Plano ruim do governo, coronavírus mata dois indígenas por dia no país

Coronavírus continua a avançar em comunidades e após quase seis meses de pandemia no Brasil, governo ainda discute planos de proteção

Mariane Veiga

Publicado em: 23/08/2020 às 09:35 | Atualizado em: 23/08/2020 às 09:35

Quase seis meses após a chegada do coronavírus (covid-19) ao Brasil, a doença segue se espalhando pelas comunidades indígenas e provocando mortes. A cada dia, dois índios morrem em decorrência do vírus nas aldeias.

Mesmo com a gravidade, o governo ainda está na fase de discussão de projetos para proteger a população indígena, apesar de decisões que o obrigam, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Dados da Secretaria de Saúde Indígena (Sesai) apontam 352 mortes de índios em decorrência da covid-19 nas aldeias e um total de 21.064 casos confirmados da doença, até o dia 21. A cada hora, cinco indígenas são contaminados.

Os números, no entanto, podem ser maiores. De acordo com balanço da Articulação dos Povos Indígenas (Apib), foram 700 os índios que perderam a vida pela covid-19 e há um total de 26.615 contaminados.

Os dados são discrepantes porque a Sesai contabiliza apenas os indígenas que vivem em comunidades. O órgão não soma aqueles que são de cidades ou de áreas não demarcadas.

 

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Situação no Amazonas

Cleiton Macedo é representante da etnia jiahui, do sul do Amazonas. Ele conta que o coronavírus chegou no fim de maio à aldeia e os que foram diagnosticados acabaram tratados com remédios tradicionais.

“A situação é preocupante com os anciões, há muitas pessoas do grupo de risco. A remoção é difícil, o município de Humaitá fica a 106 quilômetros, sendo necessário pegar uma balsa e, até chegar no hospital, já houve mais complicações”, disse.

 

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Média de mortes maior

Considerando os dados da Apib, a mortalidade por 1 milhão de habitantes dos indígenas é maior do que a registrada no Brasil como um todo. O índice brasileiro é de 510, enquanto o dos indígenas, de 855.

Ana Lúcia Pontes, pesquisadora da Fiocruz e coordenadora do grupo de trabalho de saúde indígena da Associação Brasileira de Saúde Coletiva, destaca que a covid-19 se torna mais preocupante nas aldeias porque os indígenas são grupos de múltiplas vulnerabilidades.

Ela explica que eles têm dificuldade de acessar as políticas públicas, o serviço de saúde é precário e não existe assistência médica para remoções de doentes. Com isso, já chegam às cidades com casos mais graves.

Reportagem da Folha publicada no fim de julho mostrou que o governo federal admitia que não existiam barreiras sanitárias contra a covid-19 em oito terras indígenas com povos isolados —ainda mais vulneráveis.

Passado quase um mês, a situação pouco avançou. O governo federal, cumprindo decisão do STF, apresentou uma segunda versão do plano, no qual apresenta três prioridades, sendo a principal estabelecer barreiras sanitárias onde não há nenhum tipo de obstáculo.

A Apib questiona essas prioridades, alegando que as ações mais urgentes deveriam levar em conta as comunidades mais vulneráveis.

Os principais motivos são que ele contempla 163 das 537 terras indígenas e apresenta apenas ações executadas, e não um planejamento futuro.

Por causa disso, o ministro Luís Roberto Barroso determinou nesta sexta que o governo apresente um novo plano até o dia 7 de setembro.

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Foto: Wilson Dias/Agência Brasil