O pacote social e econômico do governo federal, o Pró-Brasil – adiado por estar indefinido e por falta de articulação política – pode acabar com dois grandes benefícios em vigor há 30 anos: o abono salarial e o seguro-defeso .
Instituído pela Lei n° 7.998/90 , o abono salarial equivale ao valor de, no máximo, um salário mínimo. Ele é pago conforme calendário anual estabelecido aos trabalhadores que satisfaçam os requisitos legais.
O programa Seguro-Desemprego do Pescador Artesanal foi criado pelo governo federal a partir da Lei nº 8.287, de 20 de dezembro de 1991.
O seguro é concedido aos pescadores artesanais durante o período do defeso – proibição da pesca de espécies ameaçadas de extinção. O benefício pode variar de três a seis parcelas no valor de um salário mínimo.
Há informação também de que o Ministério da Economia estuda extinguir o Farmácia Popular . Esse programa distribui medicamento gratuito à população carente – criado em 2004, no governo Lula.
A extinção desses três programas é para garantir os recursos do Renda Brasil. É o programa que vai ficar no lugar do Bolsa Família e deve consumir R$ 50 bilhões por ano.
800 mil pescadores ficarão sem o benefício
De acordo com o presidente da Confederação Nacional dos Pescadores e Aquicultores (CNPA), Walzenir Falcão, se o governo extinguir o auxílio, entre 700 a 800 mil trabalhadores serão prejudicados em todo o país.
No estado do Amazonas, serão cerca de 50 mil pescadores e pescadoras artesanais que deixarão de receber o seguro-defeso.
Os valores do seguro-desemprego, variando entre três e seis meses, em todo o país, ficam em torno de 2,19 bilhões a R$ 4,38 bilhões.
Aos pescadores amazonenses, o seguro a ser deixado de pagar ficará entre R$ 156,7 milhões a R$ 313,5 milhões no período defeso.
Seguro-defeso é benefício socioambiental
Mas, o governo não vai ter vida fácil para extinguir os benefícios sociais principalmente o seguro-defeso.
Parlamentares e entidades defensores da categoria dos pescadores prometem se mobilizar para não deixar acabar com o seguro-desemprego pago durante o defeso.
“O Renda Brasil é um programa meritório. Mas não concordo que o seguro-defeso seja transformado em Renda Brasil porque o seguro-defeso não é uma compensação social, mas uma compensação ambiental”, afirma o deputado Silas Câmara (Republicanos-AM).
Para o deputado Marcelo Ramos (PL-AM), o seguro-defeso, mais que um benefício ao trabalhador, é um instrumento de proteção ao meio ambiente.
“Excluir o seguro é obrigar o pescador a praticar a pesca predatória com gravíssimas consequências ambientais. Agirei de todas as formas para que essa exclusão não ocorra”, prometeu o parlamentar amazonense.
Bem fiscalizado, benefício funciona no AM
Na mesma linha de defesa, Bosco Saraiva (Solidariedade-AM) afirma que a exclusão do seguro-defeso é um erro.
“Esse é um benefício que, quando bem fiscalizado, funciona muito bem no Amazonas. Vamos lutar para mantê-lo, pois, ele garante a renda mínima aos milhares de pescadores que vivem, exclusivamente, do pescado dos rios e lagos amazonenses”, declarou Bosco Saraiva.
Já o deputado Sidney Leite (PSD-AM) menciona a necessidade de atender a população mais pobre. Ele lembra que o auxílio emergencial trouxe à tona 40 milhões de brasileiros que estavam “invisíveis”.
No entanto, diz que excluir o seguro-defeso não é uma medida correta porque o programa não é social, mas está ligado à sustentabilidade, ao meio ambiente e o combate direto à pesca predatória. Por isso, é contra o fim do auxílio.
“Mas, antes de fazer qualquer crítica, quero conhecer o Renda Brasil, do governo federal, para ver se traz essas distorções”, ressalvou Sidney.
Deputado Átila Lins Foto: divulgação/PSD
Cautela antes da crítica
Quem também não quis se precipitar, na avaliação, foi o deputado Átila Lins (PP-AM).
Defensor incondicional dos pescadores amazonenses e do governo Bolsonaro, o decano preferiu, ao seu estilo, a cautela.
“Não vou falar agora. Vou esperar isso [lançamento do Renda Brasil] se concretizar. Aí, darei minha opinião”, disse Átila Lins.
Extinção passa pelo STF
O presidente da CNPA, Walzenir Falcão, alerta para o fato de que, se o governo pretende mesmo acabar com o seguro-defeso, precisa estar atento à última decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).
De acordo com o dirigente dos pescadores, a entidade, recentemente, teve causa ganha em relação à Portaria 192/2015. Isso ocorreu quando a então ministra da Agricultura, Kátia Abreu, suspendeu o pagamento do seguro-defeso.
“Pela decisão do STF, que garantiu o pagamento da suspensão do defeso, em 2015, o governo precisa fazer o recadastramento de toda a categoria, apresentar estudos técnicos para fazer qualquer mexida no seguro e no próprio defeso. Então, não é qualquer canetada que vai acabar com o nosso benefício não”, garante Falcão.
Pesca na Amazônia Foto: divulgação/Sapopema
Extinção piora imagem do Brasil no mundo
Para o presidente da Confederação Brasileira dos Trabalhadores da Pesca e Aquicultura (CBPA), Abraão Lincoln, a decisão do governo de extinguir o seguro-defeso, “um benefício ambiental, não social”, vai piorar a imagem do Brasil na comunidade internacional.
“A decisão é um equívoco. O benefício é um seguro-desemprego aos pescadores de camarão, lagosta e de todo o pescado que fica proibido durante o período do defeso. Se o Brasil já é visto com maus olhos no mundo, imagina agora, depois do fim do auxílio que impede a pesca predatória”, argumenta Lincoln.
Mesmo sendo favoráveis à criação do Renda Brasil, os presidentes da CBPA e CNPA, embora rivais politicamente, prometem articular as bancadas de seus estados na Câmara dos Deputados e no Senado para impedir que a extinção do seguro-defeso seja aprovada,
Foto: Agência Brasil/arquivo