O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) lançou nesta quarta-feira (26), o relatório Violência contra os Povos Indígenas no Brasil – dados de 2022. Assim como faz um balanço dos últimos quatro do governo de Jair Bolsonaro.
Entre os dados obtidos pela Lei de Acesso à Informação e da Secretaria de Saúde Indígena (Sesai) estão a ocorrência de 835 mortes de crianças indígenas de 0 a 4 anos no ano passado.
A maioria das mortes foi registrada no Amazonas (233), em Roraima (128) e em Mato Grosso (133).
Porém, em todo o Brasil, a Sesai registrou um total de 3.552 óbitos nesta faixa etária entre 2019 e 2022. Isso ocorreu no governo de Jair Bolsonaro.
Considerado o período de quatro anos, os mesmos três estados concentraram a maioria dos óbitos, sendo que no Amazonas foram, no total, 1.014 mortes de crianças menores de cinco anos.
Por outro lado, ocorreram no período, 607 óbitos em Roraima e 487 em Mato Grosso.
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Violência pessoal
Já na categoria “violência contra a pessoa”, segundo o Cimi, foram registrados 416 casos de violência contra pessoas indígenas em 2022.
Assim como nos três anos anteriores, os estados que registraram o maior número de assassinatos de indígenas foram Roraima (41), Mato Grosso do Sul (38) e Amazonas (30).
Ainda, diz o relatório do Cimi, que esses três estados concentraram quase dois terços (65%) dos 795 homicídios de indígenas registrados entre 2019 a 2022.
Dessa forma, foram 208 em Roraima, 163 no Amazonas e 146 no Mato Grosso do Sul.
Média de Bolsonaro
Tomados em conjunto, os quatro anos sob o governo de Jair Bolsonaro apresentaram uma média de 373,8 casos de violência contra a pessoa por ano – nos quatro anos anteriores, sob os governos de Michel Temer e Dilma Rousseff, a média foi de 242,5 casos anuais.
Portanto, os 416 casos de violência contras indígenas ficaram assim divididos:
abuso de poder (29);
ameaça de morte (27);
ameaças várias (60);
assassinatos (180);
homicídio culposo (17);
lesões corporais dolosas (17);
racismo e discriminação étnico-cultural (38);
tentativa de assassinato (28);
violência sexual (20).
Suicídios
Informações de fontes públicas indicaram ainda a ocorrência de 115 suicídios de indígenas em 2022, a maioria nos estados do Amazonas (44), Mato Grosso do Sul (28) e Roraima (15).
Logo, mais de um terço das mortes por suicídio (39, equivalentes a 35%) ocorreu entre indígenas de até 19 anos de idade.
Entre 2019 e 2022, dados atualizados destas mesmas fontes totalizam 535 mortes de indígenas por suicídio.
Neste período, os mesmos três estados registraram o maior número de casos: Amazonas (208), Mato Grosso do Sul (131) e Roraima (57) concentraram, juntos, 74% dos suicídios indígenas ao longo destes quatro anos.
Outras categorias
O levantamento de 2022, do Cimi, reúne dados sobre violações contra os direitos territoriais indígenas, como conflitos, invasões e danos aos territórios.
E também as violações por omissão do poder público, como desassistência nas áreas da saúde e da educação, mortalidade na infância e suicídios.
Em todas estas categorias, Roraima e Amazonas, onde se localiza a terra indígena ianomâmi, estiveram entre os estados com maior número de registros.
Conflitos territoriais
O ano de 2022 também encerrou um ciclo de quatro anos no qual nenhuma terra indígena foi demarcada pelo governo federal.
De tal modo que essa postura se refletiu no alto número de casos registrados nas categorias conflitos por direitos territoriais, com 158 registros.
Já as invasões possessórias, exploração ilegal de recursos e danos ao patrimônio obtiveram 309 casos que atingiram pelo menos 218 terras indígenas em 25 estados do país.
“Não demarcar e viabilizar o acesso de exploradores às terras demarcadas foram eixos motores da antipolítica indigenista, que desterritorializou e fragilizou a aplicação do direito, gerando um ambiente de profunda insegurança e violências sem precedentes na história recente do Brasil”, apontam Lucia Helena Rangel e Roberto Antônio Liebgott, coordenadores da publicação.
Violência patrimonial
As “violências contra o patrimônio” dos povos indígenas tiveram os seguintes registros:
omissão e morosidade na regularização de terras, na qual foram registrados 867 casos;
-conflitos relativos a direitos territoriais, com 158 registros;
invasões possessórias, exploração ilegal de recursos naturais e danos diversos ao patrimônio, categoria que teve o sétimo aumento sucessivo no número de casos, com 309 registros.
somados, estes registros totalizam 1.334 casos de violência contra o patrimônio dos povos indígenas em 2022.
Demarcações pendentes
A maioria das 1.391 terras e demandas territoriais indígenas existentes no Brasil (62%) possui alguma pendência administrativa para sua regularização, como aponta o levantamento do Cimi, atualizado anualmente.
Dentre as 867 terras indígenas com pendencias, pelo menos 588 não tiveram nenhuma providencia do Estado para sua demarcação e ainda aguardam a constituição de grupos técnicos pela Funai, responsável por proceder com a identificação e delimitação destas áreas.
“A postura declarada e intencionalmente omissa do governo Bolsonaro em relação a demarcação de terras indígenas redundou no aprofundamento de conflitos por direitos territoriais, em muitos casos com situações de ameaças, ataques armados e assassinatos de lideranças indígenas”.
Fim de ciclo
De acordo com o relatório do Cimi, o ano de 2022 representou o fim de um ciclo governamental marcado por violações e pela intensificação da violência contra os povos indígenas no Brasil.
“Como nos três anos anteriores, os conflitos e a grande quantidade de invasões e danos aos territórios indígenas avançaram lado a lado com o desmonte das políticas públicas voltadas aos povos originários, como a assistência em saúde e educação, e com o desmantelamento dos órgãos responsáveis pela fiscalização e pela proteção destes territórios”, diz o documento.
Bruno e Dom
Tal cenário classificado pelo Cimi como “desolador” ficou evidenciado por eventos que causaram grande comoção e tiveram repercussão nacional e internacional, como os assassinatos do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips.
Eles foram mortos em junho de 2022, na região da terra Indígena Vale do Javari, no Amazonas, “por pessoas vinculadas à rede criminosa que articula as invasões ao território”.
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Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil