MPF age e Justiça manda Ipaam cassar licença de garimpos no rio Madeira

Com isso, toda a atividade garimpeira antes amparada por licenças irregulares deve seguir paralisada

Publicado em: 19/08/2021 Ă s 18:44 | Atualizado em: 19/08/2021 Ă s 18:44

Atendendo a pedido do MinistĂ©rio PĂºblico Federal (MPF), a Justiça condenou o Instituto de ProteĂ§Ă£o Ambiental do Estado do Amazonas (Ipaam) a anular as licenças concedidas irregularmente para as atividades de extraĂ§Ă£o de ouro no leito do rio Madeira, em Ă¡rea de mais de 37 mil hectares, na regiĂ£o sul do Amazonas.

A sentença reafirmou uma decisĂ£o liminar de dezembro de 2017 nesse mesmo sentido. Com isso, toda a atividade garimpeira antes amparada por essas licenças irregulares deve seguir paralisada.

A Justiça considerou ilegais e inconstitucionais as licenças concedidas pelo Ipaam em razĂ£o da ausĂªncia de estudo de impacto ambiental antes da concessĂ£o dessas autorizações para exploraĂ§Ă£o mineral e pelos danos ambientais causados pelas atividades de garimpo com o uso indiscriminado de mercĂºrio.

Conforme a sentença, as atividades autorizadas por essas licenças comprometem a segurança do meio ambiente, podendo ocasionar danos irreparĂ¡veis ao rio Madeira.

AlĂ©m dos prejuĂ­zos ecolĂ³gicos, danos graves Ă s comunidades tradicionais e os trabalhadores do garimpo foram documentados em relatĂ³rios produzidos pelo prĂ³prio Ipaam devido Ă  contaminaĂ§Ă£o da Ă¡gua por mercĂºrio.

Parecer tĂ©cnico do prĂ³prio Ă³rgĂ£o que concedeu as licenças agora consideradas nulas aponta que, por se tratar de uma atividade com alto potencial de impacto as atividades garimpeiras podem “trazer danos irreversĂ­veis principalmente para os garimpeiros e populaĂ§Ă£o ribeirinha que consomem os alimentos que estĂ£o no leito do rio”.

Durante as fiscalizações foram observados diversos vazamentos de substĂ¢ncias oleosas no piso de quase todas as embarcações verificadas, potencializando a contaminaĂ§Ă£o do leito do rio.

Os documentos tambĂ©m mostraram que nĂ£o hĂ¡ destinaĂ§Ă£o adequada de resĂ­duos sĂ³lidos. “Estes sĂ£o queimados em uma metade de barril metĂ¡lico, geralmente em uma das extremidades da draga (proa/popa), fato que poderĂ¡ levar integrantes da embarcaĂ§Ă£o a intoxicaĂ§Ă£o por meio de gases e/ou vapores, os quais sĂ£o dispersos na atmosfera. Outros problemas poderĂ£o ocorrer com a continuaĂ§Ă£o da prĂ¡tica de queima de resĂ­duos sĂ³lidos no interior das dragas, como: incĂªndio ou explosões em virtude de se encontrarem armazenados nestas, grande quantidade de combustĂ­veis, os quais sĂ£o utilizados nos diversos equipamentos e mĂ¡quinas”, destaca outro trecho do relatĂ³rio do Ipaam transcrito na sentença.

Outro problema identificado foi a ausĂªncia de utilizaĂ§Ă£o de equipamentos de proteĂ§Ă£o Individual por parte dos operadores e auxiliares das dragas, como protetores auriculares em razĂ£o do grande ruĂ­do gerado pelos motores e bombas de sucĂ§Ă£o.

OmissĂ£o

Nas alegações finais da aĂ§Ă£o, o MPF apontou, por meio de relatĂ³rios e  pareceres do Ipaam, a “sistemĂ¡tica  omissĂ£o  dos Ă³rgĂ£os  de  fiscalizaĂ§Ă£o, quanto ao controle do uso do mercĂºrio,  que resulta em predatĂ³ria exploraĂ§Ă£o mineral de ouro nos rios amazĂ´nicos”.

Para a Justiça, que confirmou o entendimento do MPF, esses relatĂ³rios demonstram o descaso com o meio ambiente por parte dos garimpeiros licenciados pelo Ipaam.

O Ă³rgĂ£o ambiental estadual, “apesar de constatar todas essas irregularidades, continuou a licenciar a atividade garimpeira no leito do rio Madeira”, destaca a sentença.

Estudos necessĂ¡rios

Na aĂ§Ă£o civil pĂºblica, o MPF tambĂ©m destacou a necessidade de estudos de impacto ambiental para concessĂ£o da licença de exploraĂ§Ă£o, proposta que nĂ£o foi apresentada pela cooperativa de garimpeiros.

O Ipaam justificou a ausĂªncia desses documentos argumentando que a atividade Ă© exercida no leito do rio Madeira hĂ¡ cerca de quarenta anos, sempre da mesma forma rudimentar, permitindo a sobrevivĂªncia de cerca de seis mil pessoas.

A sentença que anulou as licenças concedidas aos garimpeiros confirma que os estudos de impacto ambiental sĂ£o necessĂ¡rios para validar o licenciamento e devem ser “Ă­ntegros  quanto  à  localizaĂ§Ă£o, instalaĂ§Ă£o, ampliaĂ§Ă£o e operaĂ§Ă£o do empreendimento, com vistas a subsidiar anĂ¡lise das possĂ­veis externalidades negativas”.

Uso nocivo de mercĂºrio

A Justiça destaca tambĂ©m na sentença que o Ipaam nĂ£o pode conceder licenças ambientais autorizando o garimpo que se vale do uso indiscriminado e descontrolado de mercĂºrio, jĂ¡ que o Brasil assumiu compromisso com a ConvenĂ§Ă£o de Minamata, norma do direito ambiental internacional que tem por finalidade proteger a saĂºde humana e o meio ambiente das emissões e liberações antropogĂªnicas de mercĂºrio e de compostos de mercĂºrio.

O acordo estabelece uma sĂ©rie de critĂ©rios e obrigações para armazenamento e destinaĂ§Ă£o adequados dos resĂ­duos de mercĂºrio utilizados no garimpo, com objetivo a mitigar os efeitos nocivos Ă  saĂºde humana, Ă  biodiversidade e ao meio ambiente.

“A ConvenĂ§Ă£o estĂ¡ em vigor desde 8 de novembro de 2017, impondo ao Brasil (o que inclui todos os entes da federaĂ§Ă£o) o compromisso internacional de progressivamente acabar com uso do mercĂºrio em atividades de garimpo artesanal, como medida necessĂ¡ria Ă  proteĂ§Ă£o da saĂºde humana e do meio ambiente”, afirma trecho da sentença.

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