Garimpeiro youtuber mostra ações nas terras dos Ianomamis
Os vĂdeos do canal, 120 ao todo, foram postados nos Ăºltimos trĂªs anos, perĂodo de forte crescimento da mineraĂ§Ă£o ilegal em terras indĂgenas, apesar de operações policiais pontuais

Publicado em: 17/05/2022 Ă s 20:55 | Atualizado em: 17/05/2022 Ă s 20:55
“Ă“ os polĂcia, Ă³ os polĂcia”, alerta um homem enquanto filma trĂªs helicĂ³pteros sobrevoando um acampamento de garimpeiros ilegais na Terra IndĂgena Yanomami. “É trĂªs ‘blackhawkzĂ£o’, trĂªs!”, prossegue o narrador, referindo-se ao modelo da aeronave militar. “Todo mundo, vamos se esconder, agora o bicho pega”, diz garimpeiro que atua em terras Ianomami.
Cenas como essa, que mostram garimpeiros fugindo de forças de segurança, sĂ£o comuns num canal no YouTube criado por um garimpeiro que atua ilegalmente dentro do territĂ³rio Ianomami, em Roraima.
Os vĂdeos do canal, 120 ao todo, foram postados nos Ăºltimos trĂªs anos, perĂodo de forte crescimento da mineraĂ§Ă£o ilegal em terras indĂgenas, apesar de operações policiais pontuais.
No territĂ³rio Ianomami, onde se estima que haja atĂ© 20 mil garimpeiros, a atividade ganhou visibilidade nas Ăºltimas semanas apĂ³s denĂºncias de violĂªncia sexual contra mulheres e meninas indĂgenas.
Rotina do garimpo
Os vĂdeos do canal “Fabio garimpo Junior” mostram garimpeiros Ă vontade diante das cĂ¢meras durante seus trabalhos, ainda que garimpar em terras indĂgenas seja crime passĂvel de prisĂ£o.
Sem esconder o rosto, eles discursam em defesa do garimpo e criticam a repressĂ£o Ă atividade, muitas vezes ecoando posições do presidente Jair Bolsonaro.
Os vĂdeos mostram ainda como o garimpo na terra yanomami ganhou uma escala industrial nos Ăºltimos anos.
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As gravações mostram helicĂ³pteros e aviões privados transportando os garimpeiros atĂ© as minas ilegais (nĂ£o hĂ¡ acesso terrestre ao territĂ³rio).
Nos garimpos, mĂ¡quinas pesadas abrem grandes clareiras na Floresta AmazĂ´nica e rios sĂ£o desviados na busca por ouro e cassiterita. Alguns acampamentos parecem minicidades, com eletricidade e internet.
Segundo a Hutukara AssociaĂ§Ă£o Yanomami, a Ă¡rea desmatada por garimpeiros dentro do territĂ³rio indĂgena cresceu 46% em 2021 em comparaĂ§Ă£o com o ano anterior.
A atividade, porĂ©m, implica sĂ©rios riscos para os garimpeiros. Dois vĂdeos mostram helicĂ³pteros a serviço do garimpo em destroços apĂ³s caĂrem na floresta.
Outras filmagens mostram manobras arriscadas de barcos com garimpeiros subindo corredeiras, helicĂ³pteros descendo em pequenas clareiras e aviões pousando sob forte chuva.
As cenas sĂ£o exaltadas no canal como exemplos da coragem e perĂcia dos envolvidos.
A BBC questionou o MinistĂ©rio da Justiça sobre os vĂdeos dos garimpeiros e o crescimento da atividade na terra yanomami.
Em nota, o Ă³rgĂ£o afirmou que a Secretaria de Operações Integradas (Seopi) do MinistĂ©rio da Justiça estĂ¡ finalizando “um novo calendĂ¡rio de ações operacionais” no territĂ³rio.
“TĂ£o logo esteja pronto poderĂ¡ ser apresentado Ă mĂdia e Ă sociedade”, disse o ministĂ©rio.
Questionada se tinha conhecimento do canal no YouTube, a PolĂcia Federal disse que “nĂ£o comenta eventuais investigações em andamento”.
A corporaĂ§Ă£o disse ainda que realizou 31 operações policiais contra crimes ambientais em terras indĂgenas em Roraima em 2021, e que hĂ¡ mais de 200 procedimentos investigativos em andamento, com mais de 170 indiciados por crimes ligados ao garimpo ilegal.
A Funai disse em nota que mantĂ©m bases para coibir crimes e controlar o acesso ao territĂ³rio yanomami.
“Cabe lembrar que a mineraĂ§Ă£o ilegal na Terra IndĂgena Yanomami Ă© um problema crĂ´nico, sendo que a atual gestĂ£o da Funai tem trabalhado firmemente para resolvĂª-lo, bem como outros problemas que sĂ£o fruto de dĂ©cadas de fracasso da polĂtica indigenista brasileira que, no passado, era guiada por interesses escusos, falta de transparĂªncia e forte presença de organizações nĂ£o-governamentais”, afirmou a fundaĂ§Ă£o.
Em entrevista Ă Jovem Pan News em 12 de abril, o presidente da Funai, Marcelo Xavier, disse que o garimpo no territĂ³rio yanomami “tem duas vĂtimas: tanto o indĂgena quanto o garimpeiro”.
Ele defendeu a aprovaĂ§Ă£o de uma lei para regulamentar a atividade “para trazer transparĂªncia ao processo e, quem sabe, garantir uma soluĂ§Ă£o de vida mais digna para esses indĂgenas”.
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Foto: Ibama