Cinco anos após o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, Minas Gerais, nenhuma das ações reparatórias esperadas foi concluída. Esta, informação, foi repassada por procuradores integrantes da Força-Tarefa Rio Doce do Ministério Público Federal (MPF).
“O desastre que arrasou não apenas Mariana, mas toda a bacia do Rio Doce, uma área equivalente a Portugal, continua aqui. Cinco anos depois, nada está concluído, tudo está por fazer”, diz a Procuradora da República e coordenadora da Força-Tarefa Rio Doce, Silmara Goulart.
“Nenhum, absolutamente nenhum grupo de atingidos, sejam eles agricultores, lavadeiras, artesão, pescadores, pequenos comerciantes, foi integralmente indenizado. O meio ambiente também não foi integralmente recuperado. Sequer o município de Bento Rodrigues, símbolo do desastre, foi reconstruído”, acrescenta Silmara, que participou hoje (29) de coletiva de imprensa para tratar das ações que foram feitas desde o desastre.
Tragédia de Mariana
O rompimento da barragem ocorreu em 5 de novembro de 2015. Mais de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos atingiram o rio Gualaxo do Norte, em Mariana. Dessa forma, desaguaram no rio Doce e seguiram até a foz, no mar de Regência, no litoral capixaba.
A lama causou a morte de 19 pessoas. Além disso, gerou uma série de impactos ambientais, sociais e econômicos. Dessa forma, acabou atingindo 39 municípios de Minas Gerais e Espírito Santo.
Mariana (MG) (Antonio Cruz/Agência Brasil)
Para reparar os danos causados, a União e os Estados de Minas Gerais e Espírito Santo celebraram um Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC) com as empresas Samarco, BHP e Vale, responsáveis pela barragem.
Além de criar a Fundação Renova, organização que deve pôr em prática as compensações, o TTAC estabelece 42 programas. Este, portanto, devem ser cumpridos nos 670 quilômetros de área impactada ao longo do Rio Doce e afluentes.
Posteriormente, em 2018, instituições de Justiça celebraram com as empresas rés e com os entes federativos – União, MG e ES um Termo de Ajustamento de Conduta. A princípio, o termo foi denominado TAC-Governança (TAC-GOV).
Além disso, o documento previu a alteração do sistema de governança da Fundação Renova instituído pelo TTAC. Este, foi firmado em 2016, com objetivo de assegurar a efetiva participação das pessoas atingidas no processo de reparação integral dos danos sofridos por elas.
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Relatórios do MPF
O MPF reuniu em uma página pareceres e relatórios que mostram que ainda há muito o que fazer.
Passados cinco anos do desastre, 29.039 habitantes ainda dependem do abastecimento de água por caminhão-pipa. A medida é tomada devido a insegurança no consumo da água. Dessa forma, torna-se uma situação agravante durante a pandemia do coronavírus.
Até agosto deste ano, 153 de 374, o equivalente a 41% das ações de melhoria dos sistemas de abastecimento de água foram concluídas. Entretanto, o prazo estabelecido no TTAC, de acordo com o órgão, era 2018.
“Isso é um acontecimento que está no dia a dia delas [pessoas atingidas], e que afeta o direito mais básico, que é o acesso à água e o acesso à própria saúde. Quando você não tem certeza de que a água que faz a comida dos seus filhos pode ser consumida, você não tem tranquilidade e aí você tem mais um dos agravamentos da saúde mental”, diz a Defensora Pública Estadual em Minas Gerais Carolina Morishita.
Também de acordo com o MPF, apenas 10.885, o equivalente a 34%, das 31.755 famílias cadastradas, receberam algum tipo de indenização até agosto de 2020.
O Promotor de Justiça em Minas Gerais André Sperling comparou a situação com Brumadinho. Na cidade mineira,em 2019, uma barragem da Vale também se rompeu , deixando 259 mortos. Lá, segundo Sperling, mais de 100 mil pessoas recebem algum auxílio.
“Isso nunca chegou perto de acontecer na Bacia do Rio Doce. Nunca houve a oportunidade efetivamente dos atingidos estarem um pouco mais garantidos para esse processo de negociação. O que existe é que os atingidos estão desamparados”, disse.
Lucro da Vale
Nesta semana, a mineradora Vale anunciou um lucro líquido de US$ 1,654 bilhão no terceiro trimestre de 2019 , após um prejuízo de US$ 133 milhões no trimestre anterior.
“Isso me fez refletir que talvez nós precisemos, como sociedade brasileira e como uma comunidade mundial, refletir sobre como as pessoas podem estar hoje alegres às custas do sofrimento e do desespero dessas pessoas atingidas. Esse para mim é um terceiro desastre”, diz Silmara.
Na semana passada, a Fundação Renova também fez uma coletiva virtual para a imprensa para analisar os cinco anos da tragédia de Mariana.
De acordo com o diretor-presidente da Fundação, André de Freitas, a pandemia atrasou as obras de reparação.
A Fundação diz ainda que, nos quatro anos de trabalho, foram pagos cerca de R$ 2,6 bilhões em indenizações e auxílios financeiros. Isso tudo, de acordo com a empresa, foi para as vítimas que conseguiram comprovar que sofreram danos.
De acordo com Freitas, existe a barreira para atender os atingidos que não conseguem fazer a comprovação. Isso ocorre uma vez que o Código Civil brasileiro diz que a indenização não pode ser feita sem o dano comprovado.
A Renova diz ainda que realiza ações para tratar da água e do esgoto da região, além de outras medidas.
Foto: Antonio Cruz/ Agência Brasil
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