Sonho acordado
Hoje, Flรกvio Lauria compartilha seus devaneios. O imaginรกrio do autor รฉ como o de muitos. Leia

Ednilson Maciel, Por Flรกvio Lauria*
Publicado em: 14/06/2024 ร s 10:09 | Atualizado em: 14/06/2024 ร s 10:12
Com meu problema sรฉrio de insรดnia, sonho acordado como muitos.
Sonhamos a paz, sonhamos liberdade, sonhamo-nos ricos ou pobres, sonhamos planos – incertos e vocacionais.
Sonhamos ilusรฃo – fugas da realidade, o prรณprio sono, a fantasia e a quimera.
Sonhamos pensar com insistรชncia – ter a ideia fixa, sonhamos com a glรณria e a tragรฉdia, com o amigo e o inimigo, sonhamos amor e รณdio.
Sonhamos recontando o passado, no vago misticismo de quem sonha um sonho abandonado. Hรก sempre a capitalizaรงรฃo do imaginรกrio.
Se hรก na face da terra de um hoje propagador do cansaรงo de viver, creditemos nossos anseios ร vontade de sobreviver nas divagaรงรตes noturnas que nos fazem a melhor forma de apreciar a vida.
Quando se vai ficando velho รฉ preciso reunir as forรงas que restam para aproveitรก-las mais viรกveis ao romantismo de cantar, escrever, conversar sobre o que fez e o que deixou de fazer sem as lamรบrias do arrependimento.
Sempre podendo recordar o que passou, saudando o que saldou de bom, com saudade atual e alicerรงando os finais de horas e minutos no recanto que mais aprouver a nรณs na companhia dos entes mais queridos.
Jรก nรฃo aguento a dinรขmica da violรชncia, quantitativamente esturricada no cotidiano, absorvendo-nos a paciรชncia – absolvendo-nos de todo o mal.
Violรชncia de todo tipo – nรฃo somente a da agressรฃo fรญsica, mas a da incompreensรฃo, da mentira, da falta de amor, do descaso, da falta de cidadania, da incoerรชncia, do รณdio, da omissรฃo, da injรบria e do perjรบrio.
Portanto, nรฃo hรก limite para sonhar. Antes, bem mais novo, รฉ claro, sonhava em ser alguรฉm na medida do possรญvel, que conseguisse uma maneira de acabar com polรญticos espรบrios e corruptos e com essa elite burguesa que atola nosso paรญs hรก sรฉculo seculorum; acabaria com essas igrejas universais forjadas por mentes servegonhentas de pastores de caras lisas; mandaria evacuar os humildes de bem dos morros do Rio de Janeiro e incendiaria com Napalm os traficantes que resistissem; nรฃo permitiria nenhum menor abandonado sem lar nem comida, muito menos sem escola.
Obrigaria todos os vagabundos de movimentos de siglas fajutas a trabalharem para o bem geral da naรงรฃo; meu Vasco da Gama teria o melhor time de futebol do mundo e nem o Real Madrid teria coragem de enfrentรก-lo; expulsaria todos os estrangeiros da Amazรดnia e daria guarida ao pulmรฃo do mundo.
Hoje, sonho-me diferente. Dou-me o direito, assim, de terminar meus dias com o amor de meus filhos, com certeza daquele diferenciado dos meus netos e, mais explicitamente, do carinho dos familiares e dos amigos.
Beberei meu puro scotch, ou meu vinho cabernet.
Nรฃo รฉ ร toa que sempre repito o que escrevia aos 18 anos: um sonho dificilmente deixa de ser um sonho – mas esse รฉ a vera!
*O autor รฉ mestre e doutor em administraรงรฃo pรบblica.
Foto: reproduรงรฃo/internet