AĂ§Ă£o contra PEC dos auxĂlios nem chegou ao STF e jĂ¡ teria relator
Em carĂ¡ter reservado, ministros do tribunal ouvidos pela coluna consideram mais prudente julgar a aĂ§Ă£o do Novo a partir de novembro, quando as eleições tiverem sido concluĂdas

Publicado em: 18/07/2022 Ă s 11:48 | Atualizado em: 18/07/2022 Ă s 12:01
A aĂ§Ă£o que deve contestar a legalidade da PEC dos auxĂlios nem chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF) – mas, nos bastidores da Corte, a vitĂ³ria do presidente Jair Bolsonaro começa a ser desenhada.
Quando uma aĂ§Ă£o chega ao STF, a primeira vitĂ³ria – ou derrota – estĂ¡ no resultado do sorteio do relator. Os processos sĂ£o sorteados para a relatoria de um dos dez ministros – o presidente Ă© excluĂdo da sistemĂ¡tica. Mas, em alguns casos, o relator jĂ¡ estĂ¡ previamente definido.
HĂ¡ duas semanas, chegou Ă Corte uma aĂ§Ă£o que pedia a suspensĂ£o da tramitaĂ§Ă£o da PEC no Congresso Nacional. AndrĂ© Mendonça foi sorteado para cuidar do caso e negou a liminar. Explicou que o JudiciĂ¡rio nĂ£o pode intervir na atividade do Legislativo.
Regra interna do tribunal determina que processos sobre o mesmo assunto sejam encaminhados para o mesmo ministro. Em linguagem jurĂdica, Mendonça estaria prevento para relatar o processo que o partido Novo planeja enviar ao STF contra a PEC nesta semana.
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A prevenĂ§Ă£o de Mendonça Ă© motivo de festa no PalĂ¡cio do Planalto. O ministro, escolhido por Bolsonaro para ocupar uma das 11 cadeiras do STF, Ă© visto como um dos principais interlocutores do governo na Corte. O outro Ă© Kassio Nunes Marques, tambĂ©m nomeado pelo presidente.
Desde que sentou-se na cadeira do STF, Mendonça deu a Bolsonaro provas de fidelidade e alinhamento ideolĂ³gico.
Um deles foi quando impediu que a PEC fosse derrubada antes mesmo de ser promulgada. Em junho, pediu vista do julgamento sobre o deputado bolsonarista beneficiado por uma liminar de Nunes Marques.
No tribunal, hĂ¡ quem pondere que Mendonça nĂ£o necessariamente seria o relator da aĂ§Ă£o contra a PEC. Como seriam tipos de processos diferentes, um especĂfico e outro de natureza mais ampla, a regra da prevenĂ§Ă£o nĂ£o se aplicaria. Mas hĂ¡ precedente do uso da norma para casos de classes processuais distintas.
Quando hĂ¡ dĂºvida no tribunal sobre se o caso Ă© de prevenĂ§Ă£o ou nĂ£o, cabe ao presidente do STF decidir o destino do processo: se serĂ¡ sorteado entre os 10 ministros, ou se vai para um gabinete predeterminado.
Se for mesmo designado relator do processo, a expectativa é que Mendonça tenha dois caminhos a seguir.
Um deles Ă©, com uma canetada, negar o pedido do Novo e manter a validade da PEC. Na sequĂªncia, ele poderia adiar indefinidamente o envio do caso para julgamento em plenĂ¡rio, se aguentar a pressĂ£o polĂtica.
A outra alternativa seria engavetar o processo, repousar a caneta e nĂ£o tomar decisĂ£o nenhuma. A inaĂ§Ă£o seria uma forma de manter a PEC em vigor sem se desgastar tanto.
Em um cenĂ¡rio alternativo e menos provĂ¡vel, se nĂ£o for aplicada a regra de prevenĂ§Ă£o para a aĂ§Ă£o do Novo, a relatoria do processo seria sorteada para um dos dez ministros do STF.
Nesse caso, o destino do processo dependeria do perfil do relator. Se o caso cair nas mĂ£os de Nunes Marques, Bolsonaro tambĂ©m poderĂ¡ ter esperança de vitĂ³ria.
Em carĂ¡ter reservado, ministros do tribunal ouvidos pela coluna consideram mais prudente julgar a aĂ§Ă£o do Novo a partir de novembro, quando as eleições tiverem sido concluĂdas.
Seria uma forma de a Corte se eximir de enfrentar uma matĂ©ria polĂªmica no meio do processo eleitoral. “A tendĂªncia Ă© que o tribunal julgue depois da eleiĂ§Ă£o”, disse um ministro do STF em carĂ¡ter reservado.
Entre ministros, hĂ¡ indicativo de que a PEC Ă© inconstitucional. A avaliaĂ§Ă£o Ă© de que abrir uma caixa de bondades nas vĂ©speras das eleições Ă© uma forma ilegĂtima para conquistar mais eleitores.
Ainda assim, nĂ£o necessariamente o STF estaria disposto de julgar a PEC inconstitucional. Diante do placar acachapante no Congresso pela aprovaĂ§Ă£o da proposta, com iniciativa do governo e apoio da oposiĂ§Ă£o, derrubar a medida seria uma clara afronta do STF ao Congresso e ao Planalto, em meio a um processo eleitoral conturbado, apimentado pela crise entre os Poderes. “Vamos ver se o STF vai ter coragem de derrubar essa PEC”, duvidou um ex-ministro da Corte.
Se o STF considerar a PEC inconstitucional, o governo encontrarĂ¡ outra pedra no caminho: o Tribunal de Contas da UniĂ£o (TCU). Ministros do Tribunal de Contas dizem que, nesse cenĂ¡rio, Ă© possĂvel responsabilizar quem liberou o dinheiro dos benefĂcios sabendo que a medida estava sendo juridicamente questionada. Na semana passada, o MinistĂ©rio PĂºblico junto ao TCU pediu para o tribunal alertar Bolsonaro sobre as consequĂªncias legais de implementar de imediato a PEC dos auxĂlios.
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Foto: Nelson Jr/SCO/STF