A Fundação Nacional do Índio (Funai) pode estar manipulando reuniões administrativas, em aldeias indígenas no Amazonas, para acelerar o processo de licenciamento de reconstrução da BR-319.
A reconstrução da Manaus-Porto Velho ou a “estrada da integração” é uma promessa de campanha do presidente Jair Bolsonaro (PL). Só que até agora, três anos e cinco meses de governo, a obra não avançou em nenhum palmo de asfalto.
O entrave ocorre em boa parte pelo não cumprimento das etapas ambientais cobradas pelo MPF e organizações que acompanham o processo para sua construção.
A denúncia de manipulação para acelerar a pavimentação da BR-319 está sendo feito por lideranças indígenas, Ministério Público Federal (MPF) e pesquisadores.
As “reuniões administrativas”, feitas pela Funai com os indígenas, estariam descumprindo a Convenção 169, da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Os termos da convenção asseguram a consulta livre, prévia e informada aos povos afetados por obras de infraestrutura.
De acordo com InfoAmazônia, no último 6 de maio, durante reunião promovida pelo Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), do Ministério da Economia, a coordenadora de licenciamento ambiental da Funai, Carla Fonseca de Aquino Costa, afirmou que o órgão havia concluído a consulta prévia das comunidades indígenas.
Dessa forma, essa consulta estaria abrindo caminho para a emissão da licença para reconstruir a parte mais crítica da rodovia, o chamado ‘trecho do meio’ (km 250 a 655,7). recuperando a ligação terrestre entre Porto Velho (RO) a Manaus (AM).
Relato dos indígenas
Lideranças indígenas também relataram a pressão da Funai pela autorização para construção da estrada.
O presidente da Federação das Organizações e Comunidades Indígenas do Médio Purus (Focimp), cacique Apurinã, afirma que indígenas teriam sido pressionados a assinarem as atas que dizem sim à obra, o que fere o caráter livre da consulta. “Eles relataram que as reuniões não ocorreram como eles queriam”, disse.
Outro indígena, que pediu para não ser identificado, relatou que, em uma das aldeias, a comunidade queria mais aprofundamento dos estudos, mas representantes do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e da Funai afirmaram que não havia mais tempo para estudos.
“Fomos informados que se os indígenas não aceitassem correriam o risco de ficar de fora das compensações, e que não tinham mais tempo para novos estudos”.
MPF contesta consulta
O MPF e pesquisadores presentes no encontro foram pegos de surpresa com a informação e contestaram a realização das consultas.
Para o Ministério Público, a Funai violou os termos da Convenção 169 ao considerar a realização da consulta prévia em reuniões que não tinham tal finalidade, descumprindo o caráter prévio, livre e informado do tratado internacional.
“Os povos indígenas e comunidades tradicionais (ribeirinhos/extrativistas) não estão sendo consultados sobre a BR-319 nos moldes da convenção, e estão tendo seus direitos violados”, disse o MPF ao InfoAmazonia.
O MPF também contesta a abrangência da consulta, que se limitou apenas às comunidades no raio de 40 quilômetros do trecho a ser licenciado, ignorando os impactos que a obra terá em toda a região considerada de influência da BR-319, que inclui abertura de vias planejadas e de ramais (estradas secundárias) por causa da rodovia.
“Esse modelo que está sendo adotado é bastante inadequado”, criticou o procurador Fernando Merloto, do MPF do Amazonas. A Funai diz seguir as regras estabelecidas pela portaria interministerial 60/2015, que aponta perímetros mínimos para o licenciamento ambiental e se pautar pelas as normas da convenção 169 da OIT.
O que diz a Funai
Por meio de nota, a Funai diz que não aplicou “nenhum tipo de coação para decisão [dos indígenas]” e que “criar novos procedimentos não previstos pode ser uma forma indireta de postergar a decisão sobre a viabilidade do projeto e paralisá-lo”.
Segundo o órgão indigenista oficial, as consultas aos indígenas foram realizadas durante a elaboração do Estudo do Componente Indígena (ECI) e audiências públicas nas terras indígenas Lago Capanã, Ipixuna, Nove de Janeiro, Ariramba, Apurinã do Igarapé Tauamirim e Apurinã do Igarapé São João, que estão no raio de 40 km da rodovia.
“O processo de consulta começa quando a gente vai apresentar a equipe e o plano de trabalho para explicar para os indígenas como eles vão ser estudados”, justificou Carla Fonseca, durante a reunião do PPI.
Com informações do portal InfoAmazônia.
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Foto: Divulgação/Funai