Índios, negros e estudantes repudiam revogação da política de cotas

À última decisão de Abraham Weintraub, a Câmara e o Senado também reagiram. Dois projetos de leis preveem anulação da portaria do MEC.

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Antônio Paulo, do BNC Amazonas em Brasília

Publicado em: 18/06/2020 às 18:20 | Atualizado em: 18/06/2020 às 18:20

A última decisão do agora ex-ministro da Educação, Abraham Weintraub (foto), de revogar a portaria sobre a política de cotas para negros, indígenas e pessoas com deficiências, em cursos de pós-graduação, causou indignação e revolta nos especialistas da área educacional, no movimento indígena, negro e no Parlamento.

A Portaria Normativa do MEC nº 13/2016 foi instituída no governo de Dilma Roussef, quando Aloísio Mercadante era o ministro da Educação.

A decisão de Weintraub (Portaria 545/2020) foi publicada nesta quinta-feira, dia 18, no Diário Oficial da União, a última antes de ele anunciar, ao vivo, seu pedido de demissão ao presidente Jair Bolsonaro.

A reação ao fim da política de cotas na pós-graduação das universidades foi imediata.

Pelo menos, dois projetos de leis foram protocolados na Câmara e outro no Senado.

Na bancada do Amazonas, parlamentares também se manifestaram contrários à revogação da portaria assinada por Abraham Weintraub.

O deputado federal Sidney Leite (PSD-AM), classificou a decisão como retrocesso e lembrou que se não fosse a lei de cotas muitos jovens do interior do estado não teriam ingressado na Universidade Estadual do Amazonas (UEA).

“Essa política é acertada porque não podemos tratar os iguais da mesma forma que os desiguais. Não fazer essa diferenciação do ponto de vista econômico, entre aqueles que têm menos vantagens para buscar uma educação de qualidade, como os negros, índios e os mais pobres, faz-se um nivelamento por baixo e isso não é justo”, argumentou Sidney Leite.

O deputado José Ricardo (PT-AM) fez críticas contundentes a Abraham Weintraub. “Ele é racista, fascista, contra a educação, os índios, os negros. É tudo o que não presta e nunca deveria ter sido ministro da Educação. Já vai tarde”, declarou o petista.

 

Repúdio de índios e negros

Logo que saiu a portaria do MEC, a Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn) emitiu nota de repúdio contra a decisão.

“Nós, povos indígenas, fomos ofendidos de morte pelo ministro Weintraub que declarou recentemente que odeia a expressão povos indígenas. Com isso, o ex-ministro da Educação demonstrou a sua ignorância e racismo aos povos originários”, diz a nota da Foirn.

 

Comunidade Baniwa de Tucumã-Rupitã, às margens do rio Içana, Terra Indígena Alto Rio Negro, São Gabriel da Cachoeira (AM)
Foto: Beto Ricardo/ISA

 

A federação, que representa os 23 povos indígenas dos municípios de Barcelos, Santa Isabel do Rio Negro e São Gabriel da Cachoeira, no estado do Amazonas, diz que seguirá na luta por uma educação inclusiva, pluriétnica, intercultural e que valorize a diversidade sociocultural do Brasil.

Para o Movimento Negro Unificado (MNU), a política de cotas é uma conquista histórica da luta dos movimentos de negros e indígenas. E que essa medida do ex-ministro Weintraub é mais um ataque do governo para destruir as universidades públicas.

“Negros e indígenas trazem novos saberes e pluralidade para as pesquisas que são produzidas no Brasil. As universidades precisam ser mais democráticas e representativas”, declarou a socióloga Najara Costa, autora do livro “Quem é Negra/o no Brasil?”.

 

Derrotas de Weintraub

Para presidente da Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG), Flávia Calé, a revogação das políticas afirmativas acontece depois de algumas derrotas do ex-ministro Weintraub.

Ela cita como exemplos o adiamento do Enem e a anulação da medida provisória sobre as indicações indiretas para escolha de reitores das universidades públicas.

Calé considera que Weintraub também se aproveitou da fissura entre algumas universidades federais, que ainda têm resistência à política de cotas na pós-graduação, para publicar a portaria.

“Ele quis cair atirando, querendo criar um ambiente de caos político. Infelizmente, é nisso que o Ministério da Educação se transformou, em uma fábrica de crises”, afirmou a presidente da ANPG.

 

Foto: Marcelo Camargo/ABr