A força da democracia venceu a tentativa de golpe de Estado
Por pouco, o Brasil escapou de viver um iminente retrocesso autoritĂ¡rio. | Leia o artigo.

Por Marcelo Aith*
Publicado em: 26/11/2024 Ă s 07:54 | Atualizado em: 26/11/2024 Ă s 07:54
Nos Ăºltimos dias, o Brasil foi surpreendido pela OperaĂ§Ă£o Contragolpe da PolĂcia Federal que resultou na prisĂ£o de quatro militares do ExĂ©rcito ligados Ă s Forças Especiais, conhecidas como “kids pretos”, alĂ©m de um policial federal. Entre os presos estĂ£o o general de brigada MĂ¡rio Fernandes (na reserva), o tenente-coronel HĂ©lio Ferreira Lima, o major Rodrigo Bezerra Azevedo, o major Rafael Martins de Oliveira e o policial federal Wladimir Matos Soares. As prisões foram fundamentadas em uma investigaĂ§Ă£o detalhada que expõe um plano complexo para a execuĂ§Ă£o de um golpe de Estado no Brasil.
Segundo o relatĂ³rio da investigaĂ§Ă£o, os envolvidos planejavam “restabelecer a lei e a ordem” por meio de ações militares, sob o pretexto de combater uma suposta ameaça Ă democracia. O objetivo central do plano era controlar os trĂªs poderes do paĂs e reverter o resultado das eleições presidenciais de 2022.
O planejamento estratĂ©gico dos golpistas incluĂa a prisĂ£o de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e ações contra o presidente eleito Luiz InĂ¡cio Lula da Silva e o vice-presidente Geraldo Alckmin. MĂ¡rio Fernandes Ă© apontado como um dos principais articuladores, com o plano denominado “Punhal Verde Amarelo”. Havia tambĂ©m a intenĂ§Ă£o de criar um “Gabinete de Crise” para consolidar o golpe, com a participaĂ§Ă£o de altos militares como Augusto Heleno e Braga Netto.
O relatĂ³rio da PF tambĂ©m detalha a utilizaĂ§Ă£o de tĂ©cnicas clandestinas para monitorar autoridades, como o ministro Alexandre de Moraes, incluindo tentativas de assassinato. As investigações indicam que militares das Forças Especiais utilizaram tecnologias de anonimizaĂ§Ă£o para dificultar a identificaĂ§Ă£o dos envolvidos.
Figuras de alto escalĂ£o tambĂ©m aparecem nas investigações. O entĂ£o presidente Jair Bolsonaro teria revisado uma minuta de decreto para respaldar o golpe, enquanto o general Estevam Theophilo participou de reuniões para discutir o apoio militar necessĂ¡rio. AlĂ©m disso, agentes da PolĂcia Federal, como Wladimir Matos Soares, sĂ£o acusados de fornecer informações sobre a segurança do presidente eleito.
A decisĂ£o de decretar a prisĂ£o preventiva dos envolvidos foi fundamentada em fatores crĂticos destacados pela investigaĂ§Ă£o da PolĂcia Federal e ratificados pelo ministro Alexandre de Moraes. Entre as principais razões estĂ£o:
Gravidade dos crimes: Os investigados sĂ£o acusados de planejar atos extremamente graves, como tentativa de golpe de Estado, monitoramento e possĂvel assassinato de autoridades e prisĂ£o de ministros do STF.
Periculosidade dos envolvidos: Os investigados sĂ£o descritos como integrantes de uma organizaĂ§Ă£o criminosa com capacidade operacional significativa para executar atos de violĂªncia e subversĂ£o da ordem democrĂ¡tica.
Risco de continuidade das atividades criminosas: A manutenĂ§Ă£o da liberdade dos investigados representava um risco concreto de continuidade do plano golpista.
ObstruĂ§Ă£o da Justiça: Havia a possibilidade de destruiĂ§Ă£o de provas e intimidaĂ§Ă£o de testemunhas, justificando a prisĂ£o para assegurar a instruĂ§Ă£o criminal.
Planejamento e coordenaĂ§Ă£o militar: O nĂvel elevado de planejamento e coordenaĂ§Ă£o, com tĂ©cnicas militares e clandestinas, reforçava a necessidade da prisĂ£o preventiva para interromper a atuaĂ§Ă£o criminosa.
Essas motivações foram consideradas suficientes pelo ministro Alexandre de Moraes para justificar a medida extrema da prisĂ£o preventiva, com o objetivo de proteger a ordem pĂºblica e garantir a eficĂ¡cia da investigaĂ§Ă£o criminal em curso. EstĂ¡ correta a decisĂ£o de Moraes?
A decretaĂ§Ă£o da prisĂ£o preventiva requer o cumprimento de requisitos legais especĂficos estabelecidos pelo CĂ³digo de Processo Penal. No caso envolvendo a tentativa de golpe de Estado, a decisĂ£o pela custĂ³dia cautelar foi fundamentada em fatores que atendem a esses requisitos.
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A prisĂ£o
SĂ£o requisitos legais para prisĂ£o preventiva, em sĂntese:
Prova da materialidade e indĂcios suficientes de autoria: Para que a prisĂ£o preventiva seja decretada, Ă© necessĂ¡rio que existam provas da materialidade do crime e indĂcios suficientes de autoria. No caso em questĂ£o, a investigaĂ§Ă£o apresentou evidĂªncias robustas de um plano detalhado para desestabilizar o governo e subverter o estado democrĂ¡tico de direito;
Garantia da ordem pĂºblica: A prisĂ£o preventiva pode ser justificada pela necessidade de garantir a ordem pĂºblica. No caso, a periculosidade dos investigados e a gravidade das ações planejadas, como o monitoramento e possĂvel assassinato de autoridades, foram considerados ameaças significativas Ă ordem pĂºblica;
ConveniĂªncia da instruĂ§Ă£o criminal: Outro requisito Ă© a conveniĂªncia da instruĂ§Ă£o criminal, que visa evitar a destruiĂ§Ă£o de provas ou a intimidaĂ§Ă£o de testemunhas. A decisĂ£o destacou o risco concreto de obstruĂ§Ă£o da justiça, caso os investigados permanecessem em liberdade, justificando a prisĂ£o preventiva para assegurar a coleta eficaz de provas e;
Assegurar a aplicaĂ§Ă£o da Lei Penal: A prisĂ£o preventiva pode ser decretada para assegurar que a lei penal seja efetivamente aplicada, especialmente quando hĂ¡ risco de fuga dos investigados. Dado o alto perfil dos envolvidos e a complexidade do plano, a possibilidade de evasĂ£o foi considerada um risco real.
A exaustiva investigaĂ§Ă£o da PolĂcia Federal demonstra que o Brasil esteve Ă beira de um golpe de Estado. CircunstĂ¢ncias extraordinĂ¡rias evitaram a execuĂ§Ă£o do plano, assegurando a manutenĂ§Ă£o da democracia. Esse episĂ³dio reforça a necessidade de constante vigilĂ¢ncia para preservar o estado democrĂ¡tico de direito. Ditadura militar nunca mais. Viva a democracia!
*O autor Ă© advogado criminalista. Doutorando estado de derecho y gobernanza global pela Universidad de Salamanca – ESP. Mestre em direito penal pela PUC-SP. Latin legum magister (LL.M) em direito penal econĂ´mico pelo Instituto Brasileiro de Ensino e Pesquisa – IDP. Especialista em blanqueo de capitales pela Universidad de Salamanca.
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