Em depoimento nesta segunda-feira (18), na CPI da covid, a enfermeira amazonense Mayra Pires Lima criticou os parlamentares por não aprovarem o piso salarial dos profissionais de saúde e a jornada de trabalho de 30 horas.
A enfermeira, que é funcionária da Maternidade Balbina Mestrinho, representou na comissão as famílias das mais de 600 mil vítimas mortas por causa da doença. Foram cinco testemunhas de cada região do país.
Mayara perdeu a irmã que deixou órfão quatro filhos. “Eu tive que levar a minha irmã pra onde eu trabalhava porque não tinha lugar pra ela respirar, não tinha lugar onde tivesse oxigênio”, explicou.
Apesar da família ter providenciado oxigênio, a irmã da enfermeira não conseguiu vaga em leito de UTI. “Infelizmente, a UTI demorou dez dias enquanto ela estava no hospital”, afirmou.
“Só em Manaus nós temos mais de 80 órfãos do covid; só da minha família são quatro. E o que estão fazendo? O que estão fazendo para olhar essas crianças? Como vai ser o futuro delas sem os pais, se elas não têm muitas vezes perspectiva?”, questionou.
O presidente da CPI, Omar Aziz (PSD), informou a ela que a CPI vai responsabilizar o Estado pelos órfãos da covid.
“O senador Omar Aziz falou há pouco que é pensamento desta CPI responsabilizar os agentes públicos e agentes privados, mas responsabilizar também o Estado. E nós pretendemos criar uma pensão para os órfãos, até completarem 21 anos de idade, de um salário mínimo, para aqueles cujas rendas recomendam o pagamento dessa pensão”, revelou o relator Renan Calheiros (MDB-AL).
Segundo ele, o relatório também pode incluir a covid na “relação das doenças que ensejarão a aposentadoria, quando a perícia médica atestar, por invalidez.”
Heróis da pandemia
Contundente, a enfermeira criticou os parlamentares pela não aprovação do projeto de lei (PL 2.564), de autoria do senador Fabiano Contarato (Rede-AP).
A matéria estabelecia um piso de R$ 4.750,00 mensais para enfermeiros; 70% deste valor para técnicos de Enfermagem e 50% para auxiliares de Enfermagem e parteiras. Além disso, estabelecia uma jornada de 30 horas.
A criação do piso beneficiaria 2,5 milhões de profissionais de Enfermagem, sobretudo os quase 2 milhões de técnicos e auxiliares. Metade deles recebem salários abaixo de R$ 2 mil.
“E a gente via nas redes sociais: ‘Os nossos heróis da pandemia!’. A gente fez uma campanha: nós não queremos parabéns, nós queremos valorização. Infelizmente nós não tivemos a oportunidade de ver essa valorização na prática, não tivemos a resposta dos nossos representantes com o PL 2.564, que infelizmente não foi aprovado”, criticou.
“Isso nos deixou bastante decepcionados, porque a gente não precisa de tapinha nas costas, a gente precisa de valorização, a gente precisa evitar que os nossos colegas morram. Muitas vezes a gente vai atender os pacientes e nós tiramos do nosso próprio bolso pra cuidar deles, pra evitar que eles morram, como eu fiz muitas vezes”, completou.
Providências
Diante da pressão da enfermeira amazonense, o vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), sugeriu ao relator que incluísse no relatório final uma requisição à Presidência do Senado para que o projeto fosse votado em plenário. O relator acatou a sugestão de Randolfe.
Contarato informou também que já encaminhou a demanda. “Nesta semana, eu pessoalmente conversei com o presidente do Senado (Rodrigo Pacheco, DEM-MG), falando para ele dá importância de aprovarmos esse projeto”, informou.
“É uma demanda da categoria. Esses profissionais estão pagando com a própria vida. Os pais estão deixando os filhos sem qualquer tipo de assistência, pagando aí para protegerem a nossa vida”, defendeu.
Prestaram depoimento:
Nordeste: Geovana Dulce, jovem de 19 anos. Perdeu a mãe e terá a guarda da irmã de 10 anos, sendo a nova chefe da família;
Sudeste: Kátia Shirlene Castilho dos Santos. Perdeu pai e mãe. Ela acompanhou a mãe em sua internação na Prevent Senior, em São Paulo, e o tratamento com base no “kit covid”;
Sul: Rosane Brandão. Perdeu o marido, que era professor da Universidade Federal de Pelotas (RS);
Centro-Oeste: Jarquivaldo Bites Leite. Em tratamento com graves sequelas.
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Foto: Pedro França/Agência Senado