Não foram apenas três indígenas que morreram por covid (coronavírus), como disse o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em visita ao povo ianomâmi, no município de São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas, nesta quinta-feira (27). Ao contrário, o número é devastador.
Somente na região do Alto Rio Negro, 100 indígenas das 23 etnias que lá vivem foram a óbito desde o início da pandemia.
E, segundo a Fundação de Vigilância em Saúde do Amazonas (FVS-AM), somente em São Gabriel da Cachoeira foram confirmados 5.542 casos de covid. Em todo o estado, o número de confirmações chega a 16.914 com 301 mortes.
Em sua live semanal, transmitida pelas redes sociais todas as quintas-feiras, Bolsonaro disse que visitou o povo ianomâmi no 5º Pelotão Especial de Fronteira. Lá, teria sido informado pelos próprios indígenas que houve apenas três mortes por covid.
“Eram índios já bastante idosos. Com toda certeza deveriam ter alguma comorbidade. E falaram que tomaram chá de carapanaúba, saracura e jambu”, disse o presidente.
O presidente da Federação dos Povos Indígenas do Rio Negro (Foirn ), Marivelton Baré, criticou as declarações de Jair Bolsonaro.
“O presidente deveria ter mais responsabilidade e respeito com os povos indígenas, pois, não foram só três mortes, pelo contrário, houve muitas mortes da população indígena. Não pode desconsiderar a situação do seu próprio país”, declarou o líder indígena do Alto Rio Negro.
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De acordo com presidente da Foirn, houve 47 mortes na região do Rio Negro (com 23 etnias), na primeira onda, e 39 na segunda.
Morte de ianomâmis
Pelo levantamento da Rede Pró-Yanomami e Ye’kwana, que monitora os casos de covid na terra indígena ianomâmi, foram confirmados 21 casos, 13 suspeitos e 10 mortes.
Mas, o monitoramento feito pela rede da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) revela que nos nove estados da Amazônia Brasileira – os sete da Região Norte, o Mato Grosso e Maranhão – o coronavírus já atingiu 38.680 indígenas, com 933 mortes entre 151 povos.
Chá para tratar covid
Na live semanal, Bolsonaro afirmou que uma tribo na Amazônia tomou chá de carapanaúba, saracura e jambu, quando alguns indígenas contraíram a covid antes da vacinação.
O presidente disse que ninguém morreu, mas reconheceu que o tratamento não possui comprovação científica.
Bolsonaro também aproveitou para atacar a CPI da covid e o presidente da comissão, senador Omar Aziz (PSD-AM).
“Não morreram por quê? Tomaram alguma coisa, perguntei. Segundo eles, tomaram chá de carapanaúba, saracura e jambu. Não tem comprovação científica, mas tomaram isso. Poderia essa querida CPI, que tem como presidente o senador Omar Aziz – sei que não pode convocar indígenas, pois não se enquadram -, mas poderia convidá-los para ouvi-los”, disse o presidente.
Bolsonaro é um “makadawalitsa”
Ao portal de notícias Amazônia Real, o líder André Baniwa, da Organização Indígena da Bacia do Içana (Oibi) criticou a postura de Bolsonaro, principalmente quando se referiu, com desdém, ao uso de chás de plantas medicinais que os indígenas teriam tomado para curar o coronavírus.
“Eu não sei como chamar esse presidente. Em baniwa, a gente chama de ‘makadawalitsa’, que é uma pessoa que a gente considera que não tem valor, é bagunceira. Tudo o que diz parece que não tem sentido, mas ao mesmo tempo está destruindo tudo. Em português, deve ser isso: grosseiro, tosco, sem valor”, resumiu André Fernando Baniwa.
Foto: Marcos Corrêa/PR