O Tribunal de Contas da União (TCU) acaba de determinar ao Ministérios da Saúde, Defesa e à Casa Civil da Presidência da República que verifiquem a possibilidade de disponibilizar leitos de enfermaria e de UTI das unidades de saúde militares para tratamento de covid (coronavírus) a pacientes civis do SUS.
Ainda, pela decisão, o Ministério da Defesa , os comandos da Marinha, Exército e Aeronáutica também deverão disponibilizar, diariamente, na internet, os dados com o total de leitos clínicos e de UTI, bem como a taxa de ocupação.
Da mesma forma, deverão ser encaminhadas cópias das deliberações à Comissão externa da Câmara dos Deputados, que acompanha o enfrentamento da pandemia da covid-19; à Comissão Temporária covid-19 do Senado, e ao Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) .
Os ministros atenderam a uma representação da Secretaria de Controle Externo da Defesa Nacional e da Segurança Pública (SecexDefesa) do próprio tribunal.
A representação pediu apuração de possíveis irregularidades no Ministério da Defesa e nos comandos do Exército, Marinha e Aeronáutica, relacionadas com a não oferta ao público civil de leitos disponíveis em unidades militares de saúde durante a pandemia decorrente do novo coronavírus.
Os indícios de irregularidades incluem evidências de que, durante a grave crise enfrentada pelo estado do Amazonas, no começo de 2021, os hospitais militares localizados na região dispunham de leitos vagos.
Esse fato foi comprovado pelos Boletins Diários Covid-19 no Amazonas dos dias 18 de janeiro, 10,12 e 23 de fevereiro de 2021, emitidos pela Fundação de Vigilância em Saúde no Amazonas.
Diante das evidências, o Ministério Público de Contas pediu que, em caráter temporário e excepcional, que os leitos de enfermaria e de UTI dos hospitais militares, quando vagos, sejam disponibilizados para o tratamento de civis em atendimento a demandas das centrais de regulação de leitos, nos casos em que os sistemas de saúde de localidades entrem em colapso pelo excesso de demanda.
O MP fez o pedido em observância aos direitos constitucionais à vida, à saúde, à dignidade da pessoa humana e aos princípios da razoabilidade, da economicidade, da supremacia do interesse público e da eficiência.
Na investigação, SecexDefesa do TCU estimou que 71% dos recursos aplicados nas unidades de saúde militares proveem dos cofres públicos, por isso, não faz sentido o Ministério da Defesa argumentar que os leitos clínicos e de UTI só devem ser reservados para militares.
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Argumentos do Ministério da Defesa
O Ministério da Defesa e os Comandos Militares apresentaram os seguintes argumentos contra as denúncias apuradas pelo Tribunal de Contas da União:
ao TCU cabe fiscalizar as ações dos gestores e não exercer direta ou indiretamente a gestão dos órgãos públicos; não cabe ao TCU tutelar interesses sociais e individuais indisponíveis; apenas parte do financiamento dos sistemas de saúde militares ocorre com recursos públicos; o tratamento diferenciado conferido aos servidores públicos federais civis e aos militares tem amparo legal e decorre de fator de discriminação legítimo, o vínculo laboral que ambos detêm com o Poder Público; não podem os hospitais militares serem penalizados, nem arcar com as consequências decorrentes da morosidade e ineficiência de alguns gestores públicos no atendimento da saúde da população porque não deram causa nem contribuíram para a falta de leitos no sistema de saúde; a destinação de leitos de hospitais militares a cidadãos, em prejuízo aos beneficiários do sistema de saúde militar, contraria o interesse das forças armadas e constitui desvio de finalidade, violando expressamente dispositivo da Lei 8.080/1990; a utilização dos leitos dos hospitais militares para atendimento da população em geral acometida com Covid-19 poderá levar ao colapso do sistema de saúde militar.
Relator minimiza denúncias
A deliberação dos ministros do TCU, no entanto, minimiza as denúncias do Ministério Público de que as Forças Armadas deixaram de ofertar leitos de UTI em Manaus e nos demais estados brasileiros.
Ao contrário, o relator do processo (TC 008.992/2021-5), Benjamin Zymler, acolhe quase todos os argumentos do Ministério da Defesa e os Comandos Militares.
Em seu voto, acompanhado pelos membros da Corte de Contas, Zymler descarta os encaminhamentos do Ministério Público de determinar a requisição de leitos, quando necessários, assim como a realização de convênios entre os órgãos civis e militares, assim como entre os governos estaduais e municipais.
Para o ministro-relator, há uma reduzida capacidade do sistema de saúde militar quando comparado com o Sistema Único de Saúde.
Apontado SecexDefesa, o total de leitos das unidades militares distribuídos em todas as Unidades da Federação alcança a quantia de 2.383, incluindo leitos clínicos e de unidades de terapia intensiva. Para comparação, em maio de 2021, o SUS disponibilizou 313.869 leitos de internação consoante dados do Datasus .
“Ou seja, qualquer apoio das unidades militares aos usuários do SUS será apenas, ante as dimensões das necessidades da população como um todo, um paliativo com reduzido impacto no problema geral da falta de leitos públicos para os pacientes acometidos pela Covid-19”, argumentou Benjamin Zymler.
O relator também se voltou aos dados de Manaus apresentados na denúncia do Ministério Público. E os contestou.
Sobre os dados de Manaus
Na data [10 de janeiro de 2021], em que pese haver 341 pacientes aguardando por leitos clínicos e 33 por leitos de UTI, o que se verifica é que sequer os leitos da rede do SUS estavam plenamente ocupados.
Em outras palavras, para Zymler, o fato de haver 28 leitos clínicos vagos na rede do SUS naquela data não significa que estariam ociosos, pois, em princípio, o preenchimento das vagas era apenas uma questão de trâmites operacionais, pois havia demanda pelas vagas.
“Dessas considerações, verifico que não restou demonstrado que as unidades militares de saúde detinham a condição de atender a população em geral nos períodos objeto de análise”, sentenciou.
Foto: Secom-AM