Disputa por cargos acirra ânimos entre PT e indígenas do rio Negro, no AM

Petistas de São Gabriel da Cachoeira acusam Foirn e ISA de indicar nomes para Funai e Dsei sem consultar base política.

Disputa por cargos acirra ânimos entre PT e indígenas do rio Negro, no AM

Antônio Paulo, do BNC Amazonas em Brasília

Publicado em: 25/01/2023 às 08:02 | Atualizado em: 25/01/2023 às 08:02

Nem bem inaugurou o histórico Ministério dos Povos Indígenas e a disputa interna entre partidos políticos e as entidades que representam essas populações se acentua de forma crescente. Esse acirramento político pode ser constatado na região do rio Negro, no Amazonas, onde a busca por espaço e cargos no governo federal têm sido motivo de trocas de farpas e acusações de todos os lados.

O presidente do Partido dos Trabalhadores (PT) de São Gabriel da Cachoeira, Cleudimar Saldanha, apoiado pelo prefeito do município, Clóvis “Curubão” Saldanha (PT), soltou uma “nota de descontentamento”. Nela, reivindica a indicação dos cargos federais no ministério.

Saldanha também acusa a Federação dos Povos Indígenas do Rio Negro (Foirn) e o Instituto Socioambiental (ISA) de fazerem indicações para a Funai e os distritos sanitários especiais (Dsei) sem consultar a população e as bases.

Além da nota, o presidente do PT de São Gabriel da Cachoeira encaminhou um áudio a um grupo de Whatsapp onde faz uma ameaça velada aos filiados do partido e ainda chama a ministra Sônia Guajajara (Psol-SP) de “covarde” e “golpista”.

Ouça o áudio de Cleudimar Saldanha

Indignação e descontentamento

A nota de Saldanha manifesta indignação e descontentamento pela indicação dos cargos comissionados das instituições federais (Funai e Dsei) feita pela Foirn e ISA.

Afirma ainda que tais indicações não consultaram a população indígena e o diretório municipal do PT municipal, “o qual representa os povos indígenas mais simples e humildes, respeitando as decisões e escolhas até porque toda mobilização para eleição do presidente Lula foi feita pelo partido regional, juntamente com governo municipal e os militantes indígenas do PT”.

O documento da liderança petista desqualifica o trabalho de 36 anos da Foirn e seu presidente, Marivelton Baré, assim como cita a assessoria do ISA.

Segundo Saldanha, tanto Baré quanto o instituto não buscaram os votos e, tão pouco, levantaram a bandeira de Lula.

Foirn nega indicações

Nesse sentido, o PT municipal afirmou não aceitar que o movimento indígena faça as indicações dos cargos federais na região.

Luiz dos Santos Brazão foi para o Dsei regional e Dadá Baniwa, à Funai, “sem consultar as verdadeiras lideranças e capitães que moram nas comunidades e distritos”.

Baré, que é filiado à Rede Sustentabilidade, informou que não houve qualquer indicação ou nomeação de cargos, apenas exonerações do antigo coordenador da Funai e do Dsei.

Apoio das entidades

Em apoio à Foirn e de seu presidente, cerca de 23 entidades (associações e coordenadorias) manifestaram apoio à direção e ao trabalho.

Nas notas, as entidades destacaram a atuação da Foirn em 36 anos de existência e conquistas como demarcações de terras, educação escolar indígena e o próprio Dsei.

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“PT não representa indígena”

De acordo com Baré, estão querendo transformar, em discurso, que o PT agora é representante legítimo dos povos indígenas do rio Negro.

E não é, conforme ele, pois a lei de base da criação de partidos políticos é outra e não tem nada com representatividade de indígenas.

“Dessa forma, partidos políticos visam o poder (Legislativo e Executivo) via eleições). Já os povos indígenas têm representatividade direta com acompanhamento do Ministério Público (art. 232 CF)”, diz o presidente da Foirn.

Ainda de acordo com Baré, o próprio estatuto do PT menciona poucas vezes o termo indígena.

“Portanto, o PT municipal, por meio de seu presidente, usou de má-fé o que é do município e do estado, assim como as nomenclaturas que estão na lei do plano diretor de São Gabriel da Cachoeira”.

Procurado, o ISA disse que não ia se manifestar a respeito dessa polêmica disputa por cargos federais no rio Negro.

Foto: Alan Azevedo/MNI