AmazĂ´nia: estudo encontra 40% de Ă¡reas que nĂ£o sĂ£o pesquisadas
Pesquisa aponta que muitas regiões da AmazĂ´nia possuem baixa probabilidade de serem foco de estudos cientĂficos, impactando a compreensĂ£o da biodiversidade e respostas Ă s mudanças climĂ¡ticas.

Publicado em: 19/07/2023 Ă s 14:17 | Atualizado em: 20/07/2023 Ă s 10:37
Um estudo publicado recentemente na revista Current Biology pelo projeto Synergize, do Centro de SĂntese em Biodiversidade e Serviços EcossistĂªmicos do CNPq, revelou uma desigualdade significativa na distribuiĂ§Ă£o de pesquisas cientĂficas em diferentes Ă¡reas da AmazĂ´nia.
Com base em informações de 7.694 pontos de coletas ecolĂ³gicas padronizadas e critĂ©rios diversos, os cientistas desenvolveram um modelo que estimou a probabilidade de pesquisa em todo o territĂ³rio.
Os resultados mostraram que mais da metade das terras firmes, cerca de um quarto dos ambientes aquĂ¡ticos e um sexto das florestas alagĂ¡veis da AmazĂ´nia possuem uma probabilidade quase nula de serem alvo de estudos cientĂficos com coletas padronizadas de organismos.
Fatores logĂsticos, como a presença de meios de transporte e a distĂ¢ncia em relaĂ§Ă£o a grandes cidades e centros de pesquisa, foram identificados como influenciadores significativos na escolha dos locais de coleta.
De acordo com o modelo, aproximadamente 15% das Ă¡reas com menor probabilidade de pesquisa estĂ£o sujeitas a sofrer severas alterações atĂ© 2050, devido Ă s mudanças climĂ¡ticas e outras formas de degradaĂ§Ă£o causadas pela aĂ§Ă£o humana.
AlĂ©m da perda da biodiversidade e dos benefĂcios que ela proporciona Ă s pessoas, a falta de pesquisa nessas regiões impede a compreensĂ£o de como os organismos desses ecossistemas estĂ£o respondendo Ă s mudanças climĂ¡ticas e Ă degradaĂ§Ă£o ambiental.
Compreender a organizaĂ§Ă£o da biodiversidade amazĂ´nica atual Ă© essencial para comparar com futuras mudanças e avaliar seus impactos.
Segundo Mario Moura, autor do artigo e especialista em lacunas de conhecimento sobre biodiversidade, Ă© necessĂ¡rio estabelecer um antes e um depois para compreender as transformações. No entanto, no momento atual, nĂ£o se sabe nem o antes nem o depois, o que compromete a anĂ¡lise e a capacidade de resposta Ă s mudanças.
As dificuldades logĂsticas e os custos associados Ă s expedições cientĂficas na AmazĂ´nia sĂ£o considerĂ¡veis. A viagem atĂ© Ă¡reas remotas pode levar dias, seja por via fluvial ou aĂ©rea, e exige um alto investimento financeiro. AlĂ©m disso, a falta de infraestrutura, como estradas em boas condições, dificulta o acesso a determinadas regiões.
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O professor FabrĂcio Baccaro, da Universidade Federal do Amazonas, ressalta que o valor disponibilizado para pesquisa em Ă¡reas mais remotas nĂ£o Ă© equivalente aos desafios enfrentados. O pesquisador destaca a importĂ¢ncia de considerar as diferenças geogrĂ¡ficas na distribuiĂ§Ă£o dos recursos de pesquisa, reconhecendo que a realidade de deslocamento e custos varia amplamente na regiĂ£o amazĂ´nica.
Uma alternativa apontada pelo estudo Ă© o desenvolvimento de parcerias cientĂficas com povos indĂgenas, uma vez que as Terras IndĂgenas (TIs) representam uma parte significativa das Ă¡reas preservadas da AmazĂ´nia. No entanto, as TIs tambĂ©m possuem baixa probabilidade de pesquisa, devido Ă distĂ¢ncia fĂsica e Ă necessidade de estabelecer uma relaĂ§Ă£o de respeito e colaboraĂ§Ă£o com as comunidades indĂgenas.
Os pesquisadores defendem a importĂ¢ncia da coproduĂ§Ă£o do conhecimento, em que cientistas e indĂgenas trabalham juntos na pesquisa e na preservaĂ§Ă£o ambiental. Essa abordagem considera as perspectivas da decolonialidade e busca uma interlocuĂ§Ă£o entre diferentes saberes.
A disponibilidade e compartilhamento de dados tambĂ©m sĂ£o aspectos fundamentais para a pesquisa cientĂfica. O projeto Synergize desenvolveu a base de dados chamada Taoca, que reĂºne informações ecolĂ³gicas padronizadas sobre a AmazĂ´nia.
A plataforma permite que cientistas de todo o mundo tenham acesso aos dados e estabeleçam parcerias com os responsĂ¡veis pelas coletas.
Os desafios enfrentados na pesquisa cientĂfica na AmazĂ´nia exigem uma abordagem multidisciplinar, considerando nĂ£o apenas as questões logĂsticas, mas tambĂ©m as diferenças culturais e a necessidade de envolver as comunidades locais.
A abertura de editais de apoio Ă pesquisa que considerem essas demandas especĂficas pode contribuir para a realizaĂ§Ă£o de novos projetos e a ampliaĂ§Ă£o do conhecimento sobre a regiĂ£o.
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Foto: divulgaĂ§Ă£o