Iram Alfaia , de Brasília
Localizado em Pinheiros, bairro nobre de São Paulo, o Instituto Escolhas entregou à comissão especial que analisa a proposta de emenda à Constituição (PEC) 45/2019 sobre a reforma tributária, na Câmara dos Deputados, um plano alternativo aos atuais incentivos fiscais concedidos no âmbito da Zona Franca de Manaus (ZFM).
Esse objetivo não foi deixado claro aos parlamentares da comissão durante a exposição do estudo “Impulsionando o desenvolvimento sustentável do Amazonas”, na semana passada.
No entanto, no comunicado distribuído à imprensa nacional, o instituto não deixa dúvidas sobre seus interesses:
“Os cofres públicos abrem mão de cerca de R$ 23 bilhões por ano em renúncias fiscais para as empresas instaladas na Zona Franca de Manaus. Entretanto, o modelo de incentivos setoriais e regionais tem sido questionado em diversas instâncias políticas e econômicas”.
Segundo a nota, o maior prejudicado seria o Estado brasileiro, que vem limitando drasticamente sua capacidade de investimentos.
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ZFM com metas a cumprir
Nesse sentido, a entidade propõe uma mudança de foco nas políticas públicas para a ZFM e para todo o estado do Amazonas, com condicionantes ao estabelecimento de metas para incremento da produtividade e produção voltada ao mercado externo.
Para isso, são elencadas algumas ações: integração às cadeias globais de valor, limitação do período de concessão dos benefícios fiscais, forte investimento em P&D (pesquisa e desenvolvimento), avaliação periódica dos resultados e indução de ecossistema de inovação envolvendo as três esferas de governo, academia e empresa.
Como estratagema para reforçar a ideia, o Escolhas usou no material de divulgação os depoimentos de deputados amazonenses que na audiência só tomaram conhecimento do plano propriamente dito.
“Queria parabenizar a apresentação do Sérgio Leitão, que coloca o aspecto do que é Zona Franca [de Manaus], seus gargalos, suas dificuldades, e coloca eixos de oportunidades. Será que vamos ficar eternamente com essa política de incentivos? Já completou 52 anos. O senhor coloca alternativas compatíveis com a necessidade de desenvolvimento da Amazônia, do estado do Amazonas, dessa região tão rica”, disse na ocasião o deputado José Ricardo(PT).
Vice-presidente da comissão da reforma, o deputado Sidney Leite (PSD-AM) afirmou que as propostas do Escolhas são interessantes, com destaque para o item do polo de transformação digital.
“Você [Sérgio Leitão] foi muito feliz, inclusive com a questão de comunicação. A tecnologia 3, 4 e 5 D na Amazônia não chegou. É um bom caminho, é um bom debate”.
Leitão é o diretor-executivo do Escolhas. Em entrevista recente ao jornal Valor Econômico, ele disse:
“Há vida fora da Zona Franca [de Manaus], mas precisa de muito planejamento.”
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Quem é quem
O Instituto Escolhas tem como presidente Ricardo Sennes, atual membro do conselho de assuntos estratégicos da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), entidade que sempre questionou os incentivos fiscais da ZFM.
“A Zona Franca de Manaus é o tipo de distorção da economia que torna o Brasil um lugar mais pobre […] O problema está na criação da zona franca, que não deveria existir, ou já deveria ter sido extinta ou deveríamos estar discutindo um modelo para substituí-la. Mas, ao contrário, ampliaremos o seu impacto”, disse o economista Marcos Lisboa, em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo, em abril passado.
Na ocasião, o economista, que é membro do conselho diretor do Escolhas, referia-se à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), por 6 votos a 4, para que empresas de fora de Manaus, mas que compram insumos da região, isentos do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), tenham direito ao crédito tributário.
Lisboa também foi secretário de política econômica no Ministério da Fazenda (2003 a 2005), no primeiro governo de Lula da Silva (PT).
Bernard Appy, diretor do instituto, é outro adversário declarado da ZFM. Ele é o atual mentor da PEC 45 e atua para barrar os incentivos locais na proposta.
Appy propõe, por exemplo, a criação de um fundo de desenvolvimento regional como forma de compensar o fim dos incentivos fiscais do modelo.
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A proposta para substituir a ZFM
O instituto propõe um investimento ao longo de dez anos de R$ 7,15 bilhões para impulsionar a bioeconomia no Amazonas.
Desse total, R$ 3 bilhões seriam destinados à fabricação e ao lançamento de um satélite geoestacionário, capaz de dinamizar o acesso à banda larga em toda a Amazônia Legal.
Os recursos seriam investidos em infraestrutura, possibilitando a geração de 218 mil empregos, entre diretos e indiretos.
“Esta ampliação da cobertura da oferta digital será capaz de viabilizar a transformação de Manaus no primeiro hub de pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I) em bioeconomia do mundo, com a dinamização do Centro de Biotecnologia da Amazônia [CBA, na foto ], hoje subutilizado.”
Há também a indicação na proposta de um polo moveleiro, integrado à ZFM, com cerca de 50 empresas e investimentos de R$ 1 bilhão.
“Esse polo usará matéria-prima oriunda do polo de produção de madeira tropical engenheirada [extraída de áreas de manejo], que também será utilizada pela construção civil, a ser implantado com investimentos de R$ 500 milhões”.
Segundo o plano do instituto, um dos pontos mais destacados pelo estudo é o ainda baixo aproveitamento sustentável dos recursos naturais.
Um exemplo disso é a piscicultura. No Amazonas, diz a entidade, mesmo com grande extensão territorial para instalar fazendas de criação e reconhecida diversidade de espécies de peixes, importa 58% de seu consumo de pescados dos estados vizinhos de Roraima e Rondônia.
“Se considerado apenas o tambaqui, peixe que é uma marca registrada do Amazonas, a importação chega a 90%”, diz o Escolhas.
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Foto: Divulgação/Suframa