Assassinatos no campo subiram 75% em 2021, denuncia Pastoral da Terra

Do total de mortes, 11 delas ocorreram no estado de Rondônia e 9 no Maranhão

Antônio Paulo, do BNC Amazonas em Brasília

Publicado em: 21/05/2022 às 06:00 | Atualizado em: 21/05/2022 às 09:39

No ano passado, foram registrados 35 assassinatos em conflitos no campo – um aumento de 75% em relação a 2020, quando foram registrados 20 assassinatos.

Desse total, 11 mortes ocorreram em Rondônia; 9 no Maranhão; Rio Grande do Sul, Tocantins e Roraima registraram 3 assassinatos cada.

No Pará e na Bahia foram 2 mortes e em Mato Grosso e Goiás, um caso cada.

As vítimas eram indígenas posseiros, sem-terra, soldados da borracha, quilombolas e quebradeiras e coco.

Entre os sete estados da Região Norte, não ocorreram assassinatos somente no Amazonas, Acre e Amapá

Os dados constam do relatório anual da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e foram apresentados à Comissão de Integração Nacional, Desenvolvimento Regional e Amazônia da Câmara dos Deputados nesta quinta-feira (19).

Esta é a 36ª edição do relatório que reúne dados sobre os conflitos e violências sofridas pelos trabalhadores e trabalhadoras do campo brasileiro, bem como indígenas, quilombolas e demais povos tradicionais do campo, das águas e das florestas.

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Crimes sem apuração

O representante da Pastoral da Terra, padre Josep Plans, afirmou que, para além dos assassinatos, os quilombolas, indígenas e pequenos produtores rurais ainda são vítimas de humilhação, intimidação e ameaça de morte que, quando chega a acontecer, fica sem investigação ou punição.

“Não foi apurada a morte, não foram identificados os autores nem os mandantes, essa é a regra geral dos assassinatos, são essas pessoas que são impunemente assassinadas”, disse.

Josep Plans disse ainda que existe a violência patrimonial, com casas queimadas e plantações destruídas, como forma de os grileiros expulsarem os moradores de determinada localidade.

Conflitos no campo

A Amazônia Legal, formada por 9 estados, detém boa parte dos conflitos no campo em 2021, como vem acontecendo em anos anteriores.

Foram registrados 641 conflitos por terra no território, praticamente a metade (49,49%) de tudo que foi registrado no Brasil.

Desse total, 124 conflitos por água estão na Amazônia, o que representa 40,78% do total no país. E 54 conflitos trabalhistas estão nessa região, cerca de um terço do total.

De acordo com os dados do Centro de Documentação da CPT – Dom Tomás Balduino (Cedoc-CPT), o estado do Pará lidera o ranking nacional de conflitos por terra em 2021, são 156 casos.

Na sequência aparecem a Bahia (134) e o Maranhão (97). No total, no Brasil, foram registradas 1.242 ocorrências de conflitos por terra, com 670.760 mil pessoas envolvidas.

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Promotores e vítimas

Entre os principais promotores dos conflitos por terra estão os fazendeiros (25%), seguido por grileiros de terras (19%) e garimpeiros (15%).

Já entre quem sofre com os conflitos no campo, estão, principalmente, os povos indígenas (38%), sem terra (29%) e assentados da reforma agrária (13%).

Os estados do Amazonas e Acre vêm em segundo lugar, com 56 conflitos por terra, onde foram atingidas 10.567 famílias acreanas e 6.762 famílias amazonenses.

Confira mais alguns números da Amazônia Legal.

Violência contra ocupação e a posse:

  • 77,9% das famílias afetadas por desmatamento ilegal;
  • 87,2% das famílias afetadas por expulsão;
  • 81,3% das famílias afetadas por grilagem de terras;
  • 82,2% das famílias afetadas por invasões de seus territórios.

E nas violências contra a pessoa, 80% dos assassinatos em conflitos no campo ocorreram na Amazônia Legal, são 29 dos 35 assassinatos em 2021.

Água

O número de conflitos por água no Pará registrou um aumento entre os dois últimos anos: passando de 31, em 2020, para 47, em 2021. E a quantidade de famílias envolvidas nesses conflitos mais que dobrou: saiu de 7.871 e foi para 16.122.

Essas pessoas, vítimas dos conflitos por água, em sua maioria são indígenas (43%), depois ribeirinhos e quilombolas, que, ambos, representam 23% do total.

No Brasil, em 2021, a CPT contabilizou 304 conflitos por água, sendo 224.540 pessoas envolvidas. Entre todos os estados brasileiros, o Pará só fica atrás da Bahia no número de conflitos.

O estado nordestino registrou 80 ocorrências de conflitos pela água. Apesar da Bahia ter mais casos, o Pará é o que tem mais famílias envolvidas, mais de 16 mil.

Entre as categorias que causaram os conflitos pela água, em primeiro lugar estão as hidrelétricas (26%), seguido por mineradoras internacionais (21%) e empresários de outros países (15%).

Críticas ao governo

O representante da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Kleber Karipuna, afirmou que o aumento da violência verificado durante a pandemia é resultado do discurso violento do próprio governo federal, que incentiva o armamento dos fazendeiros para defesa de suas terras.

O representante do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST), Diego Vedovatto, afirmou que grande parte dos conflitos são em terras públicas, e não aconteceriam se esses espaços já tivessem sido demarcados para a reforma agrária.

“Esses conflitos vão acabar quando o Estado de fato demarcar os territórios indígenas, demarcar os territórios quilombolas, destinar as terras públicas para a reforma agrária como determina o artigo 188 da Constituição Federal”.

*Com informações da CPT e Câmara dos Deputados

Foto: Marcelo Camargo/EBC