Corte na Economia tira 51% da verba da Suframa para 2022

A tesourada รฉ vista por integrantes do prรณprio governo como uma retaliaรงรฃo do Congresso a Guedes, com quem o Legislativo tem uma relaรงรฃo turbulenta

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Diamantino Junior

Publicado em: 07/01/2022 ร s 13:27 | Atualizado em: 07/01/2022 ร s 14:19

O ministro Paulo Guedes (Economia) foi o titular de pasta doย governo Jair Bolsonaro (PL)ย que mais viu verbas encolherem durante aย tramitaรงรฃo do Orรงamento de 2022. Para a equipe do Ministรฉrio da Economia, a tesourada de R$ 2,5 bilhรตes feita pelo Congresso pode comprometer atividades jรก neste primeiro semestre. Agora o time de Guedes tenta encontrar saรญdas para o problema. O corte na economia tira 51% da verba da Superintendรชncia da Zona Franca de Manaus (Suframa) para 2022.

A tesourada รฉ vista por integrantes do prรณprio governo como uma retaliaรงรฃo do Congresso a Guedes, com quem o Legislativo tem uma relaรงรฃo turbulenta.

Em contraste, ministรฉrios de aliados dos congressistas ou comย aรงรตes que beneficiam redutos eleitoraisย โ€” como Cidadania, Desenvolvimento Regional e Infraestrutura โ€” tiveram aumento ou cortes marginais.

O corte na Economia foi de 52% em relaรงรฃo ร  proposta inicial do governo, caso desconsiderada a verba do Censo Demogrรกfico โ€” gasto extraordinรกrio da Economia blindado por decisรฃo do STF (Supremo Tribunal Federal).

Ainda que o levantamento entrasse na conta, no entanto, a pasta continuaria sendo a mais prejudicada, com uma reduรงรฃo de 34%.

O clima na equipe econรดmica รฉ de insatisfaรงรฃo com o relator-geral do Orรงamento, deputado Hugo Leal (PSD-RJ).

Relatos ouvidos pela Folha afirmam que ele “pisou na bola” e que o governo terรก de consertar o que sรฃo considerados erros enormes. O deputado foi procurado, mas nรฃo respondeu aos questionamentos.

O ministรฉrio ainda estรก fazendo um levantamento detalhado sobre o impacto do corte e a partir de que mรชs os programas da pasta ficarรฃo prejudicados. O diagnรณstico atรฉ agora รฉ que as atividades podem ficar comprometidas por falta de recursos jรก a partir de maio caso nada seja feito.

Com exceรงรฃo da verba do Censo โ€”destinada ao IBGE, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatรญsticaโ€”, o corte de pouco mais de 50% atingiu todas as unidades orรงamentรกrias do Ministรฉrio da Economia.

A Receita Federal, por exemplo, viu os recursos diminuรญrem de R$ 2,1 bilhรตes para R$ 1 bilhรฃo, o que afeta diretamente a capacidade do รณrgรฃo de manter sistemas em funcionamento. O Fisco cuida da arrecadaรงรฃo federal e de uma sรฉrie de fiscalizaรงรตes sensรญveis para o governo.

Os cortes na Receita e a ausรชncia de verba para a regulamentaรงรฃo de um bรดnus de eficiรชncia deflagraram entre auditores um movimento nacional de entrega de cargos e o plano de paralisaรงรฃo de atividades.

Internamente, um dos alertas mais contundentes vem da PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional) โ€” รณrgรฃo jurรญdico responsรกvel por, entre outras atribuiรงรตes, cobrar devedores da Uniรฃo.

A PGFN alerta que a falta de recursos pode paralisar atividades e fazer prescreverem crรฉditos tributรกrios a que a Uniรฃo tem direito. Alรฉm disso, pode impulsionar o volume de precatรณrios a serem pagos pelos cofres pรบblicos.

O รณrgรฃo havia pedido ao governo verba de R$ 504 milhรตes para as atividades de 2022, mas sรณ teve R$ 430 milhรตes atendidos no texto enviado ao Congresso. Posteriormente, os congressistas reduziram ainda mais o montante, para R$ 208 milhรตes โ€”um corte de 51% em relaรงรฃo ao original.

Para a PGFN, caso o Orรงamento para 2022 nรฃo seja revisto, hรก risco de interrupรงรฃo dos serviรงos de tecnologia da informaรงรฃo a partir de maio.

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A partir de junho, pode haver paralisaรงรฃo em contratos de manutenรงรฃo, de procedimentos de cobranรงa, de emissรตes de certidรตes e de rotinas administrativas.

Outras รกreas, porรฉm, tambรฉm estรฃo com dificuldades. A verba para o controle do Orรงamento pรบblico ficou igualmente comprometida.

O corte drรกstico nas dotaรงรตes da Economia azedou ainda mais o clima entre a pasta de Guedes e o Congresso, cuja relaรงรฃo รฉ marcada por rusgas.

O Orรงamento de 2021, por exemplo, jรก havia sido palco de uma guerra por causa de cortes excessivos em despesas obrigatรณrias como benefรญcios previdenciรกrios. Guedes responsabilizou o Congresso pela maquiagem, e os parlamentares reagiram escancarando o suposto aval da Economia ร s mudanรงas.

A briga deixou uma cicatriz na relaรงรฃo, aprofundada por desentendimentos em torno dos rumos das reformas tributรกria, administrativa e da mudanรงa no teto de gastos โ€”regra fiscal que limita o avanรงo das despesas ร  inflaรงรฃo e que acabou flexibilizada.

Diante do cenรกrio, a equipe econรดmica tem estudado alternativas para recompor ao menos parte dos valores.

Integrantes do governo ouvidos pela Folha falam na possibilidade de Bolsonaro vetar mudanรงas feitas pelo Congresso, com o objetivo de restabelecer os valores mรญnimos necessรกrios para a pasta.

Procurado, o Ministรฉrio da Economia afirmou que nรฃo se manifestarรก sobre temas relacionados ao Orรงamento de 2022 antes da sanรงรฃo pelo presidente Bolsonaro.

Se de um lado a pasta de Guedes ficou na penรบria, ministros aliados tiveram orรงamentos preservados.

A Cidadania (comandada por Joรฃo Roma, filiado ao partido do centrรฃo Republicanos) jรก teve os gastos turbinados pelo Auxรญlio Brasil โ€”substituto do Bolsa Famรญlia (rubrica considerada obrigatรณria no Orรงamento)โ€”, e recebeu mais R$ 2 bilhรตes em despesas discricionรกrias. Esse foi o ministรฉrio mais beneficiado pelos parlamentares.

O Ministรฉrio do Trabalho e Previdรชncia, de Onyx Lorenzoni, por sua vez, recebeu incremento de R$ 1,1 bilhรฃo.

Pastas que costumam receber atenรงรฃo dos parlamentares, por abrigarem obras e outros investimentos, foram beneficiadas ou praticamente poupadas.

O Ministรฉrio da Infraestrutura, de Tarcรญsio de Freitas, recebeu um incremento de R$ 817,5 milhรตes, enquanto o Desenvolvimento Regional, de Rogรฉrio Marinho, teve um corte relativamente baixo, de R$ 171 milhรตes.

Os valores ainda nรฃo consideram as chamadas emendas de relator, instrumento usado para distribuir recursos a parlamentares aliados do governo, que podem contemplar suas bases eleitorais. Em geral, o MDR costuma ser um dos principais beneficiados por esse mecanismo.

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