tanto em número de cidades agraciadas quanto em número de construções. O GLOBO teve acesso à planilha do FNDE com o quantitativo de obras por município.
Desde 2020, indicados das duas legendas ocupam posições de comando do Fundo , envolto em escândalos nas últimas semanas: o presidente da entidade, Marcelo Lopes da Ponte é indicado do PP, enquanto o diretor de Ações Educacionais, Garigham Amarante é um nome do PL.
O grau de benefício calculado pelo GLOBO foi obtido pela diferença entre a proporção de cidades beneficiadas por obras e a proporção de cidades sob o comando desses partidos no Brasil.
O PP, por exemplo, venceu em 12,5% dos municípios brasileiros nas eleições de 2020. Entretanto, de todos os municípios agraciados com obras, 15,2% são do partido, uma diferença de 2,7 pontos percentuais a favor da sigla do presidente da Câmara, Arthur Lira, e do ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira.
No caso do PL, atual partido do presidente Jair Bolsonaro, e liderado por Valdemar Costa Neto, a diferença no favorecimento foi de 2,4 pontos percentuais.
Além de ocuparem as duas primeiras colocações nesse ranking, PP e PL têm uma vantagem considerável em relação aos outros partidos. O terceiro partido mais beneficiado foi o PDT, mas a taxa de benefício é de 0,6 pontos.
Os dados refletem os municípios contemplados com obras do programa Proinfancia, uma das origens de recursos do FNDE. As transferências dos fundos para as cidades obedecem ao Plano de Ações Articuladas (PAR) que estabelece alguns critérios para o repasse de valores.
Historicamente, os técnicos do órgão levam em conta três índices: o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e o índice de distorção idade-série, calculado pelo Inep. Além disso, também entram na conta critérios como a disponibilidade de recursos e os valores transferidos no ano anterior.
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A cidade mais beneficiada do PL, por exemplo, é São José de Ribamar, no Maranhão, com 14 obras registradas nos dados do FNDE.
O município é o terceiro maior do estado, com 180 mil habitantes, um IDEB de 5,8 em 2021. Com apenas 10 mil habitantes a menos, Timon não aparece na planilha do FNDE com obras liberadas nos últimos quatro anos, apesar de ter tanto um IDEB (de 5,6) quanto um IDH menor que São José de Ribamar.
Segundo Marcele Frossard, assessora de políticas sociais da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, a diferença a favor de PP e PL nos dados analisados sublinham a presença de direcionamento político, que não deveria existir com base nos critérios técnicos previstos na legislação, pode ter se tornado predominante.
“É importante destacar que liberar recursos é um processo lento, não é uma coisa tranquila, ainda mais para a construção de creche. Se o tempo de distribuição for rápido, é sinal de que não houve critério algum”, afirmou.
De acordo com Frossard, nos últimos anos, os critérios técnicos tem se enfraquecido na análise da viabilidade do apoio da União, crescendo as negociações políticas para que demandas sejam atendidas.
“Nós observamos que não apenas os recursos caem como também começam a ser aqueles que fazem pedidos no governo os que recebem mais rapidamente os recursos. Atualmente, não há critério, de certa forma, virou uma política de pires na mão e quem faz parte de determinados grupos, consegue mais rapidamente os recursos”, afirma Frossard.
O levantamento identificou prefeituras de 24 partidos beneficiadas. Desse total, 20 partidos ficaram com um grau de benefício próximo a zero: ou seja, a proporção de municípios agraciados com obras foi similar à proporção de partidos dessas siglas no Brasil.
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Foto: Saulo F Cardoso/Ascom FNDE