Andirá: quilombo agora reconhecido, porém abandonado
“Sim! Estamos abandonados pelo poder público”, confirmou a liderança quilombola

Wilson Nogueira, especial para o BNC Amazonas
Publicado em: 19/05/2024 às 09:54 | Atualizado em: 19/05/2024 às 09:54
O Quilombo do Andirá, localizado no rio Andirá, no município de Barreirinha (AM), está abandonado pelo poder público (município, estado e União). Suas lideranças, com frequência, são ameaçadas de morte por posseiros, madeireiros e criadores de gado.
“Sim! Estamos abandonados pelo poder público”, confirmou a liderança quilombola Maria Amélia dos Santos Castro, 64 anos.
Ela espera que, agora, com o reconhecimento do quilombo pelo Instituto Nacional da Colonização e Reforma Agrária (Incra), essa realidade seja mudada por meio de políticas públicas voltadas à qualidade de vida nas terras quilombolas.
[…] nossas escolas estão caindo aos pedaços, não temos uma rua asfaltada. A gente não tem um reservatório de água. Temos uma UBS (Unidade Básica de Saúde] que não tem remédio, não tem médico, só tem dois enfermeiros e nós precisamos de mais um. Precisamos de mais coisas para a nossa UBS, denunciou Maria Amélia.
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Políticos somem
Maria Amélia criticou os políticos, candidatos a cargos eletivos que só procuram o quilombo em época de eleição e ali fazem promessas de campanha. Depois de eleitos, somem.
“São visitas e mais visitas, promessas e mais promessas, nunca realizadas. Também encaminhamos reivindicações às autoridades da saúde e da educação, porém nunca fomos atendidos”, acentuou.
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Retirada de posseiros
Com a titulação das terras do quilombo, marcado pelo Incra para até o fim deste ano, Maria Amélia espera que as ocupações e invasões sejam uma página virada na história entre os legítimos donos das terras e aqueles que são intrusos.
“Essas pessoas serão indenizadas e sairão de lá. Agora, a relação deles [intrusos] com os quilombos não é legal. Nunca nos ajudaram, então a gente. Não tem como dizer que fiquem”, disse ela.
A posição do quilombo, segundo Maria Amélia, é que só permanecerão nesse território os comprovadamente quilombolas e as famílias resultados de casamentos entre quilombolas e não quilombolas.

Floresta em pé
O coordenador da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais e Quilombolas (Conaq), Sebastião Douglas dos Santos de Castro, entende que a titulação do Quilombo do Rio Andirá é importante porque vai garantir floresta em pé.
Ele também é coordenador executivo da Conaq-Amazonas.
“Os quilombolas estão cientes dessa interação [com a natureza] para a sua própria sobrevivência”, disse Santos de Castro.
Ameaça de morte
Ao mesmo tempo, essa medida, a ser confirmada pela Incra, “vai tirar a pressão sobre as lideranças que muitas vezes são ameaçadas de morte”.
A desintrusão consiste na indenização de posseiros, fazendeiro, madeireiros etc., que tenham benfeitorias com documento comprobatório em mãos.
Após esta etapa, a Polícia Federal e o Instituto Chico Mendes (ICMBio) retirarão os denominados intrusos.
Isso é relevante, na opinião do coordenador da Conaq, porque “fazendeiros e madeireiros, sabendo que estão prestes a ser retirados da área, pressionam com ameaças de violência quem está à frente do movimento de reconhecimento e da titulação definitiva do quilombo.
Maria Amélia e João Xisto são – revelou ele – as lideranças mais ameaçadas, inclusive ameaçadas de morte.

Fotos: arquivo/Quilombo Andirá