Turismo no quintal de “casa”: a Amazônia
“Turismo na região sempre foi orientado ao público internacional”
Por Dassuem Nogueira, especial para o BNC Amazonas
Publicado em: 23/09/2023 às 14:23 | Atualizado em: 23/09/2023 às 14:23
A Amazônia tem um forte apelo mundial por sua reserva natural e biodiversidade que a torna interessante ao público estrangeiro. Assim, o turismo na região sempre foi orientado ao público internacional.
Em parte, porque o mercado em dólar e euro é mais lucrativo. Mas, a realidade é que o turismo na Amazônia é um produto caro.
As dimensões espaciais e grandes deslocamentos por seus atrativos turísticos naturais encarecem os custos para se conhecer a região.
Assim, mesmo para o público nacional, esse não é um serviço financeiramente acessível.
Durante a pandemia da covid, o turismo foi uma das áreas mais afetadas no mundo inteiro pelas restrições de circulação e convivência social necessárias para a contenção do novo coronavírus.
A situação fez com que o setor se voltasse para o mercado nacional. O que exigiu a busca por nichos de consumidores e personalização de serviços para atraí-los.
O regional e peculiaridades
Há fatores de ordem demográfica e cultural que ajudam a compreender porque o turismo regional não era uma linha de atuação explorada.
Leia mais
Lima diz que parceria pelo turismo no Amazonas é fortalecida
Manaus, por exemplo, concentra mais da metade da população do estado. Assim a capital possui forte incremento da população do interior, número que cresce a cada ano.
A vivência dos interioranos amazônidas é repleta de paisagens naturais, experiências e relações que quem mora a maior parte da vida na capital, dificilmente, experimenta. Desse modo, fica difícil oferecer a esse público um produto tão familiar.
Além disso, embora cercada pela maior floresta tropical do mundo, Manaus cresceu e cresce sem preservar seus atrativos naturais. Se contam nos dedos as opções de cultivarmos a relação ancestral que temos com a natureza amazônica na cidade.
As que temos, por sua vez, não absorvem sequer o grupo seleto que pode lhes frequentar, como é o caso dos polêmicos flutuantes do rio Tarumã Açu que lotam nos finais de semana.
A Ponta Negra talvez seja a mais democrática delas, pois é possível chegar até lá de ônibus. Mas, de modo geral, não se tem acesso por transporte público, apenas por meio de veículos particulares, sejam próprios, alugados ou de prestadores de serviços.
Os locais com balneabilidade estão cada vez mais distantes da cidade à medida que ela avança sobre a floresta e, com ela, a poluição.
Em Manaus, os chamados “passeios” são uma prática comum. São excursões familiares ou de vizinhanças que se cotizam para irem até balneários em veículos grandes, como ônibus e micro-ônibus ou barco.
Contudo, desde a pandemia, cresceu o número de pequenas empresas de turismo que oferecem excursões rápidas de um dia ou de finais de semana para uma figura até então pouco explorada, o turista local.
Os preços são mais atraentes, entre 150 e 250 reais por pessoa. Os destinos são o complexo de cachoeiras de Presidente Figueiredo e o complexo turístico de Novo Airão e Rio Preto da Eva.
Os pacotes de um dia incluem o traslado, guia, entradas, almoço e auxílio com fotos. Os de fim de semana oferecem adicionais como aluguel de barracas para acampamento e cooler.
Os pacotes são de curta duração a fim de capturar aqueles que trabalham durante a semana em Manaus e só podem disfrutar dos passeios nos finais de semana e dias de folga.
Por fim, as iniciativas possibilitam que, moradores nascidos e crescidos em Manaus ou em outras regiões amazônicas conheçam os polos turísticos que são o quintal de sua casa na capital.
Leia mais
Embratur vende turismo no Amazonas na Times Square, em NY
Turistas e estreia no Amazonas
Paula Araújo, 38 anos, e Débora Magalhães, 37 anos, vieram do Ceará a Manaus pela primeira vez. Elas nos contam que sempre tiveram o sonho de conhecer a Amazônia.
Foram, imediatamente, surpreendidas pela culinária, algo completamente inédito para elas: “Não consigo provar a culinária daqui e comparar com outro lugar, é como se eu criasse uma nova régua”, avaliou Débora.
Turismo na imensidão única
Para Paula, as coisas que experimentou são realmente típicas da região, pois não chegam a outras partes do país. Impressionaram os peixes pela textura das carnes, que é mais densa e são mais gordurosos do que os peixes de mar.
Ambas concordam que para quem gosta de natureza, a sensação de imensidão diante das florestas e rios é única. A Amazônia tem dimensões que jamais tinham visto.
Para elas, o aspecto desafiador da experiência foi o calor, pois exige disposição. E os valores, pois as passagens aéreas para a região são mais caras do que para outros destinos no país.
Entre seus passeios, as duas adquiriram um pacote que incluía dormir uma noite na floresta. Débora acredita que deveriam ter tido uma orientação mais detalhada sobre a experiência.
Elas nos contaram que uma de suas colegas de grupo teve uma crise de pânico em função da escuridão e dos sons da floresta durante a noite. Segundo elas, quem não conhece a floresta não imagina que ela seja tão movimentada à noite.
Débora teve duas experiências curiosas. Durante o acampamento noturno, teve sonhos perturbadores com pessoas fantasmagóricas que não a deixavam dormir. Como se diz no Amazonas, ela foi perturbada pelas visagens.
E, por fim, foi atacada por mucuim. O pequenino carrapato se instala sob a pele e lá permanece fazendo coceira, ininterruptamente, até morrer.
Ao procurar ajuda dos manauaras sobre como sanar o ataque, ela obteve receitas como álcool, andiroba e paciência.
Mas, para os dois casos, recebeu uma orientação curiosa: da próxima vez que for andar em floresta desconhecida, disseram que ela deve pedir licença para evitar visagens e mucuins.
Bem humorada, Débora disse que essa era uma orientação que deveria ter recebido da agência que contratou.
Fotos: Paula Araújo e Déborah Magalhães/cedidas em cortesia ao BNC Amazonas