MPF pede aumento de penas de fazendeiros condenados no Amazonas
Pai e filho foram condenados por trabalho anรกlogo ร escravidรฃo nos municรญpios de Boca do Acre e Lรกbrea

Mariane Veiga
Publicado em: 17/03/2025 ร s 20:55 | Atualizado em: 17/03/2025 ร s 21:23
O Ministรฉrio Pรบblico Federal (MPF) recorreu, pedindo aumento das penas a que foram condenados dois fazendeiros, que sรฃo pai e filho, acusados de manter funcionรกrios em condiรงรฃo anรกloga ร de escravos em quatro fazendas localizadas nos municรญpios de Boca do Acre e Lรกbrea, no interior do Amazonas.ย
O MPF defende que hรก farta jurisprudรชncia que reforรงa a aplicaรงรฃo da pena-base acima do mรญnimo legal e, com isso, quer que o Tribunal Regional Federal da 1ยช Regiรฃo (TRF1) reforme a sentenรงa imposta aos rรฉus.
Em relaรงรฃo a um dos rรฉus que, devido a idade, teve alguns dos crimes atingidos por prescriรงรฃo, o MPF pediu a condenaรงรฃo a 26 anos e quatro meses de reclusรฃo, com o pagamento equivalente a 787 dias-multa.
O outro rรฉu deve cumprir pena de 33 anos e nove meses de reclusรฃo, alรฉm de pagar o equivalente a 1.012 dias-multa.ย
Os denunciados foram condenados pela Justiรงa Federal a penas inferiores: 23 anos e sete meses e 27 anos e quatro meses, respectivamente.
Alรฉm disso, a multa aplicada ao segundo rรฉu estรก em patamar inferior ao que pede o MPF. Um dos fazendeiros estava no comando e o outro, no operacional, em uma atuaรงรฃo conjunta.ย
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A denรบncia do MPF foi recebida pela Justiรงa Federal em 2018 e gerou, em 2024, condenaรงรตes dos dois rรฉus por diversas prรกticas criminosas. No entanto, os rรฉus foram absolvidos pelos crimes de destinar de forma inadequada resรญduos e embalagens vazias de agrotรณxicos (artigo 57 da Lei nยบ 14.785/2023) e pela omissรฃo de registros na Carteira de Trabalho e Previdรชncia Social (art. 297, ยง 4ยบ do Cรณdigo Penal).
Para o MPF, as provas nรฃo permitem desassociar a utilizaรงรฃo das embalagens de agrotรณxicos para armazenamento de รกgua e alimentos dos trabalhadores das condutas criminosas apontadas na denรบncia. Ao contrรกrio, essa conduta contribuรญa para tornar ainda mais degradante as condiรงรตes em que os trabalhadores se encontravam, sendo que os rรฉus eram os responsรกveis por aqueles trabalhadores.
O casoย
No ano de 2012, uma equipe de auditores fiscais do Ministรฉrio do Trabalho e Emprego (MTE), por meio do Grupo Especial de Combate ao Trabalho Escravo (GEFM), realizou fiscalizaรงรฃo in loco nas fazendas. Durante a aรงรฃo, foram resgatados vรกrios trabalhadores em condiรงรตes anรกlogas ร escravidรฃo nas fazendas administradas pelos rรฉus.
Os relatรณrios elaborados pelos auditores fiscais do Trabalho apontam que nas quatro fazendas que sรฃo objeto da aรงรฃo penal, os trabalhadores temporรกrios estavam sob o regime de โempreitadaโ e foram resgatados das condiรงรตes anรกlogas ao trabalho escravo nรฃo tinham registro em Carteira de Trabalho e Previdรชncia Social (CTPS).ย
O grupo de trabalhadores encontrava-se em condiรงรตes precรกrias de higiene, sem acesso ร รกgua potรกvel, sem instalaรงรตes sanitรกrias, sem equipamentos de seguranรงa individual e abrigados em alojamentos com condiรงรตes mรญnimas de conforto.
De acordo com o relatรณrio da fiscalizaรงรฃo do GEFM, as instalaรงรตes das quatro fazendas apresentaram padrรฃo semelhante: nรฃo eram disponibilizadas instalaรงรตes sanitรกrias, nรฃo havia local para realizaรงรฃo das refeiรงรตes, nem fornecimento de energia elรฉtrica, alรฉm da precariedade das instalaรงรตes reservadas para os trabalhadores, que nรฃo ofereciam condiรงรตes mรญnimas para abrigar seres humanos: tratavam-se de meros barracos de lona preta.
Em uma das fazendas o GEFM se deparou com carne fresca armazenada dentro de um recipiente de lubrificante mineral, ao ar livre, exposta ร contaminaรงรฃo e o acรบmulo de lixo na รกrea ao redor, que favoreciam a proliferaรงรฃo de doenรงas infecciosas.
Alรฉm de nรฃo possuir a Carteira de Trabalho assinada pelos empregadores, o grupo tambรฉm nรฃo recebia depรณsitos do FGTS e nem os salรกrios devidos.
Tambรฉm foi constatado que, ao receber algum valor pelos serviรงos prestados, logo eram descontadas as importรขncias relativas ร alimentaรงรฃo, equipamentos e demais itens adquiridos nas fazendas, com preรงos superiores aos praticados no comรฉrcio local.
Com informaรงรตes do MPF
Foto: Ministรฉrio do Trabalho/divulgaรงรฃo